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Manon Serrano, à esquerda, com sua mãe, Sophie, na casa delas em Grasse, na França; Manon e outra bebê foram trocadas por engano e entregues às mães erradas, 20 anos atrás | Rebecca Marshall/The New York Times
Manon Serrano, à esquerda, com sua mãe, Sophie, na casa delas em Grasse, na França; Manon e outra bebê foram trocadas por engano e entregues às mães erradas, 20 anos atrás| Foto: Rebecca Marshall/The New York Times

Quando Sophie Serrano finalmente segurou sua filha Manon nos braços, depois de a recém-nascida ter sido colocada sob luz artificial por estar com icterícia, ficou surpresa ao ver seus cabelos fartos.

“Eu não tinha notado isso antes e me surpreendi”, contou, falando em sua casa em Grasse, perto da Côte d’Azur.

Serrano, que hoje tem 39 anos, ficou perplexa outra vez um ano depois, ao notar que o cabelo de sua filha ficara frisado e que sua pele era mais escura que a dela própria ou a de seu parceiro. Mas o amor que ela tinha por sua filha falou mais alto que qualquer dúvida.

Ela continuou a cuidar de Manon, até que um exame de paternidade, mais de dez anos depois, mostrou que nem ela nem seu parceiro eram os pais biológicos da menina. Mais tarde, Serrano descobriu que uma enfermeira tinha trocado Manon com outra bebê, por engano, entregando cada criança à mãe errada.

A história chegou às manchetes na França no mês passado, quando um tribunal ordenou à clínica de Cannes onde os bebês foram trocados, e à seguradora da clínica, a pagar uma indenização de € 1,88 milhões, valor a ser dividido entre as duas famílias.

Serrano conta que seu amor por Manon se fortaleceu quando ela descobriu a troca. E diz que não sentiu nenhum vínculo especial com sua filha biológica, após conhecê-la.

“Não é o sangue que faz uma família”, disse. “O que faz uma família é o que construímos juntos, o que nos dizemos. E eu criei um vínculo maravilhoso com minha filha não biológica.”

A decisão do tribunal encerrou a luta de Serrano por uma indenização pela negligência da enfermeira e ajudou a silenciar seus críticos.

“Como uma pessoa pode não reconhecer seu próprio bebê depois de quatro dias?”, disse ao jornal “Le Figaro” a advogada da clínica, Sophie Chas. “Poderíamos acreditar nisso se fosse por um segundo, um dia, dois dias. Mas dez anos? As mães podem ter ajudado a causar os danos.”

Serrano observa que tinha 18 anos na época e que Manon, que hoje tem 20, foi sua primeira filha. “Eu jamais poderia ter imaginado tal cenário”, disse. Quando ela deu à luz, a bebê apresentou icterícia neonatal e foi colocada numa incubadora. Devido à falta de incubadoras, uma enfermeira a pôs numa incubadora junto a outra bebê.

Daniel Verstraete, o advogado da outra família, disse que apenas uma das bebês usava etiqueta de identificação, “que pode ter caído”. Serrano notou que o cabelo da bebê estava mais espesso. “A enfermeira falou que a luz do tratamento fototerápico fazia o cabelo da nenê crescer. Eu confiava nos profissionais médicos.”

A outra mãe, que também tinha 18 anos, perguntou a outra enfermeira por que sua filha não tinha cabelo. Ouviu que a fototerapia também podia encurtar o cabelo.

Serrano viveu com seu parceiro num vilarejo pequeno nas proximidades de Grasse, criando sua filha e enfrentando suspeitas crescentes dele de que Manon pudesse ser filha de outro homem. O relacionamento com ele fracassou em parte, ela disse, por essas suspeitas. Ele exigiu um exame de paternidade, dizendo que não queria pagar pensão alimentícia por uma filha que não considerava ser sua. O exame revelou que Manon, que tinha dez anos na época, não era nem sua filha, nem a de Serrano. “Aquilo teve o efeito de um tsunami”, contou Serrano.

“De uma hora para outra, você descobre que não sabe onde está a filha que você pôs no mundo. Eu queria saber como encontrar minha filha biológica.”

Em 2010, Serrano moveu uma ação cível contra a clínica. Investigadores disseram que os pais biológicos de Manon eram um casal da ilha de La Réunion, território francês no oceano Índico, mas que agora viviam perto delas. “Quando os conheci, percebi que eu me parecia muito com eles”, Manon contou. “Mas eu estava sentada diante de desconhecidos.”

Seus pais biológicos são trabalhadores modestos que, segundo Verstraete, deram uma educação “bastante rígida” à sua filha, a filha biológica de Serrano.

“A mãe acordava todos os dias pensando que nunca conseguira reconhecer sua filha”, disse o advogado. “Não é uma ferida física. É um sofrimento moral que nunca desaparece.”

As duas famílias tiveram vários encontros, e Manon buscou saber mais sobre suas origens. Mas os pais e as filhas tiveram dificuldade em formar qualquer tipo de relação e, depois de algum tempo, deixaram de se ver.

“Minha filha biológica se parece comigo”, disse Serrano, “mas, de repente, percebi que dei à luz a uma pessoa que não conheço e que não sou mais a mãe dessa criança”.

Serrano, que disse estar se recuperando de anos de depressão, está desempregada e tem dois outros filhos de um relacionamento formado após sua separação.

Manon disse que sonha em se radicar no Reino Unido e trabalhar com administração. “A história de meu nascimento me deixou mais forte”, explicou. “Agora até tento prever o impensável.”

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