As árvores da International Cacao Collection crescem em uma variedade impressionante de formas, sustentando vagens esguias com protuberâncias que lembram escorpiões, frutos redondos e verdes parecidos com tomatinhos, e compridos, com a pele irregular como a de um lagarto espinhoso, todos com cores que vão do roxo profundo ao amarelo brilhante.
Dentro de cada um desses frutos de cacau existem sementes que produzem algo amado por bilhões: chocolate.
Mas, apesar dessa diversidade, poucas variedades de cacau são amplamente cultivadas, e isso é um problema: como várias outras culturas, o cacau vive sob ameaça constante de doenças e desafios ambientais exacerbados por nossa tendência de plantar apenas alguns tipos com características e defeitos genéticos parecidos ou idênticos.
“A maioria das variedades produzidas em todo o mundo pertence a um conjunto limitado de clones selecionados nos anos 1940”, explica Wilbert Phillips-Mora, que supervisiona a coleção de 1.235 tipos de árvores de cacau e lidera o Programa de Melhoramento Genético do Cacau no CATIE (acrônimo em espanhol para Centro de Pesquisa de Agricultura Tropical e Ensino Superior).
Um conjunto menor de genes significa que as variedades de cacau cultivadas com mais frequência são suscetíveis às mesmas doenças, e essas pragas podem se espalhar rapidamente.
A produção de cacau levou alguma prosperidade à costa caribenha da Costa Rica até o final da década de 1970, quando os fazendeiros começaram a perceber que as vagens de suas árvores estavam desenvolvendo um revestimento de fungos brancos e acabavam ficando mumificadas.
O fungo – chamado Moniliophthora roreri ou monilíase – rapidamente se espalhou pelo país e, em 1983, as exportações de sementes de cacau seco haviam diminuído 96%. A indústria do país nunca mais se recuperou.
Até o cantor de calypso Walter Ferguson escreveu sobre o assunto. “Monilíase, você veio para ficar e tudo o que trouxe foi uma barriga com fome/Você diz que não vai embora até que me leve à pobreza.”
Canções populares sobre fungos podem ser raras, mas a devastação na principal indústria da região foi profunda. E apesar de o surto costarriquenho hoje ser parte da história, o fungo continua a se espalhar.
“Para mim, a indústria do cacau corre risco permanente porque, intencionalmente ou não, a doença pode se espalhar em apenas um voo”, explica Phillips-Mora. O aumento das viagens e do comércio no mundo em desenvolvimento criou novos caminhos para as infecções.
Ele acredita que o surto confirmado mais recentemente – na Jamaica em setembro – pode ter sido causado por traficantes de maconha, transportada secretamente entre a Costa Rica e a Jamaica, que, sem querer, levaram vagens de cacau como lanche para a viagem de volta para casa.
Esse surto foi o primeiro confirmado fora da América Latina e demonstrou a habilidade do fungo de sobreviver em viagens mais distantes do que antes se pensava possível. Outras regiões produtoras de cacau, como a África Ocidental – a fonte de virtualmente todo o cacau que acaba em produtos de massa como os Kisses da Hershey e os MeM-s – podem enfrentar problemas similares.
Mesmo sem a monilíase, o cacau é uma cultura problemática. Outras doenças – vassoura de bruxa, ceratocystis, podridão-parda (ou cacao swollen-shoot virus) – também afligem as árvores. As mudanças climáticas prometem piorar ainda mais os problemas com os patógenos das plantas tropicais.
Essas dificuldades tornam o cacau ainda menos atraente para os produtores; os lucros são baixos, e, na média, os produtores estão envelhecendo. A próxima geração parece propensa a abandonar o negócio familiar.
Ainda assim, a demanda por chocolate está crescendo, principalmente em mercados gigantes como a China e a Índia, que vêm adquirindo gosto pelo que costumava ser um deleite apenas para consumidores norte-americanos e europeus. Assim, uma era de escassez de chocolate pode estar se aproximando.
É aí que entra o projeto de Phillips-Mora. A diversidade genética do cacau, em exibição completa na International Cacao Collection da CATIE, pode evitar a crise do chocolate.
Solução
No começo dos anos 1980, Phillips-Mora trabalhou na identificação das árvores naturalmente mais tolerantes e produtivas de cacau, e então misturou cuidadosamente as candidatas para criar variedades novas.
