Brasília - Os produtores "precisam ter peito e enfrentar o desafio" de vencer o risco de apagão logístico no escoamento da atual safra de soja, a maior da história do país, disse ontem o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Wagner Rossi. Em entrevista à Expedição Safra Gazeta do Povo, em Brasília, ele argumentou que o setor público precisa reagir, mas que o setor privado também deixou de investir em transporte e estrutura de armazenagem.
A declaração foi rebatida pelo presidente da Organização das Cooperativas do Brasil, Márcio Freitas. Em sua avaliação, com a colheita já em andamento, o governo sabe que "não tem o que fazer e está transferindo responsabilidade".
O risco de apagão logístico foi apontado na última semana por lideranças do agronegócio, entre elas o ex-ministro da Agricultura e deputado federal Reinhold Stephanes (PMDB). Administradores de rodovias e a própria Polícia Rodoviária Federal se preparam para enfrentar sobrecarga nas estradas.
A área da soja foi ampliada e a produção tende a passar da casa de 68 milhões para mais de 70 milhões de toneladas. No caso do milho, a safra de verão tende a render perto de 32 milhões de toneladas. A expectativa da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) é de que a safra de grãos 2010/11 ultrapasse, pela primeira vez, a faixa de 150 milhões de toneladas.
O ritmo dos trabalhos no campo e o mercado contribuem para concentrar o escoamento da safra em poucas semanas. Aproveitando as primeiras chuvas, os produtores plantaram praticamente todas as lavouras a partir de novembro. Por isso, a colheita deve ocorrer num período mais curto que o normal, com mais força em março.
Com o mercado pagando bem, os produtores anteciparam a venda de aproximadamente 40% da produção. E devem continuar vendendo durante a colheita. Para não gastar com armazenagem, a tendência é que o setor tente entregar a produção o quanto antes. Se essa estratégia for adotada, os armazéns podem ser suficientes, mas as rodovias e portos serão mais testados do que nunca.
"Choradeira"
Para o ministro da Agricultura, a "choradeira" dos produtores é "exagerada". Em sua avaliação, o problema não é tão grave. "Temos capacidade de armazenagem estática compatível com a safra", avaliou. "A dificuldade se dá pela inexistência, praticamente, da intermodalidade." Se houvesse mais integração entre rodovias, ferrovias e hidrovias, a situação seria confortável, apontou Rossi, para quem as reclamações são resquícios de uma visão "antiga" sobre a realidade do agronegócio.
O ministro disse reconhecer que o governo tem responsabilidade sobre os "gargalos" falta de estrutura para armazenagem, transporte e embarque que atrapalham o escoamento da safra de soja e milho, forçando aumento de 5% no preço do frete, conforme estimativa do próprio setor de transporte. Ressaltou que existem obras em andamento em ferrovias, hidrovias e rodovias. "A responsabilidade do governo é colocar [à disposição dos produtores e cooperativas] recursos a juros contidos", acrescentou. Por outro lado, disse que a reação do setor tem sido tímida. "Armazenagem é atividade privada", ressaltou.
Segundo o presidente da OCB, os recursos são insuficientes e não chegam ao produtor pelo excesso de burocracia. "O dinheiro existe mas ninguém consegue pegar." Ele argumentou ainda que os juros de 6,75% ao ano, na verdade, custam ao produtor entre 10% e 12% por causa de restrições dos programas de financiamento e de serviços que os bancos associam ao crédito.
Conforme estimativa da OCB, o governo ofereceu cerca de R$ 3 bilhões para investimento em infraestrutura na última safra. Parte desses recursos não foi tomada. Mesmo assim, a avaliação é de que seriam necessários R$ 10 bilhões ao ano. "A cada ano temos mais problemas. Isso não foi encarado de frente pelo governo. É responsabilidade do Estado, sim", disse Freitas.
Governadores e oposição articulam derrubada do decreto de Lula sobre uso da força policial
Tensão aumenta com pressão da esquerda, mas Exército diz que não vai acabar com kids pretos
O começo da luta contra a resolução do Conanda
Governo não vai recorrer contra decisão de Dino que barrou R$ 4,2 bilhões em emendas