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editorial

O rombo na Previdência

Há poucos dias, o Ministério da Previdência Social divulgou uma informação-bomba que deveria ser tratada pelo governo e pela sociedade como a principal questão das finanças públicas atuais, e que pode se transformar no maior problema econômico nacional. Trata-se da previsão, no orçamento do governo federal de 2016, de um déficit de R$ 194,9 bilhões nas contas da Previdência Social dos servidores públicos federais e dos trabalhadores do setor privado.

O sistema de previdência administrado pelo governo federal pode ser dividido em dois regimes. Um é o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), ao qual estão obrigados todos os trabalhadores do setor privado e que é administrado pelo governo por meio do INSS – portanto, um sistema estatal. O outro é o Regime Próprio da Previdência dos Servidores (RPPS), destinado aos funcionários públicos da União. Segundo o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), além do déficit, as duas previdências são responsabilidade do governo e se transformaram em mecanismo concentrador de renda.

Conforme os dados da contabilidade do governo referentes a 2014, o déficit da previdência dos servidores públicos foi de R$ 63,4 bilhões para pagar aposentadorias e pensões de 1 milhão de beneficiários, enquanto o déficit da previdência dos trabalhadores privados foi de R$ 56,7 bilhões para um total de 27 milhões de benefícios. Esses números de 2014, que já representavam um grave problema, devem piorar de maneira acelerada em 2016, segundo o Ministério da Previdência Social. A previsão para o próximo ano é de um déficit de R$ 70 bilhões para beneficiar o mesmo 1 milhão de servidores públicos federais, mais um déficit de R$ 124,9 bilhões para pagar 28 milhões de benefícios aos trabalhadores privados. Nessa conta não estão os déficits da previdência dos servidores dos estados e dos municípios que têm seu próprio regime de previdência.

O Brasil foi longe demais no tratamento desigual entre beneficiários do setor público e do setor privado

A explosão do déficit no orçamento federal se deve em grande parte à queda na arrecadação do INSS em razão da crise econômica e do desemprego. Essas razões são conjunturais e foram agravadas pela recessão econômica e pela forte queda no Produto Interno Bruto (PIB) nos últimos dois anos. Entretanto, a previdência social brasileira padece de distorções estruturais que, mais cedo ou mais tarde, terão de ser enfrentadas apesar do alto custo político.

Um dos obstáculos para a discussão de qualquer reforma previdenciária está na diferença entre o tamanho dos benefícios altamente generosos pagos aos funcionários públicos e o tamanho dos benefícios pagos aos trabalhadores privados. O Brasil foi longe demais no tratamento desigual entre os dois tipos de beneficiários, sobretudo ao dar aposentadoria aos funcionários do governo igual ao salário integral da ativa, enquanto o teto atual da aposentadoria do trabalhador privado vinculado ao INSS é de R$ 4.663. Esse fosso que separa a aposentadoria dos funcionários do governo e a dos trabalhadores privados atinge, também, as pensões por morte, cuja generosidade não tem paralelo no mundo desenvolvido.

Além de diminuir a diferença de tratamento entre trabalhadores púbicos e trabalhadores privados, uma reforma previdenciária tem de enfrentar também a questão da idade mínima para a aposentadoria, principalmente em razão do aumento da expectativa média de vida e do aumento da população idosa. Daqui a 30 anos, os brasileiros com mais de 65 anos, que hoje são 7,6% da população, passarão a representar 20%. O país não pode demorar muito a enfrentar a questão, pois a bomba já está ligada e prestes a explodir, conforme se vê pelo déficit de R$ 194,9 bilhões de 2016 somente na previdência administrada pelo governo federal.

O tamanho desse problema levou o Tribunal de Contas da União (TCU), no ano passado, a exigir que o governo federal apresentasse um plano capaz de evitar a quebra do sistema previdenciário, e deu prazo de 12 meses à Casa Civil para a entrega do plano. Porém, não se ouve mais falar no assunto. O enfrentamento de uma questão tão grave como essa depende de que governo e sociedade possam dialogar em regime de confiança mútua, algo que inexiste no Brasil de hoje. Infelizmente, quanto mais o país demorar para tratar da reforma previdenciária, maior será o atraso econômico e mais tempo vai levar para superar a pobreza, se é que o país vai superá-la um dia.

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