Uma onda de roubo de alimentos com alto valor agregado vem chamando atenção em vários países. Em meados deste mês, uma carga de noodles no valor de R$ 400 mil foi levada de um furgão na Geórgia. No Chile, os efeitos da seca aliados à crescente demanda resultaram em ataques de grupos fortemente armados contra produtores de abacate, à luz do dia.
Para enfrentar os ladrões, a polícia chilena criou “esquadrões guacamole”, e o sistema de justiça nominou o primeiro promotor público dedicado à fruta, segundo a agência Bloomberg. O roubo de abacates também incomoda na Nova Zelândia, onde os fruticultores se viram obrigados a instalar alarmes monitorados dentro dos pomares.
Na Nova Zelândia, no entanto, é um alimento bem mais exótico que está levando disputas aos tribunais.
O caríssimo mel de manuka tem comprovados efeitos antibacterianos e propriedades alardeadas para curar ferimentos e queimaduras, para ajudar na digestão e manter a pele suave e macia. O líquido escuro e com aroma medicinal é produzido da flor de manuka, nativa da Nova Zelândia. Sua popularidade só cresce, e nos últimos seis anos a produção aumentou 33,5%, segundo uma pesquisa do instituto QYResearch.
A reputação de ‘ouro líquido’, no entanto, está causando problemas dentro da indústria. Em julho, três pessoas moveram uma ação judicial em Oakland, na Califórnia, contra a marca Trader Joe, acusada de diluir o mel de manuka anunciado como 100% puro. Os consumidores dizem que pagaram um preço ‘premium’ pelo mel que, após testes, demonstrou pureza de apenas 62,6%. O caso reúne consumidores de Nova York, da Califórnia e da Carolina do Norte.
Néctar diluído
No início deste mês, o programa de TV Good Morning America lançou uma investigação sobre o produto. Em parceria com o laboratório Sweetwater Science, foram testadas várias marcas para verificar o grau de pureza. Anos atrás, em 2014, o governo neozelandês revelou que apenas 1.700 toneladas de mel de manuka eram produzidas anualmente, mas havia mais de 10 mil toneladas anunciadas como tal.
Um dos principais players no mercado do mel de manuka é a empresa Comvita, única listada na bolsa da Nova Zelândia e que alcançou lucro de R$ 37 milhões num período de 12 meses, terminado em junho. No início do ano, a Comvita expandiu as operações e colocou seus produtos em 200 lojas Costco, nos Estados Unidos, e em pontos de venda por todo o Canadá.
O vice-presidente da Comvita para a América do Norte, Corey Blick, acompanha de perto as polêmicas em torno do mel de manuka. “Falamos sobre isso todos os dias”, diz ele. “Quem imaginaria que as pessoas iriam aos tribunais por causa de mel?”. Blick prefere não comentar sobre o processo judicial contra a empresa Trader Joe, mas diz que “sempre surge suspeita quando você encontra mel de manuka a preço baixo”. “É um produto caro para se fazer”, sublinha.
Os preços dos produtos da marca Comvita variam de R$ 90 a R$ 600. Existe uma classificação conhecida como UMF – ou Fator Único de Manuka – desenvolvida pela associação de apicultores neozelandeses. É uma avaliação baseada em pureza e qualidade, com pontuações que vão de 5+ a 20+. Quanto mais puro, maior o preço.
Para produtores de mel de manuka, como a Comvita, o problema é que não existe matéria-prima suficiente para atender a demanda. As abelhas produzem o mel a partir das flores de manuka, que florescem por poucas semanas durante o ano. “Recusamos pedidos todas as semanas, é frustrante”, diz Blick.
O pouco que é produzido recebe tratamento de tesouro. “No depósito tinha um pallet de vidros de mel com pontuação 20+ no topo das prateleiras. O operador da empilhadeira estava um pouco nervoso”, conta Blick. “Eu disse para ele: não se estresse se quebrar, só custa o preço de um carro Aston Martin”.
A Pacific Resources International (PRI) é outro importador de destaque do mel de Manuka. O diretor da empresa, David Noll, começou a levar o produto para os EUA há três décadas. “O mel de manuka tem atraído uma série de aventureiros”, diz Noll. “Onde quer que haja um produto que dê dinheiro, algumas figuras erradas acabam aparecendo”.
No início deste ano, a PRI encomendou testes independentes do laboratório Fera Science, na Inglaterra, para verificar a pureza de várias marcas de manuka. Entre os rótulos questionados, está o Wedderspoon. Segundo Noll, ela perdeu lugar nas prateleiras do atacadista Costco. “A marca Wedderspoon não atendeu aos requisitos. Não estou dizendo que o mel deles é ruim, apenas que não é um verdadeiro manuka”.
O executivo disse que foi procurado pela Costco, e pela Trader Joe, para fornecer o mel de manuka. “O pessoal da Trader Joe veio até mim, mas eles têm foco no preço”, conta. No final, não saiu negócio.
“Eu disse a eles: se conseguirem encontrar o mel no preço que querem pagar, fiquem à vontade”, relata Noll. “A pessoa que fornecia manuka para eles teve que apelar para alguns truques, e acabou sendo apanhada”.
Corey Blick, da Comvita, não acha que o problema do mel de manuka falsificado se resolverá em curto prazo. “As duas últimas temporadas de abelhas que produzem o mel foram mais fracas”, revela. “Houve uma redução na produção. E a demanda não para de subir. Ou seja, os preços também continuarão subindo”. E Noll concorda: “haverá mais brigas nos tribunais”.
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