A principal finalidade é atestar a produção de bovinos de corte em sistemas com a introdução obrigatória de árvores| Foto: HUGO HARADA/HUGO HARADA

Em um futuro próximo a carne bovina produzida no Brasil, seja ela in natura, congelada ou transformada, com destino para o mercado interno ou exportação, poderá receber um selo de certificação que atestará a sustentabilidade da sua produção. Desenvolvida pela Embrapa Gado de Corte e registrada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), a marca “Carne Carbono Neutro” (CCN) será lançada oficialmente esta semana durante o II Simpósio Internacional sobre Gases de Efeito Estufa na Agropecuária (SIGEE). A certificação ainda depende de negociações com os setores público e privado para a implantação e posterior transformação em selo.

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A principal finalidade é atestar a produção de bovinos de corte em sistemas com a introdução obrigatória de árvores. Nessas condições, a presença de árvores em sistemas de integração do tipo silvipastoril (integração pecuária-floresta - IPF) ou agrossilvipastoril (integração lavoura-pecuária-floresta - ILPF) neutraliza o metano emitido pelos animais.

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Segundo o chefe-geral da Embrapa Gado de Corte, Cleber Soares, a demanda global pela produção sustentável de alimentos coloca o Brasil em posição de importância estratégica, com previsão de participação de 40% no abastecimento mundial de alimentos até 2050 quando, segundo estimativas da Organização das Nações Unidas (ONU), a população global chegará a 9,7 bilhões. “Nessa lógica, a cadeia produtiva de carne, especialmente a bovina, é fundamental. Mas ao mesmo tempo, apesar de precisarmos avançar na intensificação produtiva desta cadeia, isso deve ocorrer sobre bases sólidas e ao mesmo tempo sustentáveis em vários aspectos, principalmente o ambiental, além de econômico, social e até mesmo produtivo”, enfatiza.

O pesquisador da Embrapa, Roberto Giolo, também afirma que o conceito pode impulsionar a exportação, principalmente para o exigente mercado europeu. “A perspectiva é melhorar a visibilidade da carne brasileira e promover maior adoção dos sistemas ILPF e IPF no Brasil”, destaca Giolo. Por isso, ele acredita que o conceito CCN pode ser um facilitador para o Plano ABC (Agricultura de Baixa Emissão de Carbono) do governo federal.

A certificação ainda depende de negociações com os setores público e privado para a implantação e posterior transformação em selo 

Como funciona

Para garantir que a produção esteja de acordo com o conceito CCN, ela deve seguir as orientações do documento “Carne Carbono Neutro: um novo conceito para carne sustentável produzida nos trópicos”. O pesquisador da Embrapa, Valdemir Laura, explica que carbono neutralizado fica armazenado no tronco das árvores. “Isso pode ser medido por uma fórmula com a qual se calcula o volume de madeira e, consequentemente, a quantidade de carbono fixada no tronco. Você faz o inventário florestal [medidas de diâmetro e altura das árvores], calcula o volume de madeira e a quantidade de carbono estocado. É inquestionável”, afirma.

Segundo ele, o sistema ideal deve ter entre 200 e 400 árvores por hectare. O estudo realizado na Embrapa Gado de Corte mostra que cerca de 200 árvores por hectare seriam suficientes para neutralizar o metano emitido por onze bovinos adultos por hectare ao ano, sendo que a taxa de lotação usual no Brasil é de 1 a 1,2 animais por hectare.

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Bem-estar animal

A presença de árvores também influencia no bem-estar animal pois a sombra natural, além de bloquear a radiação solar, deixa a sensação térmica mais agradável. Em experimentos realizados na Embrapa foi verificada a diminuição entre 2º C e 8º C na temperatura dentro do sistema. “Assim, é oferecida uma condição de melhor conforto térmico, por se tratar de um ambiente com menor temperatura. Com o conforto térmico, o animal alcança maior eficiência, como o ganho de peso”, diz a pesquisadora da Embrapa, Fabiana Alves.

Segundo Soares, ao produzir a “Carne Carbono Neutro”, a cadeia produtiva também afasta perdas no processo. “Só há ganhos, pois além de produzir carne e seus derivados, intensifica-se de forma sustentável a produção, contribuindo para a qualidade de vida da população [pela mitigação de gases de efeito estufa] e, sobretudo com a oferta de carne de altíssima qualidade com respeito ao bem-estar animal, de forma rentável e saudável”, finaliza.

O selo

Desde 2015, uma propriedade rural em Mato Grosso do Sul vem sendo avaliada para a produção do primeiro lote experimental de animais com base no protocolo CCN. O abate dos animais experimentais ocorreu no dia 19 de maio deste ano e os resultados serão apresentados durante o evento.

A maneira como a marca CCN será adotada está em processo de desenvolvimento e envolve negociações com o setor público e privado. Em 2016, foi aprovado um projeto- piloto, financiado pela Fundação de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul (Fundect), para a avaliação de métricas da CCN no estado. Além disso, um projeto recém-aprovado na Embrapa, com previsão de início para agosto deste ano, prevê estudos para a validação do protocolo CCN em fazendas comerciais nos biomas Cerrado, Mata Atlântica e Floresta Amazônica; análise e prospecção de mercado; valoração do produto e desenvolvimento de políticas públicas.