Ao contrário do que muita gente imagina, uva não gosta de frio. Gosta de calor. E quem afirma isso é um gaúcho de São Marcos, que descobriu no escaldante clima do Cerrado goiano uma oportunidade perfeita para cultivar vistosos parreirais. Quando Natal Perozzo e a esposa chegaram em Formosa (GO), lá pelos idos de 2005, encontraram uma situação pouco propensa ao cultivo das uvas niágara, conhecidas pelo sabor adocicado e pelos vinhos que produzem.
O solo da região necessitava de bastante adubação e seria necessário descobrir uma forma de fazer com que o sol quente do Centro-Oeste não destruísse as plantas. Além disso, era preciso driblar o regime de chuvas específico do Cerrado, que tem um período de seca contínua seguido da época chuvosa.
Uma das soluções encontrada por Perozzo foi utilizar plantas enxertadas no parreiral. As raízes são de variedades típicas da região, mais robustas e resistentes ao sol a pino. Sobre essas raízes, o produtor enxertou variedades mais produtivas, utilizadas no Sul do país. Com isso, a produtividade média passou de 1 kg de uva por videira (em 2008, ano da primeira colheita) para 8 kg em 2019.
As frutas, cuja destinação é o consumo in natura, são vendidas a R$ 10 o quilo para o consumidor da região de Formosa. No atacado, o valor cai para R$ 7, explica Natal. Além de ter sido o pioneiro no plantio comercial de uva no município, até hoje ele é o único a investir na cultura, que por sinal não exige, segundo ele, grandes investimentos do ponto de vista financeiro se comparado a outras culturas. “O que custa na uva é o transporte e a nota fiscal. Se é produzida aqui, não tem esse custo”, diz Perozzo, que cuida de todo o parreiral de 2 hectares juntamente com a esposa e um funcionário.
Poncã, laranja e goiaba
De acordo com José Laerte Correia Júnior, técnico em Agropecuária da Emater-GO, a fruticultura na região de Formosa tem muito potencial para se desenvolver ainda mais. “Temos produtos como uva, goiaba, poncã, laranja, entre outras frutas, além das hortaliças”, enumera. Na visão do presidente do Crea-GO, Fernando Almeida, a assistência técnica é fundamental para que haja esse desenvolvimento.
“O profissional da assistência técnica hoje não pode pensar só na produção, ele tem que ser eclético, tem que pensar também na comercialização, na mobilização. Não dá para ser apenas um profissional que dá assistência técnica e vai embora. Goiás tem um potencial enorme, mas tem que ter um programa governamental de cadeias produtivas, determinando quem vai plantar, quem vai comprar, para onde vai o produto, dando incentivo aos pequenos produtores e não só para as grandes empresas”, afirma Almeida.
Irrigação permanente
Nas redondezas da propriedade dos Perozzo, em Formosa, outra família de gaúchos decidiu apostar na produção de frutas no Cerrado. Eroni José Müller, oriundo de Victor Graeff (RS), conta que quando a família aportou na região, há 30 anos, já trabalhavam com hortifruti. Nesse tempo, deixaram de ser empregados e compraram uma propriedade de 22 ha, onde hoje cultivam mamão, goiaba e manga, além de batata doce, tomate, pimentão e jiló. A fazenda é tocada por Eroni, a esposa, Telma, e o filho, formado em Agronomia. O casal possui mais uma filha, que estuda no colégio agronômico da região.
“Aqui é diferente do Sul, onde a terra é mais fértil, mas a gente vai se adaptando. Por outro lado, no Sul temos geada, que mata as plantas. Aqui o problema é a falta de chuvas, o que exige irrigação permanente”, compara Eroni. Tanto que toda a lavoura possui encanamentos para levar a água de poços artesianos. Os canos carregam ainda o fertilizante para as raízes das plantas.
A batata-doce, que é o carro-chefe da propriedade dos Müller, produz o ano inteiro e rende 2,5 mil caixas de 25 kg cada por hectare. Já o tomate, por exemplo, é produzido apenas ao longo de cinco meses do ano, rendendo 300 caixas por ha. A goiaba, por sua vez, que está em fase inicial de produção, deve render 1 caixa por ha – com duas safras no ano. O segredo dessa matemática toda, segundo Eroni, é alternar as colheitas, mantendo a fazenda sempre produtiva e rendendo. Se alguma das lavouras ou pomares não der o esperado naquela safra, os outros compensam o prejuízo.
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