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Que país é esse?

Em 16 de março de 2015, Renato Duque fez essa pergunta a seu advogado, ao saber que seria preso e conduzido a Curitiba, onde permanece até hoje, já condenado em primeira instância a 20 anos de prisão. Hoje, 200 milhões de brasileiros fazem a mesma pergunta, porém com objetivo diferente, uma vez que a pergunta do criminoso pode ser entendida como “que país é esse onde um juiz de primeira instância ousa prender um membro poderoso do modelo institucional de poder imoral instalado no aparelhamento do Estado?”, enquanto a pergunta dos 200 milhões de brasileiros seria “que país é esse em que a sociedade é punida pela falta de valores fundamentais de seus dirigentes públicos e de seus políticos?”

De fato. Que país é esse em que a dignidade e a honra da sociedade são punidas pela imoral busca desesperada do poder, da imoral e leviana tentativa de persuasão da sociedade por meio de mentiras e farsas? Que país é esse em que toda a sociedade é punida pela incompetência na gestão dos bens públicos, que leva sua principal empresa, a Petrobras, ao estado quase falimentar por causa de desvios bilionários de seus cofres, causando-lhe prejuízo financeiro e econômico na casa das dezenas de bilhões de reais, isso sem falar do prejuízo intangível ainda incalculável, devido à perda de reputação de sua marca, além das ações judiciais nos foros internacionais provocadas por notória e flagrante má gestão em sua governança?

Que país é esse em que a sociedade amarga a maior crise de desemprego que já vimos, chegando ao recorde histórico de 9,6 milhões de desempregados (quase 10% da população economicamente ativa), um absurdo nunca visto antes na história desse país, pelo menos desde que foram criados os mecanismos de controle da taxa de ocupação formal de vagas de emprego? Que país é esse em que o trabalhador tem uma redução da renda média na ordem de 2,5% de 2015 para 2016? Que país é esse que sofre um brutal revés econômico histórico, com recuo de 4,1% do PIB nos últimos 12 meses, motivado pelas políticas econômicas flagrantemente equivocadas, pela má gestão da coisa pública e pela corrupção desenfreada instalada no poder? Que país é esse?

Uma sociedade passiva e tranquila como a nossa, quando se dispõe a ir em massa às ruas, tem suas razões

O que o indivíduo minimamente inteligente percebe é que algo está errado, e muito errado.

Uma sociedade passiva e tranquila como a nossa, quando se dispõe a ir em massa às ruas, tem suas razões – seja pelos quase 10 milhões de desempregados, seja pelo déficit público previsto para 2016 (e estamos apenas em março), que é de quase R$ 100 bilhões (lembrando que o déficit público em 2015 já havia superado os R$ 110 bilhões), seja pela pulverização da corrupção no aparelhamento do Estado, que pelos dados já conhecidos supera a casa dos R$ 30 bilhões.

Isso é mais do que razão para este movimento popular, mas não é só. Existe na sociedade uma saturação diante dos absurdos ditados pelas falácias de quem não pensa no bem do Brasil e sim no seu poder de mando no país, como a utilização do termo “golpe”. Ou seria golpe a obsessão de não ter dignidade a ponto de reconhecer os erros cometidos e assumir, com honra, uma postura de resignação? Por muito menos o Brasil viu líderes renunciarem, suicidarem-se ou serem impedidos. Será que o golpe não estaria na forma inequívoca de resistir com todos os meios para, talvez, tentar impedir que mais verdades obscuras apareçam?

Que país é esse em que seus líderes pregam o enfrentamento de classes ou de ideologias? Isso não condiz com a posição serena de um governante ou ex-governante. Será que estamos diante de pessoas que continuam pensando como guerrilheiros? Ou será que estamos diante de pessoas cujo caráter é regrado pela máxima maquiavélica de que os fins justificam os meios? Parece que esta é a nossa realidade, pois um líder se orgulha do seu ato de bravura: ter mentido num encontro internacional, afirmando que “no Brasil existem 20 milhões de crianças na rua”; ao contar em detalhes, numa exposição pública, tal mentira, dá risadas, divertindo-se com o feito. Ou admite que “tem preguiça de ler, nunca estudou porque não gostava”, o que é no mínimo incoerente com a posição de um líder que, naquele momento, pretendia ser chefe de Estado – afinal, a ignorância não é um requisito digno da posição. Ou seria tudo isso mesmo um verdadeiro golpe que nossa sociedade recebeu (e está recebendo) sem perceber?

Nada mais caracteriza um golpe do que o golpe de dizer que é golpe um processo de impedimento que, legalmente constituído, deverá ser admitido por uma comissão de 65 deputados federais, aprovado por um plenário de 513 deputados federais e 81 senadores.

A insistência de afirmar que trata-se de golpe, insistindo à exaustão, interna e externamente, é a forma de forjar a verdade por meio da mentira. É repugnante, assim como é repugnante a visão que temos do caráter destas lideranças. O que vale é lembrar a célebre afirmação de Abraham Lincoln: “se quiser por à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder”.

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