O orçamento atual disponível para o Departamento de Execução Penal do Paraná (Depen), órgão ligado à Secretaria de Segurança e Administração Penitenciária (Sesp), não é suficiente para pagar todas as despesas geradas pelos presídios até o final deste ano, sobre as quais pesam um considerável aumento nos custos de manutenção por detento.
Quanto custa um preso no PR? Veja cálculo
Para conseguir manter em dia o pagamento de todos os contratos de serviço, como alimentação, compra de vestuários, entre outras que chegarão a partir de outubro, o valor disponibilizado pelo Estado para 2016 - R$ 620,6 milhões - precisará ser incrementado em 22%. Ou seja, os cofres da pasta precisarão receber R$ 136,2 milhões a mais.
Orçamento de 2017
A proposta de orçamento de 2017 ainda está sendo trabalhada pela equipe do Depen. Mas, somente em despesas correntes, a conta já passa dos R$ 285 milhões. O total a ser gasto pelo órgão no ano que vem, contando pessoal e outras necessidades, deve passar dos R$ 900 milhões.
Deste total necessário, R$ 77 milhões já estão autorizados, mas foram contingenciados. O restante ainda será solicitado à Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa), sendo que vários contratos já estão aditados em 25%. O quadro financeiro foi descrito pelo delegado da Polícia Civil Luiz Alberto Cartaxo de Moura, diretor do Depen.
Levantamento detalhado do setor financeiro do departamento, obtido com exclusividade pela reportagem, aponta que o custo mensal de um preso no Paraná chegou a R$ 3.016,40 em julho. No começo do ano estava em R$ 2.680,63, o que representa um aumento de 12,5%.
O custo-preso vigente, valor gasto por mês para manter cada detento, é resultado da divisão entre o orçamento atual, que é de R$ 698,3 milhões (já incluindo os R$ 77 milhões ainda contingenciados, mas já autorizados), pelo número de presos no sistema penitenciário. Em julho eram 19.293 detentos. O número não leva em conta os 9,6 mil detidos em delegacias e que não consomem recursos do Depen, e os 3,2 mil monitorados por tornozeleira eletrônica - cuja manutenção custa quase R$ 300 ao mês por cada um.
“Mesmo com o contingenciado não fecha. Para fechar o ano, o custo-preso teria que ser de 3.270”, afirmou o diretor. Segundo ele, o valor mínimo do orçamento para encerrar o ano sem deixar de cumprir os contratos é de R$ 756,8 mil. A conta ainda dispensa o gasto gerado pelos policiais militares lotados para guarda das muralhadas das penitenciárias e para escolta de detentos.
Problema de planejamento
A insuficiência persistente de verba ajuda a explicar o porquê de as contas do Depen não estarem fechando. Em maio de 2015, quando entrou no departamento, Cartaxo encontrou 19,4 mil presos nas penitenciárias, quase o mesmo número atual. Mas, de acordo com o departamento financeiro da pasta, o acréscimo de verba é essencial uma vez que o orçamento disponibilizado pelo Estado para 2016 já continha um déficit grande do necessário para manter o sistema funcionando, sem contar o aditamento de contratos e inflação corrente.
“O problema é alimentação. Esses contratos eu posso aditar só em 25%. Quase todos estão aditados. Então eu não posso aumentar a população carcerária indiscriminadamente em razão de falta de recurso para isso”, disse o delegado.
Hoje, o governo do Paraná o é responsável, nas penitenciárias e em delegacias, por 32 mil presos, 12% a mais que maio do ano passado. O número de presos cresceu essencialmente em unidades da Polícia Civil.
Alternativas necessárias
Para equilibrar o sistema, além da necessidade de mais recursos financeiros, Cartaxo está apostando também nas Associações de Proteção aos Condenados (Apacs) para auxiliar na saída dos presos das penitenciárias comuns e no crescimento dos presos monitorados, que saem pelas audiências de custódia e mutirões carcerários – aqueles que não permanecem presos por decisão judicial após o flagrante ou progridem de regime. Há atualmente 27 municípios interessados em ter unidades com métodos Apacs para reinserção de detentos.
