Tida com uma das diretrizes mais modernas em relação ao trato de animais de criação e cada vez mais aceita e valorizada pelos consumidores, especialmente os de fora do país, as boas práticas de bem-estar animal estão se consolidando na agricultura familiar brasileira. Para os produtores, o cuidado com a qualidade de vida dos animais significa abrir (ou garantir) mercados e obter um lucro maior no final do mês.
Na Comunidade de São Francisco do Caramuri, zona rural de Manaus (AM), onde vivem 180 famílias de produtores rurais, muitos avicultores já adotam práticas de bem-estar animal, e têm notado uma boa diferença com isso. “A primeira coisa que eu notei foi nas aves mesmo. Na gaiola elas ficam muito abatidas, estressadas, e tem diferença de tamanho dos animais também. A produtividade é quase igual, mas a galinha criada solta tem mais tempo de vida, ou seja, vai produzir por mais tempo”, compara Luciano da Silva Gomes, que junto com a esposa, Eriana de Queiroz Chagas Gomes, cria mil galinhas poedeiras – 600 delas em sistema semi-confinado.
Luciano está aos poucos transitando do sistema fechado (criação em gaiolas) para o sistema semi-confinado, onde as aves ficam em um galpão e podem ciscar livremente. O produtor explica que o ovo das poedeiras criadas soltas tem tido a preferência dos consumidores locais, pois é mais vermelho e tem maior durabilidade. “Ele tem muita aceitação em Rio Preto da Eva (cidade do entorno de Manaus) porque parece um ovo caipira”, diz.
E não faltam mimos para as galinhas do casal. Até música elas ouvem: de forró a sertanejo e do bolero à “sofrência” da música brega – um ícone da Região Norte do país. “Com algumas galinhas, quando a gente tirava a música, caia a produção de ovos”, diverte-se Luciano, que encosta a caminhonete ao lado do galinheiro e liga o som em alto e bom volume para satisfazer os ouvidos não muito exigentes das galinhas.
Além da música, o trato com as aves também requer cuidados com a alimentação, que além do milho inclui folhas de bananeira e água limpa que é trocada com frequência. Segundo Jeam Matos Melo, técnico agropecuário do Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do Estado do Amazonas (Idam), cada vez mais pessoas nas cidades estão buscando produtos ecologicamente corretos e que respeitem o bem-estar animal. “Existe uma normativa do Ministério da Agricultura em relação a isso. A gente já está recomendando aos produtores que migrem para o sistema de criação solto. O custo de produção vai diminuir em relação ao sistema confinado, além de ser mais prático e mais próximo à realidade do produtor.”
Polo avicultor
Atualmente, o Amazonas é o quinto maior polo de avicultura do Brasil, apesar de que o Código Florestal determina que o produtor deve preservar 80% da área no bioma Amazônico, o que parece não atrapalhar as atividades produtivas. “Aqui no Amazonas se produz muito. No entanto, ainda somos importadores de alimentos. Mas no caso da avicultura, temos um plantel de aves de postura com bastante tecnificação, abastecendo os dois milhões de manauaras que vivem na capital e há uma expansão no interior de estado”, afirma o secretário de Produção Rural do Amazonas, Petrucio Júnior.
De acordo com o secretário, a intenção do governo do estado é diversificar as matrizes econômicas do Amazonas, que não pode depender, segundo ele, apenas do polo industrial de Manaus. “É importante diversificar as matrizes econômicas, interiorizando o desenvolvimento. Porque há uma desigualdade muito grande entre a capital e o interior. Temos uma preservação de 97% das nossas florestas, mas um desafio muito grande de reduzir a pobreza. Lamentavelmente, 49,2% da população do Amazonas vive na linha da pobreza”, observa.
O Amazonas é um dos estados onde a agricultura familiar é mais presente. Mais de 90% das propriedades são de agricultura familiar. O plano safra, criado pelo atual governo estadual, quer incentivar, entre outras coisas, a mecanização das lavouras, a correção dos solos e fornecer mudas e sementes para incentivar a produção familiar amazonense.
No caso de Luciano e Eriana, a dificuldade deles tem sido em abastecer a demanda com seus produtos. Atualmente o plantel de aves do casal produz 820 ovos por dia, em média, e eles têm contratos com supermercados e outros comércios da região. Eles também aguardam uma habilitação por parte do governo do estado para poder vender os ovos para a merenda escolar, o que deve pressionar ainda mais a demanda. Um bom problema aos olhos dos extensionistas rurais.
“Se formos analisar a evolução deles, isso nos deixa muito felizes. Comparando com alguns anos atrás, hoje eles têm a granja deles, o carro, triciclo”, enumera Marcel Corrêa Ribeiro, engenheiro de pesca e extensionista do Idam. “Nós somos extensionistas, mas na verdade somos padre, parteiro, advogado, socorristas, tudo. Teve épocas que só apareciam aqui na área rural o Idam e os agentes da malária, então os produtores buscavam em nós alguém para conversar, desabafar. A gente acaba criando um vínculo muito grande. Aqui, por exemplo, nos sentimos da família”, conta Djaneide da Silva Lisboa, técnica agropecuária do Idam e que presta assistência técnica aos avicultores há quase 10 anos.
E os planos de Luciano e Eriana não param por aí. Na área de 20 hectares onde eles moram e onde ficam os dois galpões das galinhas o casal começou uma lavoura de hortaliças, aproveitando o esterco das galináceas como adubo. Outra ideia é criar gado de corte em uma área de pastagem também adubada com o insumo vindo do aviário. Com isso, a propriedade poderia diversificar as atividades, incrementando ainda mais a renda.
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