Tanto o enorme déficit que o Brasil terá neste e no próximo ano quanto a situação de calamidade das contas públicas do Rio de Janeiro têm uma causa: o alto e crescente gasto público. E o remédio quando a crise chega é sempre amargo: cortes de despesas ou aumento de impostos que podem gerar recessão. Em casos extremos, adotam-se paliativos como cortes de benefícios, atraso de salários e todos os seus efeitos econômicos e sociais.
Para evitar que esse tipo de situação ocorra, é necessário ter controle sobre como pode ser aplicado o recurso público. Tal necessidade tem um fator muito claro: quem controla o orçamento (vereadores, deputados) tem incentivos políticos a gastar para satisfazer seus eleitores sem se preocupar diretamente com os custos. Como o orçamento é público e os recursos parecem ser de ninguém, o incentivo é gastar para colher os frutos políticos agora.
Para disciplinar esse comportamento e evitar situações como a do Rio, criam-se regras fiscais para que não se possa elevar gastos indefinidamente. Tais regras são efetivas para mitigar oscilações na economia e, principalmente, evitar o oba-oba com o dinheiro público com a desculpa de estímulo à economia. E sua efetividade depende do desenho das regras. Quanto mais preciso o limite de gasto e menos incerteza quanto à sua medição, mais efetiva é a regra.
Impor restrições orçamentárias implica em mexer nos privilégios de grupos organizados
Um caso que chama a atenção nas leis que surgem como resposta aos problemas fiscais generalizados é o de Curitiba. Duas regras principais do projeto de lei chamam a atenção: crescimento do gasto com pessoal limitado a 70% do crescimento da receita corrente líquida do ano anterior; e a exigência de corte de gastos, caso limites prudenciais sejam atingidos.
Quanto à primeira regra, estabelecer um limite para o gasto com pessoal visa a evitar que, principalmente em anos eleitorais, criem-se cargos públicos para ganhar apoio político. Afinal, qual o melhor indutor de votos se não o emprego? Na prática, a regra induz políticos a moderar a aprovação de gasto com pessoal e, quem sabe, buscar políticas melhores para atrair eleitores.
Já o estabelecimento de limites prudenciais de gastos é um ponto interessante que, na prática, impede que se chegue ao limite de gastos que dispararia cortes mais severos de despesas. Conforme o gasto com pessoal se aproxima do limite estabelecido para os poderes, despesas específicas devem ser reduzidas. Isso evita que os limites máximos sejam atingidos.
Ambas as regras são coerentes com o que já se tem evidência empírica como efetivas regras que beneficiam as contas públicas e eliminam crises fiscais. Os limites são claros, os números não são facilmente manipuláveis, pois usam receitas passadas e já apuradas do ano anterior, sem espaço para previsões no orçamento que nunca se concretizam.
As leis de responsabilidade fiscal impõem o que toda família conhece bem: restrição orçamentária. Não é possível gastar consistentemente acima do que se ganha. Como o governo tem incentivos a gastar sem que a punição seja dura (no limite, recorre-se ao estado ou à União), uma lei que freie esse ímpeto com os mecanismos corretos é bem-vinda.
Infelizmente, o entendimento ainda é de que as leis de responsabilidade fiscal são ruins, pois, na visão de alguns grupos, “gasto público é vida”. Nada mais falacioso. O problema é que impor restrições orçamentárias implica em mexer nos privilégios de grupos organizados que se beneficiam da falta de controle apropriado do gasto público, enquanto os custos de se ampliar o gasto são basicamente “invisíveis”, já que, individualmente, há a percepção de que o serviço público é financiado pelos outros, não do próprio bolso. Até que a bomba explode e o ajuste é duro para todos.
Com leis como a proposta em Curitiba – se respeitadas –, eliminam-se as crises fiscais e um doloroso ajuste futuro em tempos de crise é desnecessário, já que o controle do gasto ao longo do tempo faz esse papel sem dor. É melhor levar uma vida saudável que passar por uma cirurgia.
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