Quem precisa de um novo passaporte e não tem previsão para recebê-lo desde a
suspensão do serviço pela Polícia Federal (PF) pode
recorrer à Justiça para exigir a emissão — e até pedir reparação de danos caso tenha algum prejuízo devido à falta do documento. A avaliação é do
Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) e de juristas ouvidos pelo
Viver Bem.Para os especialistas, a PF feriu a Constituição Federal e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) ao interromper a emissão de novos passaportes na última terça-feira (27), e pode ser responsabilizada tanto em ações individuais quanto coletivas.
Para o advogado Antônio Carlos Efing, presidente da
Comissão de Direito do Consumidor da OAB Paraná, a ilegalidade é clara tanto do ponto de vista constitucional quanto do CDC, mesmo que o cidadão não precise do passaporte para uma emergência —
caso em que o documento ainda é emitido.
“A emissão de passaportes é um serviço público, insubstituível, essencial, que não pode ser interrompido”, explica. Para Efing, o serviço se enquadra no direito do consumidor por ser pago, ainda que seja público — caso que também se aplicaria ao pedágio em estradas, por exemplo. “Quem se sentir ofendido tem um caminho jurídico”, avalia.
Esta também é a opinião de Bruno Boris, professor de direito da Universidade Mackenzie, de São Paulo. Para ele, mesmo que a PF deixe claro que não considera o mero prejuízo com viagens de turismo uma situação de emergência, o Estado pode ser responsabilizado se demorar demais para entregar o documento (o prazo normal para a entrega, após todos os trâmites, é de cerca de seis dias úteis, segundo o site da PF).
“É como o estacionamento que coloca placas dizendo que não se responsabiliza por danos a objetos deixados no veículo”, compara. “Se a demora da emissão extrapolar o razoável, e o cidadão tiver prejuízo devido a um problema do governo, o Estado pode ter que responder.”
Melhor solução é esperar
Segundo o Idec, no entanto, uma ação judicial deve ser a última medida a ser adotada pelo consumidor. O órgão se manifestou na última quarta-feira (28) sobre a ilegalidade da medida da PF e disse que pediu a atuação do
Ministério Público Federal (MPF) no caso. Aos consumidores, no entanto, orientou que procurem
remarcar suas viagens — sem ônus — enquanto o serviço não é normalizado.
“A não ser que a viagem seja em julho, não é o momento para entrar em desespero”, diz Claudia Almeida, advogada do Instituto. “Entendemos que a União vai tomar medidas cabíveis para resolver a situação diante da ilegalidade notória do caso, então a orientação é esperar.”
Na pior das hipóteses — caso o consumidor não consiga cancelar uma viagem já marcada e seja impossibilitado de ir —, aí sim cabe procurar um juizado federal.
O instituto disponibilizou um
modelo de carta para ser enviada à PF exigindo a emissão do passaporte. Segundo Claudia, o documento poderá comprovar que foi tentada uma solução extrajudicial caso seja preciso ir à Justiça.
Sem garantias
O professor de Direito Administrativo da PUCPR Bernardo Strobel Guimarães faz outra ressalva: mesmo que um juiz decida favoravelmente ao cidadão, não há garantias de que a decisão será cumprida.
Guimarães concorda que é possível entrar com uma ação — para ele, a emissão dos documentos não poderia ser interrompida por se tratar de um serviço essencial associado a um direito fundamental — o de ir e vir. “Há grandes chances de você obter uma ordem formal que garanta o seu direito de ter o passaporte emitido. O difícil é dar materialidade a isso”, alerta.
Ele cita como exemplo casos de categorias em greve que desobedecem a ordens judiciais para manter o funcionamento mínimo de serviços públicos essenciais. “Não dá para achar que você vai sair do Judiciário com o passaporte na mão em poucos dias”, diz.
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