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Entrevista

Paul Singer , economista, professor da Universidade de São Paulo (USP) e secretário nacional de Economia Solidária (Senaes).

Qual a contribuição da moeda social para a economia?

O banco comunitário surge, geralmente, em uma comunidade pobre que deseja sair da pobreza. Ele propicia a criação de uma moeda social e oferta de microcrédito. Quem recebe empréstimo em moeda social gasta em moeda social. Isso significa que há um mercado protegido para o que é vendido dentro do bairro, o que estimula a atividade econômica. Em Fortaleza, a presença do Banco Palmas, por exemplo, une a comunidade e a habilita a tomar outras decisões.

Como está hoje a situação dos bancos comunitários?

Há mais de 50 deles em todo o Brasil. Boa parte dos bancos é patrocinada e fomentada pelo Instituto Palmas. Eles se ajudam mutuamente e encontram soluções em conjunto. Nos próximos anos devem ser criadas mais instituições.

Há algum aspecto negativo nas moedas sociais?

Pode existir, mas se houver eu des­co­­nheço. Os bancos comunitários aju­dam a combater a pobreza. Uma das metas do atual governo é eliminar a extrema pobreza até 2014 e os bancos comunitários podem ajudar.

Os principais valores da economia solidária são a cooperação e solidariedade. Eles podeexistir em larga escala?

Já são. São valores tradicionais na cultura das pessoas pobres. Um dos exemplos são as comunidades quilombolas. Se elas não praticassem a solidariedade não teriam sobrevivido. Hoje há uma comunidade no Maranhão que já desenvolveu sua própria moeda social, com aspectos culturais e estéticos próprios.

Ceará

Cédula mudou comunidade

Os moradores do Conjunto Palmeira, hoje com 30 mil habitantes, têm crédito garantido no Banco Palmas – mesmo aqueles que estão com o nome em listas de devedores – e a taxa de inadimplência é de apenas 2,5%. O coordenador-geral da instituição, João Joaquim de Melo Neto, explica que foram tomadas algumas precauções para não prejudicar o banco e a comunidade.

A palma, como a moeda local é chamada, é indexada e tem lastro em reais. Ou seja, cada palma vale 1 Real e quando os comerciantes locais precisam pagar fornecedores de fora podem fazer a conversão no banco. "Ninguém supera a pobreza sozinho. Muitas vezes as pessoas estão fragilizadas e é necessário esse tipo de suporte", diz Melo Neto.

Além do ganho financeiro, a moeda social traz confiança para a comunidade e capital social. O Banco Palmas, por exemplo, tem uma linha de crédito especial para as mulheres beneficiárias do Bolsa Família. Elas têm crédito pré-aprovado de R$ 2,5 mil e recebem um atendimento exclusivo por um ano de técnicos da instituição para desenvolver o próprio negócio, além de participar de um curso de educação financeira. Agora o banco prepara um programa para oferecer internet e telefonia gratuita dentro da comunidade.

  • Confira quais as moedas sociais mais conhecidas

Criadas para incentivar o desenvolvimento da economia de comunidades pobres, as moedas sociais ganharam força nos últimos anos e hoje movimentam milhões de reais todos os anos por meio de bancos comunitários. A moeda não oficial equivale ao real e é usada apenas em uma determinada localidade, favorecendo o comércio e o empreendedorismo da região. No Paraná, no próximo dia 10 de novembro a moeda pinhão completa uma década de existência, sendo utilizada hoje por 11 clubes de troca em Curitiba e Região Metropolitana.

Em setembro deste ano, a Cidade de Deus, favela localizada no Rio de Janeiro, também começou a trabalhar com uma moeda própria, a CDD. As cédulas são utilizadas no comércio local e, além de ajudar a desenvolver a comunidade, geram mais capital social entre os moradores. As notas têm fotografias de grandes lideranças comunitárias.

A primeira moeda social bem-sucedida no país foi implantada em Fortaleza, no Ceará. O Banco Palmas surgiu em 1998 impulsionado pela organização comunitária e desde então já comercializou mais de R$ 1,6 bilhão em crédito. Tudo começou na década de 70 quando pescadores que moravam na beira-mar foram despejados e mandados para uma área afastada do centro da cidade sem infraestrutura alguma.

Os moradores organizaram e financiaram quase toda a urbanização do bairro, da água encanada à energia elétrica. Mas as lideranças comunitárias perceberam que muitos vizinhos estavam vendendo as casas porque não tinham condições de pagar as tarifas dos serviços. Então se começou a discutir formas de gerar renda para a população.

Uma pesquisa realizada na década de 90 mostrou que 80% de tudo que era comprado pelos moradores era adquirido fora do bairro. Os líderes comunitários decidiram pensar em estratégias para fortalecer o comércio local e assim incrementar a renda. Assim nasceu o Banco Palmas e a moeda social mais famosa do país. A iniciativa teve tanto sucesso que os novos "banqueiros" ajudaram a implantar mais 66 bancos comunitários em dez estados do país e hoje fazem negócios com gigantes como o Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal.

Paraná

No Paraná a moeda social pinhão foi criada pelo Centro de Formação Urbano Rural Irmã Araújo (Cefuria). Lourdes Marchi, integrante do conselho do Cefuria, explica que o pinhão é usado quinzenalmente nas reuniões dos grupos de troca, quando as pessoas se encontram para trocar produtos e experiências. Há ainda uma reunião mensal com a participação de todas as equipes e oficinas de economia solidária. Cada grupo congrega até 20 integrantes, que comercializam desde verduras até artesanato. "Estamos construindo outra economia, não somente a baseada no lucro e exploração do trabalho. Os participantes trabalham com autogestão e não há um patrão."

Princípios

Veja como é estruturado um banco comunitário:

Lastro

O circulante local tem lastro na moeda nacional, o real (R$). Ou seja, para cada moeda emitida, existe no banco comunitário, um correspondente em real;

Segurança

As moedas são produzidas com componentes de segurança (papel-moeda, marca d’água, código de barra, números serial) para evitar falsificações;

Incentivo

A circulação é livre no comércio local e, geralmente, quem compra com a moeda social recebe um desconto promovido pelos comerciantes e produtores para incentivar o uso da moeda no município/bairro;

Troca

Qualquer produtor/comerciante cadastrado no Banco Comunitario pode trocar moeda social por reais caso necessite fazer uma compra ou pagamento fora do município/bairro.

Restrição

A exemplo do Banco Comunitário, o controle e as riquezas geradas pela moeda ficam na comunidade.

Fonte: Banco Palmas.

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