Eles confessam que estão inseguros quanto ao papel que devem desempenhar na vida a dois, mas não querem que as mulheres saibam disso. Preferem se abrir com amigos, seja numa roda de bar, ou mesmo em redes sociais – detalhe: sempre em grupos fechados e com a presença validada por um administrador, outro homem, é claro. Admitir dúvidas publicamente está fora de cogitação, por conta da máxima de que o sexo masculino é seguro de si e emocionalmente equilibrado.
Fato é que as mudanças na sociedade, desde o começo do século passado até os anos 2000, deixaram para trás muitas certezas – econômicas, históricas e, não poderia deixar de ser, de gênero. O sociólogo polanês Zygmunt Bauman define o século 21 como dos “tempos líquidos”, em que nada é feito para durar, nem mesmo os papéis estabelecidos por homens e mulheres nas relações. E é essa volatilidade que tem causado muita insegurança ao público masculino. Como se portar no primeiro encontro? O que as mulheres esperam deles? Mais romântico ou mais viril? Tudo bem dividir a conta? E cuidar da pele e do corpo?
Se antes adjetivos como forte, provedor, confiante e emocionalmente equilibrado bastavam para se reconhecer enquanto “homem”, hoje parece existir uma cobrança maior para que eles também incorporem outras qualidades à personalidade, como companheirismo, sensibilidade e romantismo. Toda essa pressão, enfim, estaria levando à tal “crise do macho”?
“Os grandes estereótipos em torno dos quais a masculinidade se estruturou, como o papel de provedor, entraram em crise”, alertou o escritor e psicanalista Contardo Calligaris em entrevista à Folha de S. Paulo, jornal do qual também é colunista. Para a socióloga e professora doutora do Unibrasil Centro Universitário, Laura Garbini Both, é também uma crise de equilíbrio de poder nas relações a dois. “Mulheres ‘empoderadas’ economicamente deslocam o papel tradicional do homem, em uma sociedade patriarcal como a nossa”, argumenta.
A discussão pode até parecer antiga, mas foi capa da revista americana The Economist no mês de maio. Com o título “O sexo mais fraco”, o artigo afirma que os homens estão com problemas e que alguns deles não souberam se adaptar aos novos tempos que envolvem as conquistas femininas. A publicação lembra que a crescente igualdade dos sexos é uma das maiores conquistas da geração pós-guerra, e que as pessoas têm mais oportunidades do que nunca para alcançar suas ambições, independentemente do gênero. Mas alguns homens não estariam conseguindo assimilar essa nova realidade. Por isso, como diz a revista, é “hora de dar uma mão a eles”.
Ambiguidade E parece mesmo que os homens precisam de ajuda. O livro Como Conquistar Uma Mulher em 15 Minutos (Editora Alto Astral, 160 págs., R$ 39,90 na Livraria Cultura), lançado pelo coach de relacionamento Eduardo Santorini, em poucas semanas figurou na lista dos mais vendidos no Brasil. Com dicas de como se conectar com as mulheres – com conselhos para todas as etapas da conquista –, a publicação tem como objetivo “inspirar homens a se tornarem mais confiantes, carismáticos e atraentes”. O site Atitude de Homem, que originou a obra impressa, conta com mais de 1 milhão de leitores por mês, segundo Santorini. Ele afirma que, há 30 e 40 anos, o processo de conquista era bem diferente, mas que, tal qual naquela época, o homem “não precisa usar máscaras” para conquistar uma mulher.
A socióloga e professora doutora do Unibrasil diz que a sociedade vive um momento de ambiguidade. “Ao mesmo tempo em que se discute publicamente a união homoafetiva, ensina-se que os filhos não podem ter comportamento de ‘mulherzinha’. A superação desses paradigmas se dará na própria experiência histórica, em consequência da educação e da garantia do direito justo e democrático para todos”, espera Laura. Ela lembra que em uma sociedade machista em que o homem é o centro do poder, o reconhecimento da masculinidade começa na educação dada dentro de casa. É neste momento que os meninos aprendem que homens não choram, que não devem expressar sentimentos e que precisam ser viris e, acima de tudo, machos.
Em xeque Mas, quando, afinal, surgiu a discussão sobre o novo papel do homem? Pesquisadores apontam que foi na efervescente década de 1960 o início das discussões sobre a necessidade de uma redefinição dos modelos, dos estereótipos e dos contextos sociais. A origem do debate é atribuída ao movimento feminista, segundo a professora da Universidade Federal de Santa Maria Vera Lúcia Pires, formada em Letras, com doutorado em Linguística e pesquisadora de relações de gênero. Ao colocar em pauta questões fundamentais à revisão dos papéis de gênero e das relações do poder que se estabeleceram durante muitos séculos, o feminismo, junto com as reivindicações do movimento gay, levaram a um questionamento do comportamento masculino. “Estamos todos em busca da identificação de novos papéis, homens e mulheres. É um cenário bem diversificado de experiência, que retrata bem a busca de um papel para se situar”, acredita Laura.