Criar clones híbridos de cacau é um processo demorado, e especialistas do mundo todo já falharam nessa tarefa. Mas, em 2006, Phillips-Mora lançou seu primeiro lote de variedades híbridas de cacau.
Em termos de rendimento e resistência a doenças, as diferenças são surpreendentes. Os seis híbridos de Phillips-Mora produzem em média três vezes mais cacau do que as variedades padrão; sob condições ideais, os híbridos mais prolíficos podem produzir seis vezes mais frutos.
Depois de um teste de 11 anos, um híbrido chamado CATIE-R6 teve uma taxa de infecção de monilíase de cinco por cento, em comparação com os 75 por cento da variedade de controle.
“Nosso objetivo não é só produzir cacau. Também queremos dar condições de vida básicas aos fazendeiros. A maioria dos produtores de cacau é muito pobre porque o sistema está baseado em tipos que não têm uma boa capacidade de produção”, explica Phillips-Mora.
Árvores que produzem mais podem tornar o negócio da família mais atraente para as novas gerações de produtores de cacau. Os híbridos da CATIE estão crescendo em países da América Central, no México e no Brasil.
Maior rendimento agrícola e resistência a doenças tem o poder de beneficiar os fazendeiros, mas a colheita do cacau é inútil se o produto tiver gosto fraco ou desagradável. O chocolate é a quintessência do hedonismo gastronômico.
Mas, ao contrário de quase todos os outros esforços para aumentar o rendimento das culturas, o programa de Phillips-Mora tem o sabor requintado como pré-requisito. As variedades de cacau que não impressionam os testadores experientes são descartadas, mesmo que cresçam bem.
O resultado desse protocolo é que, diferentemente de várias outras culturas favorecidas pela agronomia – como a maçã Red Delicious e a babana Cavendish – o cacau da CATIE realmente tem sabor excelente.
Os produtores de chocolate estão começando agora a torrar e empacotar as variedades de Phillips-Mora. A Dandelion Chocolate, com sede em San Francisco, recentemente lançou uma barra feita com uma mistura de seis híbridos da CATIE.
“Eu acho honestamente que será uma das nossas barras mais populares. Tem um equilíbrio bacana entre as notas de chocolate de caramelo, mas ainda assim é muito acessível”, afirma Greg D-Alesandre, diretor de fornecimento de cacau da Dandelion.
As variedades híbridas de cacau de Phillips-Mora, porém, não oferecem uma solução perfeita para todos os desafios da cultura.
Elas não podem se autopolinizar e alguns dos grãos são pequenos, não foram devidamente testadas na África ou na Ásia, e ainda não são resistentes a todos os patógenos que afligem o cacau globalmente. Já foram feitos testes de campo, que estão praticamente concluídos, de um novo lote de clones criados para resolver algumas dessas questões.
Além disso, a atual lista de clones da CATIE foi criada em resposta a ameaças conhecidas da produção e cacau; o futuro trará novas demandas. Os patógenos evoluem. Situações políticas instáveis no mundo em desenvolvimento podem afetar a agricultura. As mudanças climáticas vão alterar as paisagens de maneiras imprevisíveis.
A solução não é substituir todo cacau com as seis variedades disponíveis da CATIE, mas poder continuar a diversificar os tipos de cacau que crescem no mundo. Como o Silo Global de Sementes de Svalbard, o International Cacao Collection é uma contingência contra desastres futuros de caráter desconhecido.
É possível que existam genes de cacau em algum lugar da coleção capazes de formar a base de novos híbridos que possam enfrentar os futuros desafios, como mutações nos fungos, secas ou no caso de as pessoas passarem a preferir um chocolate com outro sabor.
Ainda assim, Phillips-Mora se preocupa com o futuro.
Embora trabalhe com empresas ricas como a Mars, a Nestlé e a Hershey, os fundos que recebe são normalmente destinados a projetos específicos de pesquisa e não para a manutenção da coleção e do programa para o futuro.
Ele estima que receba menos de cinco por cento dos fundos necessários para a manutenção adequada da coleção a cada ano. Então, embora tenha se aposentado três anos atrás, Phillips-Mora planeja continuar trabalhando até que a viabilidade financeira da coleção esteja garantida.
“Ficarei muito feliz de saber, quando deixar esta instituição, que a coleção estará protegida financeiramente. É um tesouro para todo mundo, para todos os amantes do cacau.”
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