O acordo entre Mercosul e União Europeia anunciado nesta sexta-feira (28) pelos dois blocos, que abrange bens, serviços, investimentos e compras governamentais, prevê que, em até 10 anos, as tarifas sobre alguns produtos do agronegócio brasileiro caiam para zero, de acordo com documento divulgado pelo governo federal. Itens como suco de laranja, frutas (melões, melancias, laranjas, limões, entre outras), café solúvel, peixes, crustáceos e óleos vegetais estão na lista. Não foram detalhadas as cotas acordadas para carnes bovina, suína e de aves, açúcar, etanol, arroz, ovos e mel. Os produtos industriais também terão tarifa zerada.
Mais de 90% das exportações do Mercosul para a União Europeia não terão cobrança de taxa, segundo o documento, e os outros 10% terão acesso preferencial com quotas e tarifas reduzidas. Segundo o governo, antes do acordo, apenas 24% das exportações brasileiras entravam livres de tributo na UE. Foram ainda negociados requisitos específicos de origem para todos os produtos que não foram detalhados. "Os requisitos acordados ampliarão o acesso do Brasil a insumos tecnológicos a preços mais competitivos", informou o governo.
O acordo tem 22 capítulos e anexos relativos aos temas: acesso tarifário ao mercado de bens; regras de origem; medidas sanitárias e fitossanitárias; barreiras técnicas ao comércio (com um anexo automotivo); defesa comercial; salvaguardas bilaterais; defesa da concorrência; cooperação aduaneira; facilitação de comércio; antifraude; serviços e estabelecimento; compras governamentais; propriedade intelectual (com anexo de indicações geográficas); solução de controvérsias; integração regional; diálogos; empresas estatais; subsídios; anexo de vinhos e destilados; temas institucionais, legais e horizontais; comércio e desenvolvimento sustentável, e pequenas e médias empresas.
O texto do governo brasileiro afirma que os compromissos assumidos vão agilizar e reduzir custos de importação e exportação, com o intercâmbio de documentos eletrônicos. "Os dois lados assumiram compromissos ambiciosos em áreas como despacho de bens perecíveis (tema de interesse para o Brasil, considerando a importância da pauta de exportações agrícolas destinada ao bloco europeu) e admissão temporária de bens", completa.
O acordo comercial concluído nesta sexta é o "mais amplo" do tipo já negociado pelo bloco de países sul-americanos e constituirá "uma das maiores áreas de livre-comércio do mundo", afirmam em nota conjunta os ministérios das Relações Exteriores, da Economia e da Agricultura brasileiros. Segundo os órgãos do governo, o acordo permitirá ao país aumentar em quase US$ 100 bilhões as exportações para o bloco europeu. O Ministério da Economia afirmou, ainda, que o acordo representará um incremento de US$ 87,5 bilhões em 15 anos ao Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Esse incremento, ainda segundo a pasta, pode chegar a US$ 125 bilhões se consideradas a redução das barreiras não tarifárias e o incremento esperado na produtividade total dos fatores de produção. Também se espera que o aumento de investimentos no país seja da ordem de US$ 113 bilhões.
Quanto aos produtos agrícolas brasileiros, os ministérios informaram que "os exportadores brasileiros obterão ampliação do acesso, por meio de cotas, para carnes, açúcar e etanol, entre outros", afirma a nota. Segundo os ministérios, cachaças, queijos, vinhos e cafés do Brasil serão reconhecidos como distintivos.
Argentina comemora acordo
O ministro de Relações Exteriores da Argentina, Jorge Faurie, considera que a conclusão do acordo entre Mercosul e União Europeia mostra que o bloco formado por Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai está pronto para assinar diferentes tratados com outros países. Ele afirmou que novas negociações deverão concluídas "muito em breve", citando Canadá, Cingapura e Coreia do Sul como exemplo. "O Mercosul reconhece que tem que ser mais conectado com o resto do mundo em termos de produtividade e que isso é uma necessidade que estamos trabalhando internamente no bloco", disse Faurie. A Argentina assumiu a presidência rotativa do bloco.
O ministro argentino ressaltou que os avanços para a efetiva conclusão do acordo se iniciaram há cerca de três anos – a negociação, no entanto, se arrasta há duas décadas. Segundo Faurie, o acordo Mercosul-UE era desacreditado e sua conclusão deve acelerar outras negociações. "Estamos felizes com o resultado, porque às vezes alguns que viam do lado de fora diziam 'vocês nunca vão fazer o acordo Mercosul-UE, então por que estão negociando conosco?''", disse. "Estamos fazendo isso porque é um passo importante e esse resultado diz que estamos prontos para terminar os outros três ou quatro acordos. Alguns deles virão muito em breve", garantiu.
O Comissário para Agricultura e Desenvolvimento Rural da União Europeia (UE), Phil Hogan, disse que o acordo comercial entre o bloco europeu e o Mercosul será "justo e equilibrado com oportunidades e benefícios de ambos os lados". "Os nossos produtos agrícolas, distintos e de alta qualidade, terão agora a proteção que merecem nos países do Mercosul, apoiando a nossa posição no mercado e aumentando as nossas oportunidades de exportação", afirmou Hogan, em comunicado divulgado pela Comissão Europeia após o fechamento do pacto entre os blocos.
O Comissário observou, contudo, que o acordo apresenta também desafios para os agricultores europeus. Segundo ele, a Comissão Europeia estará disponível para ajudar os agricultores a enfrentar esses "desafios". "Para que este acordo seja vantajoso para todos, apenas nos abriremos aos produtos agrícolas do Mercosul com cotas cuidadosamente administradas, para assegurar que não haja risco de que qualquer produto inunde o mercado da UE e, assim, ameace a subsistência dos agricultores da UE", disse Hogan.
Produtos da UE, como chocolates e para confeitaria, vinhos, espumantes e refrigerantes poderão ser vendidos para o Brasil sem tributação. Hoje, sobre chocolates europeus incidem 20% de impostos, sobre vinhos 27%, entre 20% a 35% sobre espumantes e refrigerantes. Segundo o comunicado da UE, o acordo estabelece também cotas para entrada de produtos lácteos do bloco europeu no Brasil com isenção de tarifas de importação. Hoje, sobre as importações de lácteos europeus incidem impostos de 28%.
O presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, chamou o desfecho bem-sucedido do acordo de "momento histórico" e afirmou que, "no meio de tensões comerciais internacionais" os dois blocos estão emitindo "um forte sinal" em favor do "comércio baseado em regras". "É o maior acordo comercial que a UE já concluiu", celebrou.