Quem veio antes, o ovo ou a galinha? Em Mandirituba, na Região Metropolitana de Curitiba, primeiro vieram as aves, depois os morangos. Desde a falência do frigorífico Diplomata, em 2012, avicultores precisaram buscar uma nova fonte de renda. A solução foi reaproveitar as granjas para investir em morangos.
Cultivo de morangos melhora renda e qualidade de vida
Ademir Moleta foi o primeiro a “lançar a moda”. Ele chegou a viver de bicos em propriedades vizinhas. “A falência foi um balde de água fria, fomos iludidos”, diz. “Nunca me interessei por morangos, mas passei a pesquisar pela internet, visitei uma propriedade e comecei a produzir“, revela. Dependendo da época, ele chega a colher 500 kg por dia nas granjas que deram lugar às estufas. Tomando como base o preço médio pago ao produtor em 2017 (R$ 8,50 /kg), são R$ 4 mil por dia.
O diferencial do cultivo é simples: são morangos semi-hidropônicos. Isso significa a ausência quase total de defensivos agrícolas, o que dá mais sabor ao alimento, garantem os produtores. “O morango tem fama de alta carga de agroquímicos, mas neste sistema é um alimento seguro”, afirma Silvio Galvan, técnico da Emater - Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural.
Desde 2010, a Emater busca incentivar esse trabalho em municípios da região de Curitiba, como Araucária, Campo Largo, Lapa e São José. “Em Mandirituba já temos 51 famílias. A produção é de 300 mil mudas ou 300 mil quilos anuais”, informa Galvan.
A granja virou estufa
Nesta quarta-feira (17), representantes do instituto e da Universidade Federal do Paraná (UFPR) estiveram na propriedade de Ademir Moleta promovendo um treinamento sobre o cultivo de morango semi-hidropônicos para 230 pessoas.
Para adaptar antigos aviários, uma alternativa é trocar as coberturas por filme plástico transparente, para a fruta ter acesso ao sol. Em ambiente protegido, as plantas são cultivadas em um suporte com sacos plásticos contendo um substrato que auxilia na fertirrigação - técnica para irrigar a terra com fertilizante diluído, dificultando contaminações e facilitando o manejo. Caso uma muda fique doente, basta descartá-la.
“É uma alternativa de produção sem agroquímicos, com sais biológicos que protegem e evitam o desenvolvimento de doenças”, afirma Rodrigo Weiss, engenheiro agrônomo, mestre em Ciência do Solo.
O substrato pode ser desenvolvido pelo próprio agricultor ou comprado pronto. O custo de cada saco industrial (que já inclui o substrato) é de R$ 2,10, revela Moleta. O agricultor estima custo de R$ 4 na produção própria. Neste caso, pode-se utilizar como matéria prima cascas de arroz carbonizado, ou de pinus para reter a água.
Tecnologia amplia produtividade
Engenheiro agrônomo, Marcos Zak explica que, após a colheita, é recomendada uma aplicação biológica fungicida e bactericida, segundo ele. “Isso amplia o tempo de prateleira até chegar ao consumidor e permite o consumo em menos de 24 [após a aplicação]”, explica. Em um teste, ele comprovou que em três dias o morango sem o defensivo já estava apodrecendo. Com a alternativa, continuava maduro.
O resultado das inovações está no número de morangos cultivados no estado. A produção paranaense era realizada em 587 alqueires em 2006. Doze anos depois, passou os 723 alqueires - 25% a mais. Em toneladas, foram produzidas 22,6 mil: 49% a mais que em 2006. Somente a região de Curitiba responde por 32% da produção total do estado.
Nas próximas semanas, a equipe da Emater também estará em São José dos Pinhais e Araucária para ministrar novos treinamentos.
Cultivo de morangos melhora renda e qualidade de vida
A Emater calcula que o custo de implementação de um metro quadrado da estrutura necessária para plantar morango semi-hidropônico seja de R$ 74. Cada m² gera, em média, 11,4 kg de morango por ano - receita média de R$ 114. “Somente após três anos precisamos comprar novos sacos plásticos com substrato”, explica o primeiro produtor do gênero em Mandirituba, Ademir Moleta. Ele estima custo da troca abaixo de R$ 20 por m².
Perto dali, Valentin Undovski cultivava verduras há cerca de um ano, até resolver mudar a estratégia. “Tenho dois galpões e consigo produzir 120 kg de morangos por semana”, afirma. Ele afirma que a renda familiar aumentou 30% com a nova cultura.
Outro ponto destacado pelos agricultores é a ergonomia. “Tenho um colega que cultivava morangos na terra e reclamava de ter que agachar para colher”, diz Moleta. Como a plantação semi-hidropônica é suspensa, a colheita é feita de pé: uma vantagem para a eficiência e a redução de riscos de problemas de coluna.
O “pioneiro” dos morangos também conta que trabalhava entre 12 e 14 horas diárias quando tinha aviários na propriedade, entre 2009 e 2012. Com os morangos, a jornada caiu para oito horas. “Eu trabalhava em função do frigorífico. Agora tenho um cronograma certo: pela manhã faço colheita, a tarde embalo e a noitinha faço a entrega”, conta. Com objetivo de criar um novo pavilhão por ano, ele já distribui para uma grande rede de supermercados da capital.
Os resultados incentivam o novato Willian José Batista. Dono de uma serraria que fornece materiais para a construção das estufas, ele busca complementar a renda com os morangos. “E também porque minha mãe e namorada perderam o emprego. Tivemos que fechar uma padaria por conta da crise. Agora eu e meu pai nos dedicamos à serraria e elas vão ficar com os morangos, e eu vou dar o suporte”, diz ele, que participou do treinamento do Emater.
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