O associativismo já provou que pode ser uma das melhores ferramentas para estimular o crescimento econômico e distribuir renda aos produtores rurais. Apesar das dificuldades climáticas e da desconfiança que ainda existe em relação às formas de organização coletivas, o Nordeste está descobrindo o verdadeiro potencial das cooperativas agrícolas, capazes de organizar a produção e, principalmente, a comercialização das famílias que vivem do campo.
No Rio Grande do Norte, por exemplo, os fruticultores, olericultores e horticultores conseguiram melhorar os preços dos seus produtos e ampliar o mercado de atuação, com estimativa de vender seus produtos para além do polo regional. É o caso de Fabiana Sousa da Silva, que cultiva cajarana, acerola, banana, mamão, maracujá e goiaba, além de hortaliças, batata e macaxeira. Na propriedade de pouco mais de 8 hectares, ela reside com o marido, os pais e a irmã, em uma área de assentamento do Incra em Mossoró (noroeste do estado).
A família da produtora é uma das 42 que integram a Cooperativa de Agricultores e Agricultoras Familiares de Mossoró e Região (Coafam), fundada em 2012. “Em tudo o que a gente produz a cooperativa faz o intermédio da venda. Nos auxilia com nota fiscal, documentação e a gente faz a entrega nas escolas”, conta Fabiana. A produção é comercializada para os governos municipal e estadual para abastecer instituições de ensino.
Recentemente, a cooperativa recebeu investimentos do Banco Mundial através de um projeto estadual chamado Governo Cidadão, que contemplou áreas de agricultura irrigada. O dinheiro foi investido nas propriedades para a compra de painéis de energia solar, que alimentam bombas hidráulicas para a irrigação. Também serviu para a construção de uma indústria de beneficiamento de polpa, que vai permitir agregar mais valor às frutas e fazer com que cheguem a mercados mais distantes – a obra está em fase final.
“Hoje temos sistema de irrigação e temos água suficiente. A maior dificuldade ainda é o clima, que está muito quente. Tem culturas que a gente não consegue plantar nessa época do ano, como as hortaliças. Além de o calor aumentar o consumo de água, o que faz aumentar o custo de produção, por causa da energia”, relata Fabiana. Por outro lado, a banana e a goiaba gostam do calor, o que permite à agricultora estar sempre produzindo, o ano todo.
“Antes [da cooperativa] a gente plantava, mas não tinha perspectiva de vender. Plantava na sorte. Vendíamos uma caixa de mamão a R$ 2,50, o que não dava nem para pagar a energia para produzir. Vendendo pela cooperativa, essa caixa passou a R$ 22”, compara a produtora. Com isso, começou a sobrar dinheiro para investir nas propriedades e obter lucro.
De acordo com Kelem Cristiany Nunes Silva, engenheira agrônoma da Cooperativa Terra Livre, instituição que reúne agrônomos, técnicos agrícolas e assistentes sociais do Rio Grande do Norte, a indústria de polpas congeladas irá permitir à Coafam produzir até 700 kg de polpa por hora, o que elevará os negócios dos produtores a um novo patamar. “Isso dará a eles uma dimensão que não operam ainda. Vão precisar trabalhar gestão, comercialização e eficiência. Vão precisar buscar também o mercado convencional, que é a padaria, o supermercado, algo totalmente desconhecido para eles”, observa.
Resistência ainda é grande
Quem também descobriu os benefícios do cooperativismo foram os produtores de outro assentamento federal, só que em Macaíba, na região metropolitana de Natal. Ao todo, 27 dos 47 assentados formaram a Cooperativa de Assentados Produtores da Agricultura Familiar de Macaíba e Adjacências (Cooapafama), que iniciou as atividades no ano passado. “Estamos enfrentando o desafio de trabalhar o coletivo, porque muitas pessoas têm resistência. Como trabalharam muito tempo sozinhos, alguns produtores têm dificuldade de trabalhar em conjunto. Hoje, financeiramente, quem entendeu o projeto está muito bem”, afirma Rubem Gomes da Silva Junior, presidente da Coopafama.
Além de atender ao Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que obrigatoriamente compra uma cota de alimentos oriundos da agricultura familiar, a cooperativa tem planos de abrir uma loja própria para vender insumos mais baratos aos produtores. Outra ideia é produzir uma “cesta saudável”, contendo produtos agroecológicos e divulgar pela internet, aproveitando a logística de entrega nas escolas para atender outros clientes. “Temos também participação em feiras na Escola Agrícola, e alguns produtores têm bancas na feira em Macaíba”, completa Márcia Maria dos Santos Nascimento, vice-presidente da cooperativa.
Segundo eles, muitos produtores que antes precisavam rodar a cidade toda para conseguir vender R$ 2 mil em produtos hoje comercializam direto com a cooperativa e não precisam andar mais do que 1 km para entregar as frutas e legumes. Além disso, têm um lucro maior do que antes. A figura jurídica da cooperativa, observam, também dá mais força para negociar com o mercado e com os governos.
Entretanto, os cooperados esbarram no problema da falta de assistência técnica e extensão rural. Algo que pode estar começando a mudar com uma parceria firmada com a Escola Agrícola de Jundiaí, ligada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), para dar algum suporte nessa área. Para a assistente administrativa da Coopafama, Jandicleide Silva de Andrade Gomes, a união dos agricultores poderia fazer toda a diferença. “Se todos fossem unidos, a gente não precisaria de governo, porque iríamos contratar a nossa assistência técnica , formaríamos nossos filhos para isso, enfim, mudaríamos a nossa realidade.”
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