O turismo no Brasil representa mais de 8% do PIB, segundo dados do Conselho Mundial de Viagens e Turismo, e muitos segmentos vêm atraindo cada vez mais visitantes. Entre eles se destacam o turismo rural, o ecoturismo, as rotas gastronômicas e as de cunho histórico. Agora imagine ter todas essas opções reunidas em um roteiro só. É nisso que muitos produtores familiares de café do Espírito Santo estão apostando para incrementar e diversificar a renda.
Em Dores do Rio Preto (ES), cidade que fica aos pés do Pico da Bandeira (a terceira montanha mais alta do país), turistas de todo o país e de fora visitam a região para conhecer as belezas naturais do Parque Nacional do Caparaó, na divisa com Minas Gerais, e curtir o clima frio das serras capixabas. De quebra, podem experimentar alguns dos melhores cafés produzidos no Brasil. Tanto que os cafeicultores da região perceberam o potencial do negócio e estão investindo em pousadas, cafeterias gourmet e outras estruturas e serviços para agradar os turistas.
“O agroturismo é um derivativo para o produtor de café. E é uma saída para o estado do Espírito Santo, onde 80% das propriedades rurais estão abaixo de 50 hectares, o que faz com que a disputa interna seja muito grande. Então você precisa buscar alternativas”, afirma José Adilson de Oliveira, engenheiro agrônomo do Crea-ES e consultor técnico da Câmara Especializada de Agronomia do Sistema Confea/Crea (Ceagro-ES).
“Com isso, eles conseguem manter todos aqui na propriedade, além da nova geração que está vindo. Por isso estão se preparando, se capacitando, para agregar mais valor aqui dentro da porteira, sem necessidade de ter que ir trabalhar fora”, observa Norberto das Neves Frutuoso, extensionista do Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural do Espírito Santo (Incaper).
É o caso da família de Afonso e Altilina Abreu de Lacerda, que cultivam 27 hectares de café arábica no distrito de Pedra Menina, aos pés do Caparaó. Mesmo acumulando mais de 50 prêmios de qualidade por causa dos produtos que vendem, eles apostam que o turismo rural vai crescer ainda mais nos próximos anos. O casal inaugurou há 1 ano uma cafeteria na sede da fazenda para receber turistas, que podem experimentar ali mesmo os cafés especiais produzidos pelos Abreu de Lacerda. Esses cafés são beneficiados e embalados ali mesmo na propriedade, e vendidos diretamente aos visitantes. A fazenda ainda recebe grupos de estudantes e provadores de cafés nos fins de semana.
“Aqui a gente recebe diariamente pessoas que vêm para passear e grupos de estrangeiros, possíveis compradores de café, e tem os turistas que frequentam no fim de semana e enchem as pousadas da região”, conta Afonso. Ele diz que até 2012, o turismo na região era só por causa do parque. “Hoje 50% é por causa do parque e os outros 50% por causa do café”, afirma. Em um raio de 4 quilômetros da fazenda dele existem 5 cafeterias.
Mas o produtor reclama que o Estado deveria estimular mais o turismo na região, fazendo propaganda. Segundo ele, nem todos os produtores têm a visibilidade daqueles que foram premiados. Além disso, os produtos do Caparaó têm indicação geográfica reconhecida, o que acaba sendo um atrativo a mais na divulgação.
Altilina, que é quem comanda a cafeteria, conta que a filha mais velha do casal, de 18 anos, já está se preparando para essa nova etapa da rota dos cafés especiais. A jovem fez curso de barista e estuda idiomas. Tudo para receber melhor os turistas estrangeiros e explicar as nuances de cada café produzido ali.
Outro produtor que está investindo no segmento é Manoel Protázio de Abreu, tio de Afonso. Ele já hospeda alguns visitantes em uma pousada improvisada e está construindo sua própria cafeteria. “Hoje a comunidade aqui é de jovens. Os velhos são poucos. E os jovens têm mais vontade de que a coisa dê certo”, diz Manoel, cujos três filhos se preparam para dar continuidade na produção de cafés especiais associados ao turismo rural.
Entressafra
No período de entressafra, que vai de dezembro a maio, os cafeicultores do Caparaó aproveitam para pôr em ordem a fazenda, tirando o mato, adubando a terra e fazendo as obras necessárias na propriedade. Como o café é uma planta bianual, ou seja, tem uma safra cheia num ano e vazia no outro, os produtores precisam arranjar formas de obter renda nos períodos fora sem colheita e de produção fraca.
Em Afonso Cláudio, cidade do sul do ES, as cafeicultoras da Associação de Mulheres Empreendedoras da Agricultura Familiar de Vila Pontões (AMEP) acreditam que agregar valor aos seus cafés especiais e ampliar o leque de opções gastronômicas pode fazer com que os turistas fiquem mais tempo na cidade. “Mesmo sabendo que a região é predominantemente cafeeira, percebemos que tem potencial para outras coisas”, diz a cafeicultora Josane Bissoli, secretária e tesoureira da associação.
As produtoras de Afonso Cláudio querem investir no agroturismo e no turismo gastronômico do café e de itens agregados. Elas estão montando uma agroindústria de panificação para comercializar biscoitos, pães, doces e outros produtos – além do café. Individualmente, as produtoras também investem em empreendimentos de olho no turista. Josane, por exemplo, montou um restaurante em sociedade com uma amiga. Elas próprias colocaram a mão na massa e reformaram o espaço onde hoje funciona o estabelecimento.
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Êxodo rural
O turismo do café é visto como uma forma de reduzir o êxodo rural, mantendo o homem do campo no campo, pois proporciona uma renda diversificada, de valor agregado maior e constante. Para se ter uma ideia, o Censo Agropecuário do IBGE de 2017 apontou uma redução de 9,5% do número de propriedades rurais familiares nos últimos dez anos e uma perda de 2,2 milhões de trabalhadores. O turismo pode ajudar a mudar esses números.