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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Em 22 de setembro, o governo federal, manifestando sua famigerada preocupação com a educação, apresentou uma medida provisória com uma série de alterações no ensino médio. Eu ri. Sim, em meio à consternação geral – principalmente de meus colegas de profissão –, eu ri.

As mudanças, entre outras coisas, visam a implantar a escola de tempo integral e permitir ao aluno escolher as disciplinas que deseja cursar, de acordo com a área que lhe seja afim: Matemática, Ciências Humanas, Linguagens ou Ciências da Natureza (divisão adotada pelo Enem desde 2009). Ou, ainda, a carreira profissional que deseja seguir. Eu ri.

Nossos governantes ignoram que o aluno atual não quer estudar

O modelo atual está ultrapassado

A discussão sobre a reforma do ensino médio tirou o sistema educacional da inércia de um formato ultrapassado e industrializado

Leia o artigo de Élcio Prus, coordenador geral do Ensino Médio Integrado do TecPUC.

Maria Helena Guimarães de Castro, secretária do Ministério da Educação, disse, em entrevista recente, haver um “tédio generalizado” entre os alunos do ensino médio, cujo interesse atual está em coisas como, por exemplo, a “produção artística de rua, que incentiva o protagonismo juvenil”. Como não rir? Ela reclama do número de disciplinas obrigatórias (13) e diz que em países como Finlândia, Singapura e Austrália, o currículo é flexibilizado. Mas não diz que, no último exame internacional de avaliação de alunos, o Pisa, esses países ficaram entre os 15 melhores dos 76 avaliados. O Brasil amarga a 60.ª posição. É para rir ou para chorar? Decidamos após alguns fatos.

O ensino médio tornou-se obrigatório no Brasil em 2009, via Emenda Constitucional 59. E, segundo a Lei de Diretrizes e Bases (LDB), ou 9394/96, é função do ensino médio: a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos; a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; e a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina.

Ou seja, o Estado oferece uma contradição em termos: educação obrigatória e de qualidade. Pretende, compulsoriamente, tornar o aluno proficiente e cidadão. Mas, ironia das ironias, no mesmo dia que a MP foi apresentada, um aluno do ensino médio me perguntou: “professor, ‘vó’ se escreve com acento ou com chapeuzinho?”. Essa é a realidade.

Nossos governantes ignoram que o aluno atual não quer estudar. Ele vai à escola para “socializar”, como dizem os pedagogos; vai pelo Bolsa Família, pelas drogas, pela namorada, pela merenda; menos pelo ensino. Esperar que ele vença o niilismo de sua geração e escolha qual disciplina prefere é superestimar sua capacidade, hoje movida quase que exclusivamente por uma espécie de prazer suicida. Generalizo, mas não muito. Sem falar no total cerceamento politicamente correto das sanções disciplinares: o aluno faz o que quer.

E tem mais: uma vez que a educação é uma obrigação do Estado, este deve responsabilizar-se, inclusive, pelo aluno que se recusa a estudar. Se ele desiste, o Estado deve arrastá-lo até a escola. Se os pais não cooperam, o Conselho Tutelar deve assumir a brincadeira. Mas, no fim, a culpa sempre recai sobre o professor, que, por um salário que não chega a R$ 20 a hora/aula, não torna a aula atrativa. Tem como dar certo?

“Mas esperem!”, eles dizem. “E se os alunos escolherem as disciplinas que querem estudar, e os mantivermos por mais tempo sob nossa tutela?”

Sim, eu ri.

Paulo Cruz, mestre em Ciências da Religião, é professor de Filosofia no ensino médio da rede estadual paulista.
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