Em uma fresca manhã de outubro, Han Youjun entrou em sua van de entregas prateada e deixou Liangduo, pequena cidade no leste da China. Em minutos, com a van cheia de caixas de todos os tamanhos e modelos, passava por arrozais, descia as ruas estreitas dos vilarejos e deixava para trás fazendas modestas, entrando cada vez mais profundamente no vasto interior da China.
No passado, entregadores como Han teriam poucas razões para viajar para tão longe. O boom da China nas últimas quatro décadas tornou suas metrópoles cheias e ricas. Mas a maior parte do resto do país, especialmente as comunidades agrárias como as que circundam Liangduo, na província oriental de Jiangsu, permaneceram relativamente pobres.
Cada vez mais, no entanto, os benefícios do milagre econômico da China estão chegando às cidades menores e aos vilarejos campestres . Han, de 32 anos, entregador da loja on-line JD.com, sabe muito bem disso. Os 70 pacotes que abarrotaram sua van naquele dia são mais do que o dobro do que ele normalmente carregava 18 meses atrás. “Os dias de trabalho estão ficando mais longos”, afirma.
A China precisa de pessoas que gastem dinheiro nesses lugares. O governo está tentando mudar o mecanismo de crescimento do país, que tradicionalmente depende das indústrias e da fabricação de bens. Essas velhas fontes de crescimento deixaram de ser confiáveis e exigem dívidas cada vez mais caras.
Graças à revolução digital na China, aos avanços na agricultura e a bilhões de dólares gastos nas milhares de novas estradas e ferrovias, os chineses que vivem longe das cidades grandes vêm respondendo. Várias das áreas mais remotas do país estão começando a se aproximar das metrópoles ricas e a se conectar com a economia mais ampla, algo que não acontecia antes, com potenciais benefícios de longo prazo para a economia chinesa e para o mundo.
Em Yancheng, as carteiras dos moradores locais estão ficando cheias mais rapidamente do que a taxa nacional, e o gasto das moradias - que cresceu oito por cento por pessoa em 2016 - superou o aumento de Pequim e Xangai.
Os sinais da nova prosperidade podem ser vistos na Auto City, uma confusão de prédios decrépitos em Yancheng, onde a Toyota, a Ford e praticamente todas as marcas importantes de veículos competem por clientes. Zhou Zhengguo, dono de uma loja da montadora chinesa Geely, espera vender 2 mil carros este ano, quatro vezes mais do que apenas dois anos atrás.
“A maioria das pessoas que comprava automóveis era formada por homens de negócios. Agora, são os trabalhadores também”, conta Zhou.
Aqueles que vivem nos lugares menos desenvolvidos da China podem ser cruciais para o novo estágio do desenvolvimento do país.
O economista Robin Xing, da Morgan Stanley, acredita que o gasto com consumo em lugares como o centro urbano de Yancheng vai continuar a crescer mais do que o das cidades grandes. Como resultado, dois terços de todo o crescimento adicional do consumo privado virá dessas áreas menos desenvolvidas até 2030.
“Esperamos que eles avancem e diminuam a diferença de renda com as cidades grandes”, afirma Xing.
Os negócios também estão olhando para essas regiões de outra maneira. Novas estradas e trens de alta velocidade facilitaram a realocação de fábricas e outras operações para cidades menores, permitindo que as empresas tirem vantagem dos custos mais baixos. A produção industrial em Yancheng cresceu mais rapidamente do que a taxa nacional no ano passado.
Empreendedorismo rural na China
E os ganhos não estão limitados às cidades principais do interior. As fazendas estão ficando maiores, mais eficientes e mais lucrativas.
Em Xinling, uma vila próxima, Luo Jianhai, de 37 anos, é um exemplo típico de um novo tipo de fazendeiro-empreendedor. Ele vem constantemente expandindo a fazenda onde cultiva arroz e trigo, alugando as terras de seus vizinhos. Também investiu em dois tratores novos, que empresta a outros fazendeiros que precisam deles para trabalhar em grandes propriedades de terra. Nos últimos três anos, sua renda anual aumentou sete vezes, para US$ 100 mil, e seu gasto quadruplicou, principalmente em roupas de qualidade para seus três filhos e um novo carro de US$17 mil de uma joint venture da General Motors.
A melhora em seu estilo de vida, segundo Luo, “é a diferença entre ser pobre e ter dinheiro”.
Ali perto, Cheng Zhiguo, de 47 anos, também ampliou sua fazenda este ano, aumentando sua renda líquida para cerca de US$ 23 mil – cinco vezes mais do que apenas três anos atrás. Seu prêmio: o primeiro carro, um Hyundai comprado em agosto.
Essa mudança está atraindo empreendedores urbanos como Zhou Jian, de 33 anos. Morador de Nanjing, uma cidade importante no leste da China, Zhou descobriu que agricultura de larga escala também precisa de mais dinheiro. Em 2013, fundou a Nongfenqi E-Commerce Co., que ajuda a encontrar empréstimos em bancos e outros credores para famílias de agricultores.
Desde então, a Nongfenqi já conseguiu cerca de US$150 milhões em empréstimos, abriu mais de 100 escritórios em áreas rurais da China e contratou 800 funcionários. “A melhora do mercado permite que negócios como o nosso sirvam a esses grandes fazendeiros”, explica Zhou.
Essa oportunidade atraiu a JD.com. Nos últimos três anos, a JD.com mais do que dobrou sua equipe de entregadores, vários com o objetivo de chegar às cidades e vilas rurais.
“Construir uma rede de logística rural é uma de nossas estratégias mais importantes. Com o desenvolvimento do consumo nas áreas rurais, esperamos aproveitar essa oportunidade para expandir nossos negócios”, explica Wang Hui, chefe do serviço de entregas da JD.com.
Porém, nem todas as áreas rurais estão avançando tão rapidamente como Liangduo. Hu Binchuan, pesquisador do Instituto de Desenvolvimento Rural da Academia Chinesa de Ciências Sociais de Pequim, teme que as empresas descubram, pelo menos por enquanto, que os lucros vindos de clientes do interior talvez não acompanhem seus esforços para chegar até eles.
“A maior parte das regiões agrícolas ainda não deslanchou. As plataformas de comércio eletrônico não poderão imitar, nas áreas rurais, o sucesso que tiveram nas cidades”, diz ele.
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