Diante das suspeitas de fraude no ponto de servidores estaduais, o governo do Paraná incumbiu as secretarias de Administração (Seap) e de Planejamento (SEPL) de padronizarem a forma como efetivos e comissionados registram sua frequência ao trabalho. Hoje cada uma das 57 unidades que compõem a gestão estadual faz como quer o controle dos servidores. Livre.jor apurou para a Gazeta do Povo que pelo menos três delas, a Casa Civil, a Comec (órgão vinculado à Secretaria de Desenvolvimento Urbano para a coordenação da Grande Curitiba) e o Instituto das Águas já foram alvo de recomendações do Ministério Público do Paraná (MP-PR).
Contudo, ao mesmo tempo em que confirmou para a reportagem a existência desse grupo de trabalho, a gestão Beto Richa (PSDB) informa que não estabeleceu prazo para a conclusão dos estudos, nem formalizou quem são os encarregados da tarefa. “Os trabalhos dessa comissão não foram estabelecidos por ato oficial. Ela vem se reunindo frequentemente com a orientação de que o estudo avalie todas as ferramentas atualmente utilizadas e a legislação pertinente da forma mais completa possível, sem um prazo definido”, disse a Seap à reportagem.
No comunicado, a Secretaria de Administração admite que a pressão do MP-PR é uma das razões para padronizar os registros de frequência. “A análise [desse grupo formado pela Seap e pela SEPL] deve gerar uma padronização nos procedimentos de controle de frequência nas secretarias e demais órgãos. Após isso, o estado deve adotar o sistema que se demonstrar mais transparente, prático, acessível e econômico, além de atender todos os questionamentos que o Ministério Público tem feito”.
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Falsidade ideológica
As recomendações recriminando o uso feito pela Casa Civil e pela Comec do registro manual de frequência foram feitas pela promotora Claudia Madalozo. Em ambas, do primeiro semestre deste ano, a argumentação dela é parecida. Ao liberaram os servidores para dizerem que entraram e saíram do trabalho todos os dias no mesmíssimo horário (prática conhecida como “ponto britânico”), os órgãos estariam fazendo vista grossa para a impontualidade e para as faltas de funcionários.
“[São condutas] que importam enriquecimento ilícito, que causam prejuízo ao erário e que atentam contra os princípios da administração pública”, diz a promotora, nas recomendações. Para ela, o “ponto britânico”, em vigor na Casa Civil até fevereiro deste ano, quando resolução assinada por Valdir Rossoni (PSDB) proibiu a prática, por exemplo, poderia ser enquadrado no tipo penal de falsidade ideológica, pois dava margem à “inserção de informações falsas em documentos públicos”. Um caso mais grave foi registrado pela promotora na Comec.
Na recomendação 1/2017, Claudia Madalozo relata que, durante a investigação do inquérito civil que embasa o procedimento, “o diretor-presidente da Comec afirmou que determinados servidores deixaram de comparecer à repartição, no entanto seus registros de frequência estão perfeitamente preenchidos e vistados”. Para ela, isso caracteriza controles de jornada “inefetivos e inválidos”, que poderiam ser tipificados como falsidade ideológica pois significam “inserção de informações falsas em documentos públicos”.
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Longe da capital, o quadro se repete. Em Santo Antônio da Platina, a promotora pública Kele Bahena, como foi noticiado em primeira mão pelo Livre.jor na Gazeta do Povo , exigiu que o Instituto das Águas, autarquia ligada à Secretaria de Estado do Meio Ambiente, exonerasse oito comissionados e adotasse o ponto biométrico em todas as unidades. Ela, igual aos casos de Curitiba, começou a investigação depois de denúncias de haver no órgão público “comissionados sem qualificação técnica para a função desempenhada e sem cumprir jornada de trabalho”.
Ponto eletrônico
No dia 26 de outubro, a Casa Civil publicou uma resolução avisando aos funcionários que, a partir de 1º de dezembro, o registro de frequência no órgão seria feito de forma eletrônica. Cada um, com a sua identificação e senha para uso dos computadores da repartição, faria a anotação diariamente. A adoção desse novo modelo, em uso pela Secretaria da Agricultura e Abastecimento (Seab), já tinha sido adiantada pela Gazeta do Povo quando o jornal divulgou que o órgão, pressionado pelo MP, havia proibido o “ponto britânico”, em fevereiro.
A Casa Civil tinha dito à reportagem, naquela ocasião, que o ponto eletrônico estaria em pleno funcionamento em novembro deste ano, uma vez que já tinha passado por uma fase de testes no órgão. Além de adiar o início do novo registro para dezembro, a resolução estipula o prazo de três meses para “adaptações e ajustes”, postergando o pleno funcionamento da ferramenta para março de 2018.
Perguntada se o novo modelo não abriria brecha para outros tipos de fraudes, como preencher a frequência sem sair de casa, do computador pessoal do funcionário, a Casa Civil negou a hipótese. O órgão argumenta que a autenticação do login e senha só valeria em computadores oficialmente conectados à rede interna do departamento público. Sobre a possibilidade de a folha ponto ser preenchida de uma só vez, na véspera do fechamento, como era possível com o registro em papel, a Casa Civil disse que isso não ocorrerá, pois “o sistema não permite lançamentos pretéritos [ou seja, passados ou retroativos]”.
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