Do doleiro Alberto Youssef ao ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, as peças-chave da Operação Lava Jato e outros acusados “menores” contrataram advogados de Curitiba para defendê-los diante do juiz Sergio Moro. São pelo menos 50 advogados da cidade que trabalham em processos da operação, segundo levantamento da Gazeta do Povo.
A visibilidade da Lava Jato jogou os holofotes da advocacia nacional sobre os profissionais do Direito da capital. E não foi somente pelo fato de a sede da operação ser Curitiba, o que naturalmente os favorece. Advogados paranaenses tinham experiência na forma de atuação de Moro – um dos magistrados pioneiros no uso de novos instrumentos legais que estão provocando uma revolução no Direito Penal brasileiro. Em função disso, vários defensores do Paraná viraram referência para o país.
Lava Jato tirou foco do eixo Rio-São Paulo, diz advogada de Curitiba
Defensora do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró e da doleira Nelma Kodama, a advogada Alessi Brandão afirma que a Lava Jato deu oportunidade para que as grandes defesas de casos criminais saíssem do eixo Rio-São Paulo. “Os advogados do Paraná mostraram que têm tanta competência quanto os de fora”, disse.
Alessi e Beno Brandão faziam parte da defesa de Cerveró desde o início do processo. Quando o advogado principal do ex-diretor, Edson Ribeiro, foi preso por tentar atrapalhar as investigações, os irmãos Brandão assumiram a defesa. “A gente já tinha visto que a operação estava bastante evoluída e desde o início éramos favoráveis à colaboração”, explica Alessi.
Alessi explica o fato dos advogados paranaenses terem acabado referência em colaborações premiadas. “Tenho certeza que nós acabamos saindo na frente porque os advogados aqui do Paraná têm um ponto muito grande em comum: a maioria é advogados jovens, que têm uma cabeça um pouco mais fresca e com tendência a novidades”, diz a advogada.
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Anos 90
O último figurão da Lava Jato a recorrer a um advogado curitibano foi Eduardo Cunha. Logo após ser preso, na quarta-feira passada (19), contratou o criminalista Marlus Arns de Oliveira – que já tinha como clientes outros acusados pela Lava Jato e havia sido responsável por fechar alguns acordos de colaboração premiada com a operação.
Oliveira afirma que a forma de atuação do Ministério Público Federal (MPF) e do juiz Moro, usando novos instrumentos processuais e de investigação, vem desde a década de 1990, no caso Banestado – investigação de lavagem de dinheiro e remessa ilegal de valores ao exterior. “Coincidentemente, o juiz era o mesmo que o da Lava Jato e alguns procuradores também”, diz o advogado, que atuou naquele caso. A experiência do caso Banestado rendeu frutos para a advocacia local. “Desde a década de 90 o Paraná é referência em Direito Penal Econômico”, diz Oliveira.
A Lei 12.850, de 2013, acelerou as mudanças no Direito Penal nacional, reforçando, por exemplo, o instituto da colaboração premiada. Segundo o criminalista, o país passou a adotar um modelo jurídico com menos garantias ao acusado e maior possibilidade de negociação do suspeito para colaborar com a investigação e reduzir sua pena. “Nós estamos passando por uma grande mudança no Direito Penal.” A Lava Jato virou o grande marco dos novos tempos. E os criminalistas paranaenses estavam preparados.
Interesse do cliente
Negociador da primeira grande colaboração premiada na Lava Jato, a de Alberto Youssef, o advogado Antônio Figueiredo Basto afirma que esse instrumento veio para ficar. Ele também foi o primeiro defensor a fechar um acordo desse tipo no país, em 2003, justamente no caso Banestado.
Basto diz que a forma de produção de provas mudou e hoje ficou mais fácil para comprovar ilícitos. “A colaboração não é só do interesse do Ministério Público e da polícia, mas do cliente. É um direito de defesa. A ideia não é expandir conflito, mas compor, negociar.” O próprio caso de Youssef é emblemático. Depois de dois anos e oito meses preso, o doleiro vai deixar a cadeia em 17 de novembro para cumprir prisão domiciliar. Se não fechasse a delação, ficaria muito mais tempo no regime fechado: “Seria condenado a mais de cem anos”, estima Basto.
Mas o fato de ser pioneiro teve seus percalços. “No início [da Lava Jato], sofri críticas infundadas e mentiras, inclusive acusações pessoais. Muitos advogados de fora, por conveniência, não gostavam do instituto da delação premiada. Tinham a objeção de que isso poderia atingir muitos de seus clientes”, diz Basto. Segundo ele, isso não ocorre atualmente, pois vários profissionais que criticavam seu trabalho passaram a negociar acordos de colaboração premiada para seus clientes. São os novos tempos.
O Paraná sempre teve grandes profissionais na área criminal, reconhecidos nacionalmente. E é lógico que um caso de visibilidade nacional [como a Lava Jato] permite que esses profissionais tenham a oportunidade de demonstrar sua qualidade.
Do outro lado da ‘trincheira’, escritório curitibano ajuda na acusação
Advogados curitibanos não estão se destacando apenas na defesa de acusados pela Lava Jato. Mas também do outro lado da “trincheira”. O escritório do jurista René Dotti foi contratado pela Petrobras para defender os interesses da estatal nos processos referentes à operação. Dotti e seus colegas trabalham como assistentes do Ministério Público Federal (MPF) na acusação.
E já conseguiram vitórias importantes. “Inicialmente, havia o entendimento de que os valores recuperados deveriam ir para a União. Nosso trabalho foi mostrar que a Petrobras era a vítima e que tinha direito aos valores”, diz Dotti. Deu certo. O dinheiro recuperado pela operação tem voltado para a estatal.
Do alto de várias décadas do exercício da advocacia, Dotti é categórico em afirmar: “Esse é o processo de maior repercussão nacional”. Para ele, os processos da Lava Jato vão servir de exemplo para as gerações do presente e do futuro, pois fazem o resgate da ética na política.
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