O presidente eleito Jair Bolsonaro está formando seu governo. É possível observar que nesse processo foram criados alguns núcleos, muitas vezes com visões diferentes. Há uns dias, Fernando Martins, editor da Gazeta do Povo, identificou alguns deles: “da família, dos militares, de Paulo Guedes, de Sergio Moro e dos políticos”.
Para o sucesso da nova administração, é imprescindível que haja coerência entre os diversos núcleos do governo em favor dos interesses do nosso País. Uma das áreas onde essa coerência é vital é a política externa.
A equipe econômica, comandada por Paulo Guedes, tem em seus quadros profissionais com excelente formação acadêmica, muitos deles egressos de renomadas universidades dos Estados Unidos. Esse grupo defende o liberalismo econômico, o livre mercado e o Estado mínimo, ideias que compartilho.
Essa nova equipe econômica é a favor da abertura da economia brasileira, com a redução de tarifas de importação tanto unilateralmente quanto no âmbito de acordos comerciais com outros países, introduzindo concorrência no mercado interno e combatendo o protecionismo mantido pelo Brasil por décadas.
O que preocupa, entretanto, é o fato de o novo chanceler, Embaixador Ernesto Araujo, tal como o próprio presidente eleito, se simpatizar com as ideias do presidente dos Estados Unidos Donald Trump.
As políticas de Trump que pregam nacionalismo, protecionismo econômico, anti-multilateralismo e anti-globalização vão na contramão do liberalismo, que é importantíssimo para a recuperação da economia do Brasil.
Além disso, alguns dos pronunciamentos do novo chanceler, publicados até agora, deixam a entender que ele, a exemplo de Trump, defende uma releitura das questões de soberania, identidade nacional, religião, cultura, valores morais etc., que são colocados como parte da redefinição da política externa com foco mais nacionalista.
Uma clara sinalização desse redesenho é a provável mudança da embaixada do Brasil em Israel, de Tel Aviv para Jerusalém, que, se acontecer, vai trazer importantes consequências econômicas para o Brasil, principalmente diante do risco de retaliação por parte de outros países do Oriente Médio, nossos grandes parceiros comerciais. Nessa mesma linha, caso volte à mesa, um possível questionamento da participação do Brasil no Acordo de Paris sobre o Clima teria impactos desastrosos para o nosso País: tanto econômicos quanto de imagem.
Precisamos levar em conta que essa ideia de copiar a política externa de Trump – da qual discordo radicalmente – seria um suicídio econômico e político para o Brasil.
A economia estadunidense é nove vezes maior que a brasileira (se considerarmos o PIB nominal) e as exportações de bens dos EUA são sete vezes maiores que as nossas. Nosso mercado interno não tem o mesmo poderio que o mercado de lá. Nós simplesmente não podemos nos dar ao luxo de brigar com o mundo como os Estados Unidos brigam.
Mesmo tendo um efeito reduzido para a economia estadunidense em geral, a guerra comercial iniciada pelo governo Trump está prejudicando de forma significativa alguns setores econômicos: as exportações de soja foram praticamente eliminadas; as vendas externas de carne suína, principalmente, para China e para México, caíram dramaticamente; e as indústrias que usam aço e alumínio já sentiram o impacto do aumento de tarifas de importação nos custos de produção. Em breve, os consumidores vão sentir no bolso o aumento de preços de bens de consumo importados da China.
Efeitos semelhantes, no Brasil, significariam a nossa ruína: nossas exportações de soja e carnes são muito mais significativas para a nossa economia do que nos EUA. Nosso país precisa desesperadamente de trazer maquinário, tecnologia, e equipamentos modernos e a preços competitivos. Insistir em tarifas elevadas, e insistir em nos isolar do mundo é condenar nossa indústria a continuar sucateada e nossos consumidores a continuarem sem acesso ao que o mundo tem de melhor a oferecer.
Por tudo isso, é muito importante que, no embate entre os vários núcleos da nova administração federal, a definição da política de inserção internacional do Brasil fique a cargo da equipe econômica, e não seja decidida com base em uma irracional admiração pelo presidente estadunidense. O professor da Columbia University, economista e cientista político Marcos Troyjo, que estará à frente da nova secretaria de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do novo ministério da Economia, precisará assumir a liderança desse processo.
Medidas para retomar o crescimento
Além de não sucumbir a um trágico retorno ao protecionismo, o Brasil precisa seguir com a agenda de liberalismo econômico iniciada no governo Temer. Os primeiros passos importantes foram dados: foram aprovados a reforma trabalhista, o teto de gastos públicos e as importantes mudanças no marco regulatório do setor energético, de mineração e de infraestrutura, ampliando a participação de investidores privados e trazendo mais segurança jurídica aos investimentos.
Foi colocada em pauta a urgência e a imprescindibilidade da reforma da previdência social, cujo texto-base foi aprovado pela comissão especial da Câmara dos Deputados em maio de 2017. É, sem dúvida, um dos assuntos mais polêmicos hoje no Brasil. Mas a ampla divulgação e sensibilização feitas pelo governo Temer fizeram com que a população conhecesse o tema. Muitos são contra, mas sabem do que se trata.
Foi criado um robusto programa de concessões e privatizações (Programa de Parcerias de Investimentos – PPI) trazendo um enorme ganho para a economia brasileira com a transferência, para o setor privado, daquilo que o Estado brasileiro não tem como cuidar com eficiência, não tem como continuar investindo.
Meu colega colunista da Gazeta do Povo Ricardo Amorim escreveu recentemente que o Brasil tem 418 empresas estatais (138 são estatais federais, conforme os últimos dados do Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão). Amorim levantou os seguintes números de outros países: “a Suíça tem quatro. A Austrália e Japão, oito. A Áustria tem dez. A Bélgica, 12. Estados Unidos e Reino Unido têm 16.”
Concordo com Amorim que o Brasil não precisa de tantas empresas estatais (até porque várias delas não têm sustentabilidade financeira). Com os recursos provenientes das privatizações e concessões, o Brasil poderá retomar investimentos para melhorar a infraestrutura, essenciais para aumentar a produtividade e a competitividade da economia.
O que o Brasil precisa é que as empresas voltem a investir, gerando emprego e renda. Para retomar a confiança é imprescindível garantir a continuidade. É preciso de assertividade na política fiscal, com uma contínua redução de gastos públicos e com uma ampla agenda de privatizações e concessões, diminuindo a participação do Estado na economia.
É vital prosseguir com as importantes reformas estruturais, com destaque para a previdência social, bem como aprofundar de forma significativa a abertura comercial do Brasil com a redução de barreiras tarifárias e não tarifárias.
Temos um altíssimo custo Brasil e a falta de confiança de empresários. Copiar as políticas de Trump não seria uma solução, seria um problema. Um dos mais relevantes protagonistas da famosa escola de economia de Chicago, Milton Friedman, costumava dizer que uma solução governamental para um problema, normalmente, é tão ruim quanto o próprio problema (“The government solution to a problem is usually as bad as the problem”).
E o Brasil precisa de solução. Essa solução é a abertura econômica e o livre mercado. A definição da política de inserção internacional do Brasil – e das demais medidas para retomarmos o crescimento – precisa partir da equipe econômica, livre de questões ideológicas, políticas ou de religião.
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