Há cerca de três anos vivenciei um daqueles encontros memoráveis, aqueles que guardamos com carinho e zelo, para que a nossa memória nunca os esconda. Daqueles tão desejados pelos jovens que saem das universidades em busca da construção de uma carreira, de uma trajetória que seja significativa e lhe cause orgulho, afinal de contas, foram horas e mais horas investidas com o objetivo de conquistar uma graduação e uma boa colocação no mercado de trabalho. Nada mais digno e sensato. No meu caso, a arte do encontro me apresentou uma união audaciosa ao primeiro olhar: organizações não-governamentais e metodologias de mercado trabalhando em conjunto para potencializar o impacto social, ou mais comumente conhecido, como empreendedores sociais.
A riqueza de diversidade e o valor do Terceiro Setor eram totalmente desconhecidos no meu mundo, quais eram as causas, os rostos e dificuldades desse nicho. Logo de início fui imersa em um programa de capacitação e formação de rede para organizações sociais/ambientais oferecido pelo Instituto Legado, local onde trabalho há mais de dois anos, um descortinar de uma perspectiva de carreira com impacto social aliada a propósito estava ali, sendo presente no meu cotidiano, estava rodeada de bons exemplos, de pessoas que buscaram sair da zona de reclamações para empreender em soluções para velhos problemas sociais.
Escolher o Terceiro Setor como uma carreira profissional exige uma desconstrução diária. Em um primeiro momento é preciso desromantizar aquela visão de senso comum que insiste em repetir “ó, que coisa bonitinha isso que você faz, trabalho social, trabalho voluntário! Mas quem paga o seu salário?”. Diversas vezes ouvi essa frase e meus colegas de profissão também, porém, mais do que bonito, o trabalho social é extremamente necessário para o desenvolvimento socioeconômico do país.
Geralmente os projetos sociais/ambientais surgem decorrentes de um processo falho do Estado, de uma lacuna negligenciada, em que as principais vítimas são os próprios filhos dessa nação. Concordo em reconhecer a beleza da sociedade civil organizada para preencher essas lacunas, mas o cotidiano desses rostos esquecidos e que nem sempre conseguem ser beneficiários de algum projeto social não é uma situação bonita, mas sim um desafio em busca de solução, um exercício diário de resiliência.
O caminho no Terceiro Setor tem a necessidade de aliar conhecimento à prática. É preciso nutrir a constante vontade de buscar capacitações de alto impacto, de aliar inovação social com a cultura de startups, de ler as diferentes definições de Negócios Sociais sem esquecer do olhar crítico para a realidade. Ou seja, sede de conhecimento é uma ferramenta fundamental, porém é o conhecimento aplicado que gera transformação, e isso é imprescindível. Não podemos ser profissionais amadores, não é justo com os beneficiários de nossos projetos sociais terem produtos ou tempo de baixa qualidade: é fundamental ter excelentes profissionais buscando soluções que tragam resultado e, para isso, o comprometimento e o sonho grande precisam caminhar juntos.
Algo que aprendi no cotidiano, visitando mais de 40 organizações e procurando entender a razão de existir de cada uma delas, é que é essencial desenvolver uma aptidão em praticar a escuta ativa, sem julgamentos e preconceitos. Ouvindo o outro em toda a sua inteireza, prestando muita atenção em cada detalhe e no tom da conversa. O essencial é invisível aos olhos, mas não pode ser inaudível aos ouvidos de um gestor social. Dentro do processo seletivo do Projeto Legado, nosso programa de capacitações com aporte financeiro, visitamos todas as organizações com as quais vamos trabalhar naquele determinado ano, passamos pelo menos três horas conversando. Esse momento é mágico, é ali que verdadeiramente começa um trabalho em conjunto, ombro a ombro, por cerca de 12 meses. Os relatos são comoventes, inspiradores e belos, mas carregam em muitos casos uma triste realidade. Relembrando, organizações sociais surgem por alguma negligência e isso não é bonito, mas a luta por soluções torna o Terceiro Setor de uma beleza singular.
Desde o dia que fui apresentada ao empreendedorismo social, senti-me altamente privilegiada. Sonho em que todo o jovem universitário possa investir tempo em descobrir qual é o seu real propósito nesse mundo e qual é a melhor forma de investir o tempo que nos foi dado. Sempre digo para os meus colegas, é impossível querer algo que você não sabe que existe, por isso a importância de investigar, de conhecer pessoas, causas, autores dos mais diversos possíveis, de ouvir os outros, de reconhecer problemas e buscar soluções. Inspire-se!
*Artigo escrito por Beatriz Groxco, Internacionalista e Pós-graduanda em Gestão de Políticas, Projetos e Programas Sociais, multiplicadora da Fundação Estudar e gestora do Projeto Legado, do Instituto Legado de Empreendedorismo Social. O Instituto Legado é parceiro do Instituto GRPCOM no blog Giro Sustentável.
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