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editorial

Ânimos acirrados

No dia 21 de outubro, dois grupos que defendem a saída de Dilma Rousseff, o Movimento Brasil Livre e o Vem pra Rua, montaram um acampamento no gramado localizado em frente do Congresso Nacional, em Brasília, como forma de pressionar os parlamentares para que não ignorem os diversos pedidos de impeachment já protocolados na Câmara dos Deputados. Um protesto pacífico, que havia inclusive rejeitado a presença de grupos defensores de um golpe militar a que chamam, enganosamente, de “intervenção”. No entanto, na tarde de quarta-feira, um grupo de militantes do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) se instalou ao lado do acampamento antipetista e, depois, passou a hostilizar os integrantes do MBL e do Vem pra Rua.

Apesar de algumas descrições do episódio falarem em “confronto”, o que ocorreu foi mais uma agressão de um grupo contra outro. Os manifestantes contrários ao governo fizeram um cordão humano, de costas para os sem-teto, que partiram para a violência. Os integrantes do MTST alegam que foram provocados e que estavam no gramado não como reação ao acampamento pró-impeachment, e sim para se manifestar contra a Lei Antiterrorismo, que seria votada no Senado naquela mesma quarta-feira. Se era esse o caso, então, como explicar a violência registrada em vídeos e fotografias?

No passado, a esquerda sentiu na carne os resultados de um discurso de truculência, e até por isso é ainda mais grave que sejam agora os seus líderes a repeti-lo

A agressão de quarta-feira ocorreu no dia seguinte às ameaças feitas pelo líder do PT na Câmara, Sibá Machado. Quando integrantes do MBL estenderam duas faixas contrárias a Dilma nas galerias da Câmara e cantaram slogans contra o governo, o petista respondeu, aos gritos: “Eu vou juntar gente e vou botar vocês pra correr daqui de frente do Congresso. Bando de vagabundos. São vagabundos. Vocês são vagabundos. Vamos pro pau com vocês agora”. Esse tipo de discurso, no entanto, não é exclusividade do deputado do Acre; tem sido usado em diversas ocasiões ao longo deste ano.

Em fevereiro, o ex-presidente Lula afirmou, em ato realizado na Associação Brasileira de Imprensa: “Eu quero paz e democracia, mas, se eles não querem, nós sabemos brigar também. Sobretudo quando o Stédile colocar o exército dele do nosso lado”, referindo-se a João Pedro Stédile, líder do MST que também estava presente na ocasião – enquanto isso, do lado de fora, militantes agrediam manifestantes, incluindo funcionários da Petrobras, que tinham ido protestar contra a pilhagem da estatal. Em agosto, foi a vez do presidente da CUT, Vagner Freitas, reclamar do “preconceito de classe” no Brasil e acrescentar que “isso implica agora, nesse momento, ir para as ruas, entrincheirados, com arma na mão, se tentarem derrubar a presidente Dilma Rousseff (...) qualquer tentativa de atentado à democracia, à senhora ou ao presidente Lula, nós seremos um exército que vai enfrentar essa burguesia na rua”. Dilma estava presente na ocasião e, mesmo com a menção a confronto armado, não fez qualquer repreensão à fala do sindicalista.

E, mais recentemente, o ex-candidato à Presidência Mauro Iasi, do PCB, em um congresso de movimentos sociais, perguntou-se “qual vai ser nosso diálogo como esse setor, o setor conservador?”. Como resposta, pregou não o diálogo, mas a luta, e citou o poema “Perguntas a um homem bom”, de Bertolt Brecht, que termina com as seguintes palavras: “Sabemos que és nosso inimigo. Por isso vamos encostar-te ao paredão. Mas, tendo em conta os teus méritos e boas qualidades, vamos encostar-te a um bom paredão e matar-te com uma boa bala de uma boa espingarda e enterrar-te com uma boa pá na boa terra”.

Tudo isso não contribui em absolutamente nada para a construção da democracia. No passado, a esquerda sentiu na carne os resultados de um discurso de truculência, e até por isso é ainda mais grave que sejam agora os seus líderes a repeti-lo. Nas democracias, o embate se dá no campo das ideias, não das armas. Ações como o ataque aos manifestantes antipetistas no gramado do Congresso revelam a urgência de que as pessoas públicas pensem mais nas consequências daquilo que dizem, e de que a sociedade esteja atenta para denunciar e repelir veementemente qualquer discurso que pregue a violência contra aqueles de quem se discorda.

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