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editorial

Políticas pela metade

A equação é mais ou menos conhecida. Os mecanismos eleitorais funcionam como uma draga – para se reelegerem, gestores públicos precisam mostrar resultados em quatro anos. Alegam que no primeiro ano arrumam a casa, acertam as contas, fecham as goteiras – não raro deixadas por seus próprios partidos. No segundo ano, os projetos se desenham, restando um ano para colocá-los em prática. O último ano é de pressa para garantir êxito nas urnas. Assim não caminha a humanidade. Para ter o que mostrar ao eleitor – na melhor das hipóteses –, os eleitos tendem a adotar projetos de curto prazo, deixando os de médio e longo prazo para o dia de São Nunca. Isso quando não incorrem em outro erro: o de tratar com velocidade projetos que exigem vagar. Implantam-nos, apresentam à sociedade, tornam-se merecedores de debate e espaço na imprensa, mas os deixam à míngua antes mesmo que se solidifiquem.

Curitiba, depois de se tornar conhecida por seus projetos urbanos simples, acessíveis e continuados, também se rendeu à praga do imediatismo já faz uns bons 15 anos. É de lamentar, pois bons programas ficaram pelo meio, até sumirem ou virarem caricatura, como se pudessem ter mostrado resultados dentro da dinâmica e da escala urbana, num estalar de dedos.

Uma das marcas da descontinuidade é manter parte da estrutura dos projetos, mas nas mãos da burocracia

O SoHo Rebouças poderia ir para o topo da lista. No início dos anos 2000, o antigo bairro industrial de Curitiba, charmoso, central, recebeu uma série de estímulos para vencer a degradação por meio da arte, tal como mostrou ser possível o papa desse tipo de política, o festejado ministro da Cultura britânico Chris Smith. Muitos fogos de artifício foram soltos para comemorar essa proposta que não era só inventiva, era necessária, e assim permanece. Uma das boas sacadas foram as residências culturais. Artistas ganharam uma espécie de bolsa-aluguel para levar as malas e o ateliê para alguma rua de paralelepípedos do Rebouças. Falou-se em feira de artesanato na Rua Piquiri. Em atrair fabriquetas de artesanato para as oficinas seminais da Rua Engenheiros Rebouças. Uma das ações mais concretas foi levar a sede da Fundação Cultural de Curitiba para um antigo moinho. E tornar mais flexível o “som alto” para que bares se estabelecessem.

A Rua Chile, de fato, se tornou um paraíso de restaurantes, lanchonetes, ala jovem, não por causa do SoHo, mas por ser caminho da roça dos milhares de alunos da PUCPR e de outros tantos da UniCuritiba. No mais, as velhas oficinas não saíram do bairro tão facilmente, a sede da FCC minguou como espaço cultural e vingou como espaço administrativo. Nem feira, nem residências. Nem moradias de estudante, como era previsto – sem falar no luto pela derrubada do Matte Leão, para dar lugar a uma igreja evangélica de arquitetura espetaculosa. Em resumo, a prefeitura desistiu do SoHo porque ele pedia mais tempo para se estabelecer.

Outro exemplo é a revitalização da Rua Riachuelo, iniciada faz cinco anos. Mentores privados do projeto não escondiam sua pressa de que os brechós elegantes tomassem conta da região, tornando-a atraente para a classe média. A prefeitura, que fez bonito no começo, fazendo corpo a corpo com os comerciantes e moradores – de modo a cativá-los –, deixou, depois disso, a péssima impressão de que não terminou o serviço. Não enterrou toda a fiação, por exemplo. Se o Ippuc não desistiu da Riachuelo, pelo menos deixou a impressão de que sim.

Também da última década e meia merece ser citada a tentativa de salvar o bairro Umbará de ser engolido pelo crescimento das franjas da cidade. É do fim dos anos 2000 o estudo do casario de madeira da Rua Nicola Pellanda, para fins de preservação. Pouco restou para contar a história. Casario abaixo. A Nicola virou via de grande circulação e a intenção de fazer do bairro das olarias um paradigma – ocupado por todas as faixas sociais –, se permanece como política, não permanece como discurso. Em miúdos, uma das marcas da descontinuidade é manter parte da estrutura dos projetos, mas nas mãos da burocracia, destituída de discursos de sentido. Sem dar a medida do urbano, aumentam as forças do antiurbano, expressão que traduz o tal do “crescimento sem desenvolvimento”.

Há de se dizer que há luzes em meio à escuridão trazida pelas práticas de tiro curto. O projeto Equidade, da Secretaria Municipal de Educação, é o caso. É notável o empenho institucional em garantir condições de ensino e de aprendizagem para escolas plantadas em zonas vulneráveis. Os resultados não virão a galope. No que diz respeito à mobilidade, tudo que envolva a convivência de vários modais, do mesmo modo, não se dá para a noite para o dia. No frigir dos ovos, sem desmerecer as ações de fôlego, tantas vezes necessárias, que vença a boa política pública, dona de relógios bem particulares.

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