O Tribunal de Contas do Estado julga nesta quinta-feira as contas do governo do Paraná de 2016. Em tese, o julgamento deveria ter sido feito na semana passada, mas num ato inédito um conselheiro pediu para analisar melhor a prestação de contas.
Em geral, o TC tem sido mais do que condescendente com os governadores. Mas os procuradores que analisam tecnicamente os gastos dizem que há pelo menos três anos os conselheiros deveriam reprovar a prestação de contas do governo Beto Richa.
Atual chefe do Ministério Público de Contas, Flávio de Azambuja Berti explica o porquê.
O MP de Contas apontou nove problemas nas contas do governo Beto Richa de 2016. Há problemas graves? Faria sentido a reprovação?
Sim, há problemas graves, especialmente a falta de repasse da parte patronal da contribuição previdenciária sobre a folha dos servidores, o que causa déficits e rombos na Paranaprevidência, independentemente do regime previdenciário diante do qual se esteja (este atual, ou algum outro decorrente de eventual aprovação de Emenda Constitucional que reforme em parte ou por completo a Previdência).
Independentemente dos requisitos de idade mínima (qualquer que seja) e de tempo de contribuição mínimo exigido do servidor bem como de valor-teto de benefício, a falta de recolhimento dos aportes devidos pelo governo indica grave problema de gestão capaz de, por si só, aumentar a cada ano o déficit do sistema.
Leia mais: As 9 irregularidades apontadas pelo TC
Também chamou atenção o não-cumprimento de despesas empenhadas e não atendidas em 2015 que deveriam ser em 2016, mas não o foram.
Além disso, a alteração de mais de 17% do total de despesas aprovadas (autorizadas) na Lei Orçamentária Anual do Estado por decretos do governador durante o ano também consiste em ofensa à violação expressa de previsões da Constituição Federal (arts. 167 a 169), independentemente de um “cheque em branco” constante da LOA estadual ou de julgamentos anteriores pela aprovação das contas diante de situação análoga em exercícios anteriores.
A cada ano, tem se repetido um padrão no julgamento das contas do governo do Paraná. O MP de Contas aponta problemas e muitas vezes sugere a reprovação, mas o pleno aprova apenas com ressalvas, recomendações e determinações. Existe uma explicação para essa diferença de visão?
O MP de Contas tem emitido nos últimos anos (ao menos nos últimos três anos consecutivamente) parecer pela reprovação das contas por entender que, quando descumpridas normas legais (orçamentárias, da Lei de Responsabilidade Fiscal ou outra), não há margem para ponderação e avaliação diferente. Como o órgão deliberativo do TC é colegiado, com diferentes opiniões e interpretações subjetivas próprias sobre a situação fiscal posta, fica mais difícil uma interpretação uníssona no mesmo sentido.
O TC nunca reprovou as contas do governo do estado. No entanto, a cada ano, parece que chega um pouco mais perto disso. Recentemente um conselheiro votou pela reprovação; o pleno aprovou determinações; agora houve um pedido de vistas. O que mudou nos últimos anos?
A situação contextual de absoluta falência fiscal do país (em âmbito federal e na maioria dos estados) e um perfil um pouco mais técnico dos integrantes do pleno ajuda.
Alguns conselheiros dizem que, como em outras gestões não houve reprovação mesmo havendo problemas, seria injusto com os novos governos aplicar critérios diferentes. Como resolver esse impasse?
Na visão do MP de Contas o que deve ser levado em consideração é o aspecto técnico-jurídico. Se a conduta é ilegal, se há ofensa ao que prevê a lei de orçamento, se há descumprimento de índice constitucional, se há utilização de despesas indevidas, não há como ponderar entre “justo” e “injusto”. Num sistema de direito positivo como o brasileiro em que se deve absoluta adequação ao que preveem as normas, a análise do que é legal ou ilegal não se confunde com juízos subjetivos do que seja “justo” ou “injusto”, até porque tal avaliação conforme a própria fundamentação (subjetiva), varia de pessoa para pessoa. Já o que está posto na lei não tem variação.