Metro ou lumber?
A crise masculina fez com que emergissem novos modelos de identificação para o homem na sociedade – o metrossexual e o lumbersexual, por exemplo. Assim como nos clássicos romances do século 19, eles são antagônicos entre si e não admitem meio termo. É quase como a música de Caetano Veloso: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”.
O termo “metrossexual” foi cunhado pelo jornalista britânico Mark Simpson em 1994 e define o homem cosmopolita dos grandes centros urbanos, que gosta de fazer compras, se depilar e cuidar excessivamente do corpo. Em 2002, o mesmo jornalista definiu que o ex-jogador de futebol inglês David Beckman seria um exímio representante do termo.
O lumbersexual, por sua vez, é exatamente o oposto disso. A palavra é uma mistura de lumberjack (lenhador) + sexual, um homem inspirado no universo do “lenhador”. A representação mais típica é uma barba comprida, geralmente sem muitos cuidados estéticos, camisa xadrez de flanela e um jeans clássico. No Brasil, o ator Cauã Reymond é considerado um legítimo lumbersexual.
O professor de Psicologia da Universidade Positivo, Gilberto Gaertner, explica que são formas de se atentar aos novos tempos: “Quando uma identidade vai ao extremo, logo surge outra alternativa para se contrapor a esta. Cabe ressaltar que as exigências atuais vão horizontalizando homens e mulheres e tornando-se cada vez mais parecidos, assim como a globalização faz com a cultura e os valores”. O coach de relacionamentos Eduardo Santorni crê num modelo que busque o equilíbrio entre as duas identidades. “O homem precisa ser honesto, autêntico, esse é o segredo de qualquer relacionamento. Ele precisa equilibrar as identidades, ora mais sensível, ora mais seguro, esse é o grande desafio”, acredita.
O QUE ELES PENSAM
“No meu casamento, discutimos e concordamos que eu deveria auxiliar mais em casa, ser mais companheiro, sensível, sem deixar a masculinidade de lado.” (Fábio*, empresário de 39 anos, que reconhece que os homens precisam buscar um equilíbrio. E a solução pode ser encontrada na conversa a dois)
“Não sei se ela quer que eu seja mais sensível ou mais durão. É muito complicado ter que se adequar em cada relação.” (André*, estudante de 17 anos, que admite ficar muito em dúvida quando inicia um relacionamento)
* Os sobrenomes foram omitidos a pedido dos entrevistados.
O QUE ELAS DIZEM
“Tem que ser mais compreensivo, mais calmo, não se precipitar em relação ao primeiro encontro. É preciso conquistar primeiro e esquecer a figura do homem ‘pegador’ e entender que o interior importa mais que o exterior. Ele precisa ser um pouquinho de cada coisa: sedutor, sensível e cavalheiro.” (Paula Haubert, 31 anos, vendedora)
“O homem tem que ser mais compreensivo, dedicado, ajudar muito em casa e entender que a parceria é a palavra chave na relação do século 21. Também precisa esquecer a figura do machão, que não é boa pra ninguém. Mas não pode ser muito sensível porque enche o saco. Acho que o equilíbrio é a melhor coisa.” (Cristiane Ribeiro, 34 anos, vendedora)
“O homem precisa ter autonomia. A mulher conquistou um grande espaço e, com isso, eles não sabem mais como agir. Ele precisa ter personalidade e atitude. Não é aquele herói do romantismo. Tem que ser sensato, inteligente e respeitoso.”(Lucimar Silva, 46 anos, gestora educacional)
“Precisa ser companheiro. Aquele que vai construir junto com você uma vida pensando no futuro. Homem provedor não agrega nada, precisa compartilhar e construir junto com você, cada um cumprindo a sua função. Se eu posso trabalhar, eu vou contribuir nas despesas.” (Selma Maria Garcia, 55 anos, professora)
“O problema também está nas mulheres. Nós fazemos muitos joguinhos, não confiamos em nós mesmas, não somos 100% honestas, isso é uma droga e faz com que o homem fique muito em dúvida de como agir no relacionamento. Honestidade e lealdade precisam fazer parte do homem, bem como entender que a liberdade é primordial para uma relação dar certo no século 21.” (Sabrina Esquibel, 25 anos, vendedora)
Serviço
Fotos: Letícia Akemi/Gazeta do Povo. Modelo: Duílio de Pol, Primeira Linha Casting, fone (41) 9838-8150. Ilustrações:Eduardo Vieira, da Circle Design. Agradecimentos: Shopping Mueller (enquete). Peças usadas pelo modelo: Salomon Artigos Esportivos (camisa), ParkShoppingBarigüi. VR (necessaire), ParkShoppingBarigüi.
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