A reportagem sobre Che Guevara foi publicada há mais de um mês (03/10) na Veja, mas continua provocando uma guerra de bastidores. O “Portal Comunique-se” distribuiu um informe em que fala da briga entre Jon Lee Anderson, autor de “Che Guevara, uma Biografia” e jornalista da New Yorker, e Diogo Schelp, editor de Internacional da Veja e um dos autores da reportagem.
Reproduzo aqui o texto distribuído pelo Comunique-se:
Jon Lee Anderson, autor de “Che Guevara, uma Biografia” e jornalista da New Yorker, disse que o perfil é “texto opinativo disfarçado de jornalismo imparcial”.
Anderson foi procurado por Diogo Schelp, editor de Internacional e um dos autores, durante a apuração. Disse que aceitou o pedido, mas não obteve retorno. Seu livro é citado como “a mais completa biografia de Che” e tem uma frase reproduzida. Após ler a matéria de Veja, Anderson enviou um e-mail para a revista e para outros jornalistas brasileiros no dia 23/10. Segue a íntegra do texto, em tradução publicada no blog de Pedro Doria.
Caro Diogo, Fiquei intrigado quando você não me procurou após eu responder seu email. Aí me passaram sua reportagem em Veja, que foi a mais parcial análise de uma figura política contemporânea que li em muito tempo. Foi justamente este tipo de reportagem hiper editorializada, ou uma hagiografia ou – como é o seu caso – uma demonização, que me fizeram escrever a biografia de Che. Tentei pôr pele e osso na figura super-mitificada de Che para compreender que tipo de pessoa ele foi. O que você escreveu foi um texto opinativo camuflado de jornalismo imparcial, coisa que evidentemente não é. Jornalismo honesto, pelos meus critérios, envolve fontes variadas e perspectivas múltiplas, uma tentativa de compreender a pessoa sobre quem se escreve no contexto em que viveu com o objetivo de educar seus leitores com ao menos um esforço de objetividade. O que você fez com Che é o equivalente a escrever sobre George W. Bush utilizando apenas o que lhe disseram Hugo Chávez e Mahmoud Ahmadinejad para sustentar seu ponto de vista. No fim das contas, estou feliz que você não tenha me entrevistado. Eu teria falado em boa fé imaginando, equivocadamente, que você se tratava de um jornalista sério, um companheiro de profissão honesto. Ao presumir isto, eu estaria errado. Esteja à vontade para publicar esta carta em Veja, se for seu desejo.
Cordialmente, Jon Lee Anderson.
Resposta de Schelp A resposta de Diogo Schelp foi publicada na quarta-feira (14/11) no blog de Reinaldo Azevedo, hospedado no site de Veja.
Caro Anderson, Eu fiquei me perguntando, depois de lhe enviar um e-mail pedindo (educadamente) uma entrevista, por que nunca recebi uma resposta sua. Agora sei que a mensagem deve ter-se perdido devido a algum programa antispam ou por qualquer outra questão tecnológica. Também não recebi sua “carta” – talvez pelo mesmo problema. Tudo isso não tem a menor importância agora porque você resolveu o assunto valendo-se dos meios mais baixos – um e-mail circular. O que lhe fez pensar que tinha o direito de tornar pública nossa correspondência, incluindo a mensagem em que eu (educadamente) pedia uma entrevista? Isso, caro Anderson, é antiético. Vindo de alguém que se diz um jornalista, é surpreendente. Você pode não gostar da reportagem que escrevi; ela pode ser boa ou ruim, bem-escrita ou não, editorializada ou não – mas não foi feita com os métodos antiéticos que você usa. Eu respeito a relação entre jornalistas e fontes. Você não. E mais: parece-me agora que você é daquele tipo de jornalista que tem medo de fazer uma ligação telefônica (assim são os maus jornalistas), já que tem meu cartão de visita e conhece meu número de telefone. Se você tinha algo a dizer sobre a reportagem — e já que sua mensagem não estava chegando a seu destino — poderia ter me ligado. Eu não sei que tipo de imagem de si mesmo você quer criar (ou proteger) negando os fatos que o seu próprio livro mostra, mas está claro agora que é a de alguém sem ética. Você pode ficar certo de que não aparecerá mais nas páginas desta revista.
Sem mais, Diogo Schelp
O post de Azevedo trouxe também as versões em inglês dos dois e-mails, e divergências sobre a tradução de alguns termos. O blogueiro também chama Anderson de canalha por divulgar a solicitação de entrevista de Schelp e afirma que a reação do autor é motivada pelo fato dele não ter sido ouvido.
“Anderson é um caso lamentável em que o caráter do biografado contamina o do biógrafo”, escreveu Azevedo.