Tenho insistido em uma ideia até meio óbvia: mídia não deve ser um termo que diga respeito apenas às chamadas “novas mídias” (mais sobre isso, leia “Sobre o oito e o oitenta”). Até porque carecemos de alfabetização não só para as mídias digitais, mas também para as mais antigas, que não devem ser confundidas com obsoletas. A alfabetização em seu sentido mais evidente e literal está ligada à palavra escrita e a palavra escrita ainda encontra como suporte principal um objeto de papel e tinta: o livro.
Se o excesso de linguagens e suportes exige de nós uma capacidade de decodificação que vai além da camada mais superficial, não podemos nos esquecer de que a leitura de um livro ainda não é uma atividade amplamente praticada. E, trabalhando com educação, acredito que devesse ser.
Como a escola poderia equilibrar, sem enfraquecer nenhuma das diversas alfabetizações necessárias, mergulhando nas camadas mais recônditas do sentido?
Já li alguns artigos defendendo a ideia de que um bom leitor da palavra escrita teria mais condições de ser um bom leitor de outras linguagens. E que o contrário não seria verdadeiro. Não tenho aqui dados que me permitam aprofundar a tese. Mesmo assim, gostaria de deixar isso registrado, pois é uma afirmação importante até para gerar discordâncias que podem ser frutíferas.
Trago o assunto à tona para fazer a defesa da mídia livro na escola. Estava propenso a dizer que ele não poderia ser esquecido, mas aí me veio um pensamento até meio cruel: será que ele já foi lembrado? Se na tal pós-modernidade tudo o que é sólido se desmancha no ar, no caso do Brasil a pós-modernidade chegou antes da modernidade. Tudo já foi se desmanchando antes de se solidificar. Muitos países que já tiveram na literatura e na leitura de modo geral uma espécie de carro-chefe do acesso ao conhecimento do mundo e de si, lamentam estar perdendo essa característica. E o Brasil acaba sendo um caso estranho: estamos deixando de ser leitores de livros antes mesmo de termos nos tornado leitores de livros.
Dentro dos meios digitais, lemos muito o tempo todo, e em quantidade maior do que na era pré-internet. Mas raramente lemos mais de duas páginas ou mesmo assistimos a um vídeo de mais de 10 minutos. Para as chamadas informações em flash, a internet é uma maravilha. No entanto, acredito muito na potência de um livro de cem, duzentas, quatrocentas páginas. É mergulho de profundidade, exige equipamentos diferenciados, de sobrevivência, para evitar a subida à tona antes do tempo e a falta de ar. E também equipamentos de contemplação. Uma vez acostumado e confortável na imersão, é preciso dar as condições para o maravilhamento, para a fruição.
Navegar na internet é um termo que já traz consigo a ideia de passeio na superfície. E isso não é necessariamente ruim. Mas conhecer as profundezas é importante, exige fôlego, concentração e, como já disse, equipamentos adequados.
E esses equipamentos a escola tem condição – e obrigação – de fornecer. Para evitar naufrágios e afogamentos.
>> Cezar Tridapalli é coordenador de Midiaeducação do Colégio Medianeira, instituição de ensino associada ao Sinepe/PR (Sindicato das Escolas Particulares do Paraná)
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