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A produção da castanha-do-paraá estagnada nos últimos