O mercado paralelo de compra de placas de táxis em Curitiba é escancarado. Comercializar as permissões públicas virou um negócio rentável. Além da venda direta, os autorizatários "donos" das permissões podem ganhar dinheiro sem sair de casa, arrendando as licenças ou cobrando diárias de taxistas, conforme noticiou a Gazeta do Povo na edição de ontem. A irregularidade fomenta um balcão obscuro de comércio de placas de táxi a chamada "máfia laranja", revelada pela Gazeta do Povo, em 2008. Tanto tempo depois, o problema continua. Impulsionadas pelas especulações, as permissões chegam a custar muito dinheiro.
A Urbanização Curitiba S.A (Urbs) autoriza transferência das licenças "por ato voluntário do transferente" a motoristas profissionais autônomos. Mas está evidente que ninguém se desfaz de uma forma de investimento. Denúncias apresentadas ao Ministério Público do Trabalho (MPT) apontam que as licenças foram negociadas entre R$ 100 mil e R$ 200 mil nos últimos anos.
Pesquisa
Um levantamento realizado com 101 taxistas, há cerca de dois anos, foi elaborado quando uma investigação sobre o trabalho de "segundo" motorista em Curitiba foi aberta pelo procurador Gláucio Araújo de Oliveira. A reportagem teve acesso aos questionários. Dos entrevistados, 94 afirmaram que existe um mercado paralelo de venda de permissões. Três deles disseram que havia negociações de placas até o segundo semestre de 2008 e quatro não quiseram responder. A maioria deles detalhou como funcionava a transferência.
"Há um mercado escancarado, que só não vê quem não quer. E este é um dos motivos de não haver novas autorizações. Não se adquire concessões por menos de R$ 130 mil", escreveu um dos motoristas entrevistados pelo MPT. Os nomes dos taxistas foram preservados pelo órgão, já que todos pediram sigilo ao procurador.
Processo judicial
A investigação embasou uma ação do Ministério Público do Paraná, que tramita na 4.ª Vara de Fazenda Pública de Curitiba. A ação busca barrar a transferência das permissões entre particulares e determinar que sejam realizados procedimentos licitatórios para outorga de novas permissões. A ação foi motivada por denúncias de dezenas de taxistas, que procuraram a Promotoria de Defesa do Patrimônio Público. O MP tenta identificar se os autorizatários atuam dentro da lei, que determina que quem tem a permissão precisa dirigir o táxi no mínimo oito horas por dia. "Além disso, foi constatada ausência de fiscalização efetiva por parte da Urbs, para apurar se o taxista não exercia outra atividade e se os permissionários de fato dirigiam os carros", declara o promotor Paulo Ovídio Santos Lima.
"Trabalhei 28 anos para ter uma placa"
O falante senhor de cabelos grisalhos tem a experiência de quem passou 31 anos no banco de condutor de um táxi. A permissão foi conquistada três anos atrás, de forma irregular, comprada no mercado paralelo. Pagou R$ 195 mil, à vista, pela placa. Na ocasião, teve de emprestar R$ 80 mil dos irmãos, um dos quais é senador por um estado da Região Norte.
"Eu trabalhei 28 anos como segundo piloto para ter a minha placa. Agora, se [os agentes da prefeitura] recolherem, a minha mulher vai viver de quê? É justo eu perder algo que eu batalhei a vida toda?", questiona o taxista, que não revela o nome.
Ter mais de 70 anos não o impede de continuar dirigindo o próprio táxi. Para ele, imoralidade maior comete quem compra permissões para fins especulativos. "Eu sou taxista. Dirijo meu táxi todo santo dia. Pior é juiz, médico, advogado que tem placa só para fazer dinheiro", finaliza.
Outro taxista, de 73 anos, há 32 comprou a primeira placa no mercado paralelo. "Eu era motorista de caminhão e, na época, achei que era bom negócio mudar", disse. Hoje, ele dirige o carro por meio período e, no contra-turno, outro taxista assume o volante.
O homem conta que chegou a comprar mais uma placa de táxi, ainda na década de 1980, mas vendeu a permissão porque recebeu uma boa oferta de dinheiro. Com a experiência de quem conhece o dia a dia nos pontos, ele afirma que as compras sempre ocorreram. "Mais de 80% de quem tem placa comprou", crava.