Com produção de 4 bilhões de litros de leite ao ano – metade direcionada para outros estados – o Paraná reforça a fiscalização sanitária sobre a cadeia leiteira após as denúncias de adição de ureia no alimento no Rio Grande do Sul. A Agência de Defesa Agropecuária do Paraná (Adapar) anuncia redução no intervalo das auditorias sobre amostras coletadas nas indústrias. O setor privado amplia rigor com testes por propriedade, caminhão e lote.
O setor de laticínios do Paraná aposta em um modelo sem intermediários entre produtor e indústria para tentar reduzir o risco de fraudes. Os testes rotineiros dos setores público e privado, no entanto, não detectam formol – produto da ureia em grão – e exigem controle extra.
Nas cooperativas, que concentram cerca de metade da produção estadual, a estrutura da cadeia leiteira permite controle da ordenha ao processamento, relatam os técnicos do setor. Para incentivar a qualidade do leite, as empresas pagam bônus aos produtores que vão além das exigências sanitárias mínimas.
Na operação de compra realizada conjuntamente pelas cooperativas Batavo e Castrolanda (Campos Gerais), por exemplo, não há atravessadores, informam as empresas. Para terem a produção aceita, os produtores precisam atender exigências das indústrias das cooperativas.
Henrique Junqueira, responsável pela área de leite na Castrolanda, diz que o modelo favorece o controle, que se dá a partir da assistência técnica. A média atual é de 1 técnico para cada grupo de 35 produtores, pontua. Após a ordenha, o leite é recolhido pela cooperativa em, no máximo, 48 horas e passa por testes individuais. “Recolhemos amostras de cada produtor para fazer análises. Se há algum problema é possível identificar a origem com facilidade”, afirma.
O controle é facilitado pela proximidade entre cooperados e indústrias. Nos Campos Gerais, a distância é de 40 quilômetros em média. No Oeste, a cooperativa Lar, de Medianeira, informa abranger um raio semelhante. Arceste Leite Filho, coordenador de Fomento de Leite da Lar, diz que a proximidade preserva as propriedades do leite.
“Os caminhões isotérmicos apenas mantém a temperatura. Se a distância for muito longa o produto perde qualidade”, explica. Os fornecedores mais distantes estariam a 80 quilômetros da empresa.
Os sistema de assistência técnica, fiscalização e remuneração por qualidade fideliza produtores como Rafael Hoogerheide, associado da Batavo há 15 anos que dedica 80 hectares à pecuária. Ele conta que já recebeu propostas de outras empresas para entregar o leite, mas acha prefere permanecer com a cooperativa. As exigências, relata, não se tornam um problema. “Acaba se tornando uma rotina.”
O pagamento por qualidade se estende ao Oeste e Sudoeste, que expandiram a produção na última década. Conforme o superintendente da Associação Paranaense de Criadores de Bovinos da Raça Holandesa, Altair Valloto, “o produtor chega a receber 30% mais por litro”. As análises custam em média R$ 5,60 por tanque individual.
R$ 490 mil devem ser investidos pelo governo do estado para duplicar a capacidade de análise do laboratório da Associação Paranaense dos Criadores de Bovinos da Raça Holandesa, que é de 190 mil testes ao mês.
Fraudes afetam demanda interna
O mercado deve sentir negativamente os efeitos das recentes denúncias de fraude no leite, avalia Wilson Thiesen, do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Paraná (Sindileite). Ele considera que em um primeiro momento os consumidores tendem a se retrair. “Haverá um prejuízo mesmo para quem tem qualidade”, afirma.
O fato ocorre em um momento de valorização do produto. O Conseleite – que reúne pecuária e indústria e calcula o valor de referência das cotações – informa que, entre abril de 2012 e abril e 2013, o preço ao produtor subiu 16%, saindo de R$ 0,67 por litro para R$ 0,78. De acordo com Thiesen, a alta ocorreu devido à escassez. “O mercado é muito sazonal e entre os meses de março e maio houve uma queda na captação.”
Segundo estimativa do Sindileite, mais de 90% do leite utilizado nos laticínios paranaenses são fornecidos por produtores do estado. As indústrias têm taxa de ociosidade de até 40%. “Isso leva algumas empresas a comprar leite em estados como Santa Catarina, Rio Grande do Sul e Mato Grosso”, diz Thiesen.
Entre as treze maiores empresas de laticínios do país, três estão situadas no Paraná. Juntas, a operação conjunta Batavo/Castrolanda, a Confepar (investigada por ligação com os acusados de fraude no Rio Grande do Sul) e a Frimesa receberam em 2012 cerca de 880 mil litros de leite, fornecidos por 9,5 mil produtores, conforme dados da Associação Brasileira dos Produtores de leite.
Legislação
Controle tende a ser mais rígido
O controle da produção do leite segue diretrizes estabelecidas pela Instrução Normativa 62/2011, elaborada pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O Mapa criou um plano gradual de avanço na qualidade do leite até 2016. As empresas são responsáveis por verificar e garantir a qualidade do produto, inclusive durante a distribuição. Aos órgãos públicos cabe verificar se a prática está sendo cumprida. Veja as principais etapas do processo:
Rebanho – Técnicos pagos pelas indústrias acompanham a saúde das vacas leiteiras para evitar a ocorrência de doenças como a brucelose, que podem afetar a qualidade do leite.
Ordenha – É feita seguindo critérios de higiene para evitar a contaminação.
Frete – Ainda na propriedade, são colhidas amostras para permitir o rastreamento, e o caminhão que faz o transporte é lacrado. O trajeto até o posto de resfriamento, onde o leite cru é armazenado em tanques com temperatura controlada, não pode demorar mais que 48 horas.
Indústria – Quando o caminhão chega à indústria uma nova análise é feita antes de destinar o produto para o processamento.
Mercado – Depois de industrializado, o produto passa por nova verificação antes de ser destinado aos consumidores.