Até recentemente, produzir etanol a partir do milho, dadas as vantagens competitivas da cana-de- açúcar, parecia apenas uma esquisitice americana, impensável na realidade do agronegócio brasileiro. Nada como uma safra atrás da outra para tudo mudar.
No atual ciclo, o Brasil deve colher pela primeira vez quase 100 milhões de toneladas do cereal em um movimento ascendente que, segundo a Embrapa, não tem volta. A Empresa de Pesquisa Agropecuária projeta que, em 10 anos, o volume de milho produzido no país deverá, inclusive, superar o de soja.
“Até pela necessidade de rotação de cultura entre milho e soja, que é um casamento perfeito, a tendência é de termos uma oferta muito grande de milho pelos próximos anos. Isso impulsiona toda uma indústria de aves e de suínos, além de viabilizar o uso do milho para gerar combustível”, diz Luiz Carlos Corrêa Carvalho, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag).
Carvalho observa ainda que o processo de produção do etanol de milho gera o DDG (grãos secos por destilação, em inglês), uma opção de qualidade para ração animal. “É toda uma nova agregação de valor quando o milho começa a ganhar escala no Brasil. Daqui para frente a produção de milho para etanol e de soja para biodiesel vai deixar as cadeias de grãos e combustíveis cada vez mais interligadas”, afirmou Carvalho durante o 16º Congresso Brasileiro do Agronegócio, que acontece em São Paulo.
A produção de etanol de milho no país ainda acontece de forma esporádica, em usinas do tipo flex. A realidade muda a partir do próximo dia 11, quando a FS Bioenergia inaugura em Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso, a primeira usina de etanol feito exclusivamente de milho. Uma vantagem estratégica do cereal é a possibilidade de estocagem, o que não acontece com a cana-de-açúcar, que exige processamento em um prazo de 24 horas.
Na análise do presidente da Associação Brasileira de Proteína Animal (ABPA), Francisco Turra, o uso do milho para fazer combustível é um caminho interessante para aproveitar os excedentes de produção, ajudando a evitar a pressão dos preços para baixo, “o que sempre é ruim para o produtor”.
Na 16ª edição, o Congresso Brasileiro do Agronegócio, um fórum que reúne as maiores lideranças empresariais do setor, teve como lema “Reformar para competir” e dedicou boa parte da programação a questões políticas que interferem na chamada competitividade “da porteira para fora”.
No painel sobre a reforma trabalhista, um dos palestrantes, Almir Pazzianotto, que tem experiência no Executivo (foi ministro do Trabalho) e no Judiciário (foi ministro do Tribunal Superior do Trabalho), disse que o importante foi meter “o pé na porta do tabu de que era impossível mexer na Consolidação das Leis do Trabalho”.
A reforma aprovada, segundo Pazzianotto, “foi a necessária e possível diante das circunstâncias”. “Mas nós ainda precisamos de uma revolução trabalhista que adapte as regras ao Século 21. Não podemos ter a pretensão de fazer o mundo se adaptar ao Brasil, mas o Brasil precisa se adaptar ao mundo. Precisamos de algo que nunca tivemos, que é uma política para o trabalho”, afirmou.
Novo Macron?
Uma parte significativa dos debates focou na capacidade do atual governo de reunir maioria no Parlamento para tocar novas reformas, seja a da Previdência, a política ou a tributária. O consenso foi de que há muito pouco tempo até que a própria discussão perca sentido, atropelada pelo processo eleitoral.
Para o jornalista Carlos Alberto Sardenberg, que fez a palestra inaugural do congresso, o Brasil vive um momento político em que “o velho foi destruído, mas ainda não se sabe o que será o novo”.
O diretor da Abag Christian Lohbauer diz que as condições favorecem o surgimento de uma variante tupiniquim de Emmanoel Macron, nome desvinculado da política tradicional que ganhou a eleição francesa com um discurso realista, deixando clara a necessidade de reformas.
“Vai governar o Brasil em 2019 alguém que ocupará um espaço político que não é nenhum dos extremos que estão postos hoje. Será alguém com uma visão mais empresarial do mundo, mais pragmática das coisas, a favor da produção. E vamos chegar a isso não pelo planejamento nem pelo brilhantismo, mas pelo colapso do modelo atual”, avalia Lohbauer.
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