Criar frango à moda antiga, com um quintal para a ave ciscar e expressar seu comportamento natural (o famoso voo da galinha), sem o uso de antibióticos e oferecendo apenas grãos orgânicos como alimento, custa caro.
Mas tem muita gente disposta a pagar por isso. Basta ver que a principal empresa de frango orgânico do país, a Korin, do interior de São Paulo, cresceu 540% nos últimos dez anos. Saiu de um faturamento de R$ 20 milhões em 2007 para R$ 138 milhões no ano passado.
Para o consumidor, alguns cortes do frango orgânico chegam a preço de picanha. Em Curitiba, por exemplo, uma loja no Mercado Municipal cobra R$ 48,00 o quilo do peito. Se for coxa ou o meio da asa, o preço cai um pouco: R$ 21,50/kg. Quem quiser levar o frango inteiro pagará R$ 30,50/kg, cerca de seis vezes mais do que o frango comum.
Há uma série de fatores que encarecem o frango orgânico, desde o manejo diferenciado até as certificações e análises exigidas pela legislação; mas o grande vilão, segundo a indústria, é o custo dos grãos orgânicos. “O milho e a soja orgânica têm preço 200% mais caro do que o convencional. E como 70% do custo do frango vêm da ração, temos que reajustar o preço de acordo com a oferta de milho. A gente acaba concorrendo com o mercado externo, que disputa essa matéria-prima. Se aumenta o preço lá fora, pagamos mais caro para o grão ficar em casa”, afirma Reginaldo Morikawa, diretor superintendente da Korin Agropecuária, maior empresa de carne orgânica do país, com sede no município de Ipeúna, em São Paulo.
Frango sustentável
Essa dificuldade para conseguir milho e soja orgânicos obrigou a Korin a inventar a categoria “frango sustentável”, carro-chefe da empresa, que responde por mais de 70% do faturamento. Basicamente, a diferença está na alimentação. O galináceo sustentável pode se alimentar de grãos transgênicos, o que é proibido na categoria orgânica. Também conhecido como frango AF (antibiotic free), a linha sustentável é igualmente livre de antibióticos, de promotores de crescimento e quimioterápicos, não recebe ração com ingredientes de origem animal e as aves vivem em galpões com menor população por metro quadrado.
E o frango caipira? Para ter esse rótulo, a indústria precisa utilizar somente linhagens ou raças de crescimento lento, exclusivas para corte, que são abatidas com no mínimo 71 dias de idade (um frango convencional pode ser abatido a partir dos 28 dias, se for galeto). De resto, a criação se assemelha à do frango sustentável.
No varejo, há quem reclame da monopolização do mercado pela Korin. Luiz Ary Gosh, dono da Taurinos Organic, em Curitiba, diz que simplesmente não tem opção de fornecedores. “Existe a Agreco, uma cooperativa de Santa Catarina. Mas eles não podem sair de lá, porque só têm inspeção estadual. Na realidade, a Korin domina o mercado no Brasil inteiro. Eles possuem logística, representantes e toda infraestrutura para o frango orgânico, que é bem complicado produzir”, afirma Gosh.
O comerciante diz que a cada seis meses, em média, a Korin reajusta o preço do frango orgânico. “É algo fora da realidade, totalmente acima da inflação”, queixa-se. No frango, Gosh revende a Korin, mas, na carne bovina orgânica, é concorrente direto da gigante paulista, com a marca Taurinos Organic.
Reginaldo Morikawa, da Korin, nega reajustes injustificados: “Na verdade, a gente vem baixando o preço. Baixamos em torno de 25% de 2016 para 2017. Em São Paulo, é possível encontrar o quilo do peito de frango orgânico a R$ 26,00”. O executivo diz que, ao sair para o Paraná, o frango orgânico já é taxado em 7% de ICMS, além dos custos com resfriamento e transporte. E o peito seria mais caro por que ele precisa “levar uma parte do preço que você não consegue rentabilizar com os cortes que foram feitos para tirar esse filé”.
Fair Trade
“Somos participantes do Fair Trade. Nunca mudamos nossa margem de lucro, que é de 6,3%”, assegura Morikawa. Ele devolve a responsabilidade pelos preços ao varejo: “O ponto de venda acaba colocando margem de um produto diferenciado, e não a margem do filé de peito convencional. Como é um produto que vende pouco, não posso culpá-los. Se demora para a mercadoria girar, existe um custo adicional para mantê-la resfriada. Em locais que vendem menos, os preços são maiores”.
Morikawa acredita, no entanto, que o preço da carne orgânica – de frango ou bovina – poderia ser bem mais em conta se a legislação brasileira ajudasse. Para atender as normas, a indústria tem de pagar pela certificação e manter um processo documental que exige mais pessoas, como veterinários e técnicos de campo. “Somos obrigados a fazer análise para comprovar a não-presença de antibióticos por lote, e essas análises são caríssimas. Mas o sistema convencional, que usa antibióticos, não precisa fazer análise. A lógica está invertida. No Japão, esses testes são exigidos daqueles que utilizam os quimioterápicos. Quem produz orgânicos é auditado mediante denúncia. Se ficar comprovada a fraude, o empresário vai preso”, resume.
O mercado formal e certificado de carne orgânica no Brasil é praticamente dominado pela Korin, que tem 98% do share. Com 30 mil abates por mês, o frango concentra maior parte do faturamento da empresa, que trabalha com 34 produtores integrados na região de Ipeúna. O orgânico cresceu 16% no ano passado e o sustentável 5%. Já o boi orgânico da Korin tem apenas 250 abates mensais, mas registrou crescimento de 40% de 2016 para 2017.
Nos Estados Unidos, há uma explosão da demanda por frango orgânico. No ano passado, as vendas aumentaram 78% em relação a 2016, atingindo US$ 750 milhões, segundo o Departamento de Agricultura. No ranking das commodities orgânicas nos EUA, o frango está em terceiro lugar, atrás apenas de leite e ovos.