A Operação Carne Fraca, da Polícia Federal (PF), tem sacudido o mercado de carnes desde a última sexta-feira (17) e, como consequência, já começa a preocupar o principal pilar do agronegócio brasileiro: o setor de grãos. Soja e milho – utilizados na fabricação de rações para animais de corte –, devem chegar a 197 milhões de toneladas na safra 2016/17. Se o ambiente já era de precaução com os preços, por conta da “avalanche” vinda das lavouras, agora ainda mais, já que uma das apostas para manter o equilíbrio entre oferta e demanda era a recuperação do consumo e produção de proteína no país.
Várias nações, entre eles China e membros da União Europeia, já se manifestaram, pontuando que, enquanto tudo não for esclarecido, não irão importar carnes de companhias envolvidas no escândalo, como JBS e BRF. No caso da carne bovina, esses países respondem por 34% das exportações nacionais.
“Ainda é muito recente, mas estimo que a produção de carne deva diminuir em até 20% nos próximos seis meses, enquanto durarem esses embargos”, avalia o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto Castro. “Com isso, a produção de farelo usado nas rações deve cair na mesma medida. Essa soja e milho então ficam disponíveis para exportação, pressionando um mercado que já estava abastecido pela safra norte-americana”, salienta, sem, no entanto, estabelecer um percentual para esta possível queda.
Para o economista Gilmar Mendes Lourenço, a soja ainda conta com uma demanda aquecida, impulsionada pela China. O alerta maior é para o milho. “Com esse cenário internacional, a redução na produção de carne é inevitável”, analisa. “E aí virá a retração na demanda por milho.”
Os especialistas não descartam que a falha na questão sanitária – avaliada como pontual dentro de um sistema bem maior e eficiente – sirva de pretexto para bloqueios de caráter comercial. “Esse risco é grande”, opina o secretário geral da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove), Fábio Trigueirinho. “A palavra agora é preocupação por causa da proporção que essa questão tomou. Se bloqueios comerciais forem feitos, o prejuízo [para o setor de grãos] pode ser grande, sem dúvida.”
Contraponto
O analista da agência Safras e Mercado, Paulo Molinari, porém, descarta qualquer interferência da “Carne Fraca” no mercado de soja e milho. Ele acredita que, mesmo que a BRF, por exemplo, deixe de exportar, outras companhias ocupariam o lugar dela. “A produção não vai cair”, enfatiza. “E caso venham bloqueios comerciais, o Brasil pode se defender na Organização Mundial do Comércio”, acrescenta Molinari.
Mais cauteloso, o analista Camilo Motter, da Granoeste, diz que é preciso corrigir erros, mas, sobretudo, não se precipitar. “A produção não é interrompida de uma hora para outra. Dentro de 20 a 30 dias, o mercado deve se normalizar, depois desse baque. E aí, saber se o consumo caiu é o primeiro passo para se avaliar o mercado”, completa.