Caso você veja alguém fotografando a prateleira do supermercado com o celular, não tire conclusões precipitadas. Em vez de se tratar de um viciado em Instagram, pode ser uma experiência de vanguarda em pesquisa econômica. Todos os meses, seis agentes da startup californiana Premise usam um aplicativo de Android para clicar até 18 mil produtos, sobretudo alimentos e bebidas, em gôndolas do Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre e Salvador e em outros seis países, movimentando mil profissionais.
Na imagem, os itens são sempre enquadrados ao lado das etiquetas de preço. O valor é o que mais importa, e ele é também digitado no app, com o tipo e a marca do produto. As informações coletadas pelos agentes complementam a tarefa de softwares que percorrem, sem parar, 30 mil sites de comércio eletrônico ao redor do mundo em busca de preços em várias categorias. Agregando os dados dessas duas fontes, a Premise tira do forno seu principal produto, um índice global de inflação em tempo real uma alternativa aos dados oficiais, que costumam ser divulgados com periodicidade mensal ou quinzenal.
Leitura da economia
A Premise é apenas um exemplo de como a enxurrada de dados que trafegam na rede, o chamado Big Data, está transformando radicalmente a forma como empresas e governos tentam "ler" a economia para tomar decisões. Fundada há apenas um ano e meio, a Premise fornece seus índices aos terminais eletrônicos da firma de informações financeiras Bloomberg.
O modelo perseguido pela Premise tem como precursora a PriceStat, empresa criada por economistas do Massachusetts Institute of Technology (MIT) que calcula a inflação por meio dos preços do e-commerce em 50 países. Como o trabalho é feito por softwares e não por pessoas, a coleta de preços é incrivelmente mais ágil, abrangente e barata. A desvantagem é que, em muitos países, o e-commerce é restrito demais para que seus preços reflitam a tendência inflacionária da economia. Mesmo que índices econômicos do Big Data se provem legítimos, analistas dizem que jamais substituirão estatísticas oficiais.
Oportunidade
Órgãos oficiais também recorrem ao Big Data
Os órgãos oficiais não ignoram a tecnologia do BigData, que aos poucos vai se tornando uma tendência, como é o caso do braço estatístico da União Europeia (UE), a Eurostat, e a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). Segundo um de seus economistas, Christian Reimsbach-Kounatze, a OCDE experimenta identificar flutuações no mercado imobiliário mediante sites de compra, venda e aluguel de imóveis.
Dados estratégicos
A percepção de analistas é que índices criados a partir de Big Data serão fontes importantíssimas de informações e, em muitos casos, a única: em lugares onde estatísticas oficiais não existem ou são precárias. Porém, o uso desses dados para fins de pesquisa econômica requer um debate maior sobre a questão da privacidade.
"Órgãos oficiais de estatística sempre tiveram direito legal de coletar dados dos cidadãos, o que sempre implicou no dever de proteção desses dados. A diferença agora é que hoje é possível extrair informações do cidadão sem ele estar ciente", afirma Reimsbach-Kounatze.