Para muita gente, trocar o carro pela bicicleta parece loucura. A comodidade e o conforto, somados à “cultura do automóvel”, pesam a favor dos motorizados. Os governantes sabem disso e algumas cidades resolveram pagar para o cidadão que for de bicicleta para o trabalho. Na França, cerca de 400 pessoas participaram de um projeto piloto, em 2014. Agora Milão, na Itália, estuda adotar sistema semelhante.
Pagar os ciclistas é a proposta da cidade para entrar no “Plano Bici”, anunciado pelo governo italiano, que liberou 35 milhões de euros para ciclomobilidade em todo o país. A ideia foi anunciada no início de fevereiro pelo assessor de Mobilidade da prefeitura de Milão, Pierfrancesco Maran, e foi noticiada por jornais locais.
O controle seria feito por meio de um aplicativo para smartphone, que pode controlar a rota or meio do sistema de GPS, segundo o gabinete de Maran revelou ao jornal inglês The Guardian. Mesmo que seja um sistema com falhas, não traria grande prejuízo ao usuário ou à administração pública, já que o valor investido deve ser pequeno.
Mas, em escala, pode ser necessário um grande investimento. Em Massarosa, distrito pequeno na região da Toscana, também na Itália, é pago um valor de 0,25 de euro por quilômetro pedalado. O máximo que cada cidadão tem direito é a 50 euros por mês. Em uma amostragem de oito mil pessoas (número que a França tentou atingir, sem sucesso), por exemplo, o investimento público pode chegar a 4,8 milhões de euros ao ano.
Parece muito, mas não é, defende João Lacerda, da Associação Transporte Ativo, responsável por publicar o “Perfil do Ciclista”. “A bicicleta tira custos [do poder público], porque estou deixando de poluir o ar. Eu vou onerar menos o poder público porque minha saúde vai estar melhor”.
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Levantamento da prefeitura de Copenhague, na Dinamarca, aponta que houve uma “economia socioeconômica” de R$ 0,88 para cada quilômetro pedalado na cidade em 2014, conforme estudo publicado no ano passado. No carro, o quilômetro rodado gerou um passivo de R$ 3,06. O cálculo leva em conta gastos com tempo de deslocamento e saúde (como acidentes, congestionamento, barulho e poluição).
O professor Alcindo Neckel, do núcleo de Mobilidade Urbana do Imed, de Passo Fundo, acredita que o município deve fazer de tudo para incentivar o uso da bicicleta dentro das cidades, que em 20 anos não vão mais comportar os automóveis individuais.
Experiência francesa
Durante seis meses, cerca de 8,2 mil funcionários de 20 empresas francesas tiveram a chance ir ao trabalho de bicicleta em troca de dinheiro: 0,25 de euro por quilômetro. Os resultados, divulgados pelo governo Francês, são tímidos. Apenas 419 pessoas aderiram à proposta. Destas, mais da metade (54%) eram usuários de transporte público. Apenas 19% iam para o trabalho de carro –boa parte destes no sistema de “carona solidária”. Por outro lado, antes do projeto apenas 200 trabalhadores destas empresas utilizavam a bicicleta. Significa um aumento de 50%.
Especialistas apontam que a política de incentivo à bicicleta teria de ser casada com restrições ao uso do carro. João Lacerda, da Transporte Ativo, alerta que, pelo contrário, hoje o automóvel tem privilégios. Pois embora o proprietário pague Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores(IPVA), custos como o da expansão da malha rodoviária são compartilhados com toda a sociedade.
O assessor de mobilidade da Secretaria de Trânsito de Curitiba (Setran), Jorge Brand, o “Goura”, alerta que a restrição ao automóvel não pode ser vista como uma “afronta” ao direito de ir a vir. Mas que o crescimento das cidades impõe uma revisão de privilégios concedidos aos carros, como estacionamentos públicos nas ruas, que podem ter que ser revistos para estimular outros modais.