O método é baseado em 12 premissas que implicam em participação efetiva dos moradores, solidariedade entre os presos, trabalho, assistência jurídica, participação da família, valorização humana e religião. Ele pretende também aumentar o número de presos monitorados pelas tornozeleiras para 5 mil.
“São alternativas mais baratas porque exigem emprego mínimo de pessoal. As Apacs, por exemplo, são unidades pequenas e seria muito bom para os pequenos municípios e, nos grandes, para as mulheres. Sobre as tornozeleiras, estou propondo a renovação deste contrato com aditamento de 25% que o próprio contrato prevê. Subiria para 6,2 mil monitorados”, comentou.
Privatização
Além das prometidas construções e reformas desde o primeiro ano da gestão do governador Beto Richa de 14 penitenciárias, o que abriria sete mil vagas, Cartaxo tem debatido com a Casa Civil a proposta de construir mais três penitenciárias por meio da parceria público privada. “O sistema exclusivamente público gera uma demanda financeira muito mais que o necessário. É o caso do PR”, mencionou. Segundo ele, as empresas entrariam com o imóvel e o tratamento penal completo.
“Só compete ao Estado pagar o custo-preso e gerenciar a unidade. O diretor seria da iniciativa pública. Seriam três com 500 presos cada. As outras que serão públicas equipadas, e entregues a gestão, que pode ser público ou privada. Podemos terceirizar”, completou.
Gestão além da segurança é o caminho para mudar quadro, aponta especialista
A doutora em Sociologia pela USP, professora da UFABC e pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP, Camila Nunes Dias, afirmou que a privatização ou a terceirização do sistema, como as Apacs, não são respostas adequadas ao caos no sistema penitenciário. Segundo ela, o maior problema, a superlotação carcerária do país, não será resolvida por essas alternativas, que são pontuais.
“Elas são sempre maquiagens apresentadas como soluções, quando não resolvem o problema. Evidentemente, que as empresas não vão ter interesse em arcar com o custo alto dos presos”, explicou. Segundo ela, as empresas trabalham essencialmente com o aumento do lucro, que no caso das penitenciárias, só será mantido com o crescimento da população carcerária.
“Já as Apacs não são universalizadas. A ideia parece interessante, mas apenas para um determinado público. Assim como o modelo industrial de penitenciárias, elas vão produzir mais uma assimetria. A pergunta é o que farão com os presos que não servem para Apacs?”, indagou. As associações atendem apenas presos que não integram facções criminosas.
De acordo com Camila, nem as ações, como audiências de custódia e mutirões carcerários, que tentam mudar a cultura do encarceramento do país dão conta de abrir o gargalo de saída dos detentos. “Apesar de serem necessárias, essas medidas são extremamente limitadas e pontuais, incapazes de reverter o processo. Claro, é melhor tê-las do que não tê-las”, explicou.
A especialista sugeriu que se comece a viabilizar uma segurança pública e penitenciária longe a ótica tradicional. “É preciso encontrar modelos de gestão e controle do crime que passem longe da prisão, além da polícia, pela visão preventiva”, explicou.
Ela deu como exemplo passar a investir mais em educação integral com escolas públicas de qualidade. “Reduzir a vulnerabilidade de jovens e crianças, aumentando a profissionalização, por exemplo. Tudo isso caberia em um modelo de segurança pública ampliado, mas não existe no Brasil”, criticou.
Sindarspen critica proposta de privatização
O vice-presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná, José Roberto Neves, criticou também a proposta de privatização do sistema. Ele ressaltou, assim como Camila, que o preço do custo-preso para iniciativa privada não vai diminuir para o estado. “É só verificar as pesquisas feitas pela Pastoral Carcerária que apontam que o custo aumenta quando empresas assumem a penitenciária. Passam de R$ 4 mil ao mês por preso”, disse. Segundo ele, as empresas operam, legitimamente, para lucrar, mas o tratamento penal é uma atividade fim do estado, portanto, não poderia ser privatizado.
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