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| Foto: Nelson Almeida/AFP

Assim como o ex-presidente e atual presidiário Lula, que uma vez se definiu como “metamorfose ambulante”, a campanha de Fernando Haddad neste segundo turno tem se caracterizado pelo abandono gradual de certos trechos do plano de governo e até mesmo da estratégia que os petistas davam como certa para atingir a vitória. Uma mudança que a militância já viu ocorrer outras vezes, e à qual dá seu aval, já que o que interessa é chegar ao poder, e para isso, como disse uma vez Dilma Rousseff, “faz-se o diabo”.

Quem ficou de lado na publicidade do partido foi o próprio Lula. Se antes proclamava-se aos quatro ventos que “Lula é Haddad, Haddad é Lula”, agora o nome do ex-presidente sumiu da comunicação visual, que passou a mostrar apenas os nomes de Haddad e sua vice, Manuela D’Ávila. Na propaganda eleitoral em rádio e televisão, a presença de Lula também é reduzida. Até mesmo as visitas semanais de Haddad a Lula foram interrompidas nesta segunda-feira, quando o petista não foi se aconselhar com seu mestre e senhor na sede da Polícia Federal, em Curitiba – por ordem do próprio Lula, diga-se de passagem. Tudo para tentar conquistar a parcela do eleitorado que tem justa ojeriza à ideia de ver um país sendo governado de dentro de uma cela, por alguém que foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro.

O Haddad verde-amarelo, sem Lula, sem Constituinte e sem aborto, não passa de uma armadilha para pegar eleitores incautos

Aos poucos, algumas propostas que constam do plano de governo petista também começam a ser apagadas, em nome do apoio de outros partidos ou personalidades de esquerda e centro-esquerda, contra quem o petismo manobrou violentamente no primeiro turno, caso de Ciro Gomes, ou que têm sido atacados há muito mais tempo – caso dos tucanos, antagonizados desde sempre, ou de Marina Silva, vítima da campanha maliciosa do PT em 2014. A ideia de uma Assembleia Constituinte, que ocuparia Haddad logo em seus primeiros dias no Planalto em caso de vitória, foi uma das primeiras a ser abandonada em nome da boa convivência com antigos adversários neste segundo turno.

A campanha de Haddad estaria até mesmo negando algumas plataformas históricas do petismo. O plano de governo afirma que, “fundado no princípio constitucional da laicidade do Estado, promoveremos a saúde integral da mulher para o pleno exercício dos direitos sexuais e reprodutivos”, expressão que mascara a defesa da legalização do aborto. Mas, após uma visita à cúpula da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em que os líderes católicos manifestaram preocupação com o assunto, Haddad disse que sua plataforma “prevê ações alinhadas” com os princípios católicos. Para completar o pacote, alguns dias depois o candidato e sua vice participaram de uma missa no dia de Nossa Senhora Aparecida.

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O que estariam os petistas pensando de tantas recuos? Estariam indignados ao ver seu candidato escondendo a maior estrela petista, refugando em temas caros à militância, mudando o plano de governo e amenizando o discurso para agradar os moderados? Uma pista para a possível resposta está em 2010. Naquele ano, Dilma Rousseff perdeu uma vitória certa no primeiro turno devido à discussão sobre o aborto, cuja legalização ela já tinha defendido em várias ocasiões, quando ainda não era candidata. Durante a campanha, adotou uma postura diferente, e suas aliadas compreenderam e incentivaram a estratégia. “Eu entendo e faria a mesma coisa. (...) Há oito anos [de governo] para isso, ou quatro que seja. Não é o fim do mundo”, disse a líder feminista Rose Marie Muraro à Folha de S.Paulo na ocasião.

Em resumo, o Haddad verde-amarelo, sem Lula, sem Constituinte, sem aborto e com todas as eventuais concessões que ainda venha a fazer até o dia 28 não passa de uma armadilha para pegar eleitores incautos, aqueles que já se esqueceram de tudo o que o PT fez ou tentou fazer quando ocupou o Planalto. Uma vez de volta instalado na cúpula do Poder Executivo, teríamos de volta o PT de sempre, aquele que não desiste de fazer das instituições republicanas meros puxadinhos do partido, e que exalta como heróis nacionais os seus líderes condenados e presos por corrupção. Depois do “Lulinha paz e amor” de 2002, difícil acreditar que o “Haddad paz e amor” de 2018 seja capaz de convencer alguém.

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