A Assembleia Legislativa do Paraná foi palco, nesta terça-feira (27), de uma audiência pública sobre a aplicação de defensivos agrícolas, especialmente em áreas próximas a aglomerados urbanos, incluindo o uso de aviões pulverizadores. Entretanto, o debate - promovido pela Comissão de Ecologia, Meio Ambiente e Proteção aos Animais - acabou se estendendo sobre o uso dos defensivos em todo o campo.
O deputado Rasca Rodrigues (PV), presidente da comissão, defendeu a implementação de políticas alternativas: “O que nós estamos vendo é que as dosagens aumentaram quase 50 vezes em cada produto desde sua origem. Isso não é bom para nosso alimento e podemos perder mercado no futuro”.
Representantes do agronegócio, por outro lado, questionaram vários dos dados apresentados na audiência. Professor doutor da Esalq/USP e técnico da Federação da Agricultura do Paraná (Faep), José Otávio Menten reforçou que o uso de agroquímicos no Brasil é perfeitamente seguro: “O problema são os ilegais. Estima-se que 30% são falsificados ou contrabandeados. Se tem um problema, é o mal uso”.
Consumo de soja
Promotora de Justiça da região de Campo Mourão, Rosana Araújo de Sá Ribeiro afirmou serem necessárias leis que evitem o contato de áreas periurbanas com os agroquímicos. “Essa questão foi colocada por 150 pessoas do município de Luiziania, que nos encaminharam um abaixo assinado”, afirma.
Segundo a promotora, foram identificados sintomas em crianças que tiveram contato com defensivos agrícolas nessas áreas. Ela não se diz contra a produção de alimentos, mas criticou a extensão da soja convencional: “Primeiro que ninguém come soja”. E defendeu que os defensivos não aumentam a produtividade. “O que aumenta é a semente, o solo e o clima”.
Cascavel tem lei contra defensivos agrícolas
Durante o debate, o vereador Paulo Porto de Cascavel explicou um pouco sobre a Lei Municipal (6.484/2015) que estabelece 300 metros de distância das áreas de pulverização de locais como postos de saúde, núcleos populacionais e centros educacionais. Outra alternativa para o agricultor é formar uma barreira verde, o que reduz a necessidade de distância para 50 metros de divisa com esse tipo de estabelecimentos urbanos, conforme a lei municipal.
Na sequência das falas, Dionísio Agazzeiro, pesquisador da Embrapa Soja, tomou a palavra e criticou o debate que, segundo ele estaria pendendo para o radicalismo, inclusive com a inclusão em frente da mesa plenária de uma camisa com os dizeres ‘Agrotóxico Mata’:
“Não trabalhamos para multinacionais e sim para agricultores. Alguém de vocês sabe o que é manejo integrado?”, exemplificou. À Gazeta do Povo, ele disse: “Queremos participar sim desse diálogo. Nós trabalhamos para gerar informação. O que não podemos é envenenar as ideias das pessoas”. Rasca rebateu: “Aprendi na UFPR que agrotóxico mata. E não podemos chamar de produto fitossanitário. Que me desculpe a Esalq, mas temos que ter limites”, disse o deputado, que também é formado em agronomia pela Universidade Federal do Paraná.
O produtor de hortaliças Luis Alves Fontes, de São José dos Pinhais, também pediu a palavra e acusou o debate de atentar contra os produtores e o deputado de colaborar com a cartilha com os mesmos dizeres da camiseta. “Eu desafio a me mostrarem um consumidor que foi ao hospital por consumir [uma hortaliça envenenada]”, disse à reportagem.
Promotoras ‘detonam’ receituários
Tanto Rosana Ribeiro quanto a promotora de Justiça de Ibiporã, Revia Peixoto de Paula Luna, criticaram o número de receituários de uso de agroquímicos que vêm sendo emitidos por técnicos no estado.
Revia de Paula afirma que recebeu a denúncia de que um profissional estaria emitindo 73 receitas por dia. A promotora destaca que formou no município a Rede de Articulação, em 2015, com o plano aumentar o diálogo e fornecer assistência técnica e educacional aos agricultores. “Há duas semanas recebi oito autuações envolvendo vendas sem receita e armazenagem irregular. Algo que nunca tinha recebido”, disse.
Ela se disse surpresa por receber a informação de que a região de Ibiporã é um centro de armazenamento desses produtos. José Otávio Menten, porém, defendeu que os agricultores fazem a devolução adequada de 94% das embalagens utilizadas em aplicações.
Campanha contra agroquímicos
Entre os dados apresentados pela campanha “Agrotóxico Mata”, durante o debate, está o argumento de que o Paraná é um dos maiores consumidores desses produtos, e que cada habitante do estado consome 8,7 litros de “veneno” por ano, contra 7,3 L da média nacional.
Representante do Sistema Ocepar (Organização das Cooperativas), o doutor Guilherme Luiz Guimarães lembrou que, proporcionalmente, o Japão é líder mundial de uso de agroquímicos no mundo e que o Brasil utiliza apenas 8% do seu espaço para produção de alimentos. “E podemos dobrar a produção sem derrubar nenhuma árvore”, destacou, referindo-se à capacidade de expandir a produtividade das lavouras. Ele disse ter saído desapontado do encontro. “Vi aqui princípios e conhecimentos erroneamente deturpados”.
Ao final, o deputado Professor José Lemos (PT), como ‘medida prática’ do debate, convidou os presentes para a formação de um grupo de trabalho, com o objetivo de continuar a discussão para incentivar possíveis projetos. Ele destacou que 15 municípios do estado, incluindo Cascavel, possuem leis neste sentido.
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