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| Foto: Antônio More/Gazeta do Povo/Arquivo/

O contrato firmado com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) prometia trazer melhorias e resolver os problemas do Complexo Hospital de Clínicas (CHC) que inclui o Hospital de Clínicas (HC) e a Maternidade Victor Ferreira do Amaral. Um ano e três meses após a assinatura do acordo de cogestão com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), a situação piorou, na avaliação de profissionais de saúde, funcionários terceirizados, professores e pacientes ouvidos pela Tribuna.

De acordo com trabalhadores, desde que a Ebserh assumiu a administração em outubro de 2014 faltam materiais e suprimentos básicos, como luvas e seringas; profissionais foram desviados de atividade, atuam em dupla função e sofrem assédio moral; professores e residentes sentem que a função de ensino da instituição foi prejudicada; e pacientes sofrem com longas esperas e procedimentos cancelados por falta de insumos.

Falta de material

A estudante Daísa Lourenço Nogueira fez um desabafo em e-mail enviado ao jornal na semana passada. Seu irmão de 22 anos, diagnosticado com leucemia linfoide aguda e em tratamento no HC, precisava de uma transfusão de sangue urgentemente. “O banco tem o sangue, mas não tem os suprimentos necessários de teste e preparo para que [o sangue] seja aplicado.

Outros pacientes com o mesmo problema estão há mais de três semanas esperando por quimioterapia. O hospital todo está apresentando falta de medicamentos e outros itens (...) Por que isso está acontecendo? Estamos falando de hospital referência”, relatou. Poucos dias depois, o irmão dela faleceu.

Números do Complexo Hospital de Clínicas (CHC)

Capacidade total de leitos - 670

Leitos em uso - 430

Funcionários da Ebserh - 380

Funcionários da Funpar - 853

Servidores da UFPR - 1.911

Total de Funcionários 3.152

Cirurgias 540/mês

Internamentos 1.300/mês

Benefícios da gestão Ebserh

- 380 novos funcionários

- R$ 4 milhões em equipamentos para o serviço de neurocirurgia

- Abertura de 14 leitos de UTI adulto, 14 de UTI pediátrica e neonatal, 8 de UTI cirúrgica e 2 novas salas no centro cirúrgico

- Implantação do Núcleo Interno de Regulação de Leitos

- Reestruturação de Recursos Humanos, da Unidade de Processamento de Materiais Esterilizados, do Serviço de Anestesiologia e de todos os serviços médicos da Maternidade Victor Ferreira do Amaral

- Previsão de abertura, neste 1º semestre, de mais 6 leitos de UTI geral, 10 de UTI neonatal e 2 de UTI pediátrica.

Um servidor da UFPR que trabalha no centro cirúrgico do HC – e preferiu não se identificar – conta que técnicos de enfermagem e enfermeiros recebem a indignação de familiares quando um procedimento é cancelado por carência de insumos. “O pessoal vem em cima de nós. Às vezes, o paciente já fez o jejum, já criou uma expectativa, e a cirurgia é cancelada por falta de material”.

Médicos e professores descontentes

A forma de administração da Ebserh desagrada também aos médicos do CHC. O presidente do Sindicato dos Médicos do Paraná (Simepar) e secretário-geral da Federação Nacional dos Médicos (Fenam), Mário Antônio Ferrari, conta que a implantação do modelo da Ebserh traz preocupações.

“Médicos do quadro da UFPR que foram colocados à disposição da empresa estão em desvio de função. Profissionais capacitados que desempenharam por anos atividades técnicas específicas foram desviados para atividade ambulatorial. Sempre fomos críticos à adoção do modelo, mas nossa expectativa era de que pelo menos funcionasse. O que temos observado é muita queixa”, declara.

Ele alerta ainda para a perda de autonomia da universidade, que pode prejudicar a qualidade da formação no hospital-escola. É a mesma posição da Associação dos Professores da Universidade Federal do Paraná (APUFPR), que divulgou nota afirmando que a gestão da Ebserh trouxe “prejuízo às relações de ensino-aprendizagem”.

Reclamações variadas

Em visita ao HC, a reportagem conversou com profissionais terceirizados e verificou que a insatisfação é geral. Segundo dois trabalhadores da cozinha, falta verba até para servir comida. “Fecharam o refeitório para os funcionários com a desculpa de que vão fazer reforma, mas até agora não vimos nada. A verdade é que não tem dinheiro nem para servir o mesmo número de refeições que antes”, conta um deles.

Um funcionário do almoxarifado pertencente ao quadro da Funpar, que trabalha há 29 anos no HC, diz que, depois que a Ebserh assumiu a gestão, tudo piorou: atraso de salários, carência de insumos e condições de alimentação. “Nosso décimo terceiro foi sair no dia 23 de dezembro. Nem comida está tendo. O refeitório fechou e o preço do Restaurante Universitário (RU/UFPR) subiu de R$ 1,90 para R$ 6 de um dia para o outro”, reclama.

Normalização até o fim do mês

A assessoria de imprensa da Ebserh informou que o diretor do hospital, Flávio Tomasich, não daria entrevista porque estava doente. Segundo a administração do hospital, o estoque de medicações foi reestabelecido. “O CHC tem se empenhado sistematicamente para resolução destas questões e nenhum serviço foi fechado por falta de insumos. A normalização total dos estoques está prevista para o final deste mês”.

Sobre o refeitório, o CHC informou que, por razão de reforma, ele permanece fechado para funcionários e que o preço praticado pelo RU/UFPR é de responsabilidade da universidade. Com relação aos salários dos funcionários da Funpar, que chegaram a aprovar indicativo de greve para o feriado de carnaval caso não recebessem em dia, o hospital declarou que a responsabilidade pelo pagamento não é da Ebserh. “Os salários estão em dia. Ocorreu um atraso no mês de janeiro devido à prorrogação do ano fiscal para o dia 8 de janeiro e a problemas no Sistema de Convênios (Siconv)”, apontou, em nota enviada à Tribuna.

Atendimento continua bom

Apesar da escassez de itens básicos e da sobrecarga dos funcionários, pacientes e familiares têm elogios ao HC. “O atendimento foi ótimo, resolveu o meu câncer, não tenho do que reclamar. Só tenho a agradecer”, diz Alexsander Faria de Brito, 19 anos, que faz tratamento contra um tumor no testículo. Os exames, cirurgias e quimioterapia foram realizados no hospital e ele não teve de lidar com grandes esperas.

Segundo a professora Janaína Lima, 21, “o pessoal é muito atencioso”. Seu tio aguardava uma cirurgia na vesícula. “O único transtorno foi que ele chegou ao UPA 24h e teve que esperar 18 horas até ser internado, por falta de leito no HC”, relata. O eletricista Odilon Marques da Luz, 63, tem uma cunhada que trata Doença de Chagas há 10 anos na instituição. “Sempre foram excelentes. Até ligavam para ela para lembrar que tinha consulta marcada”.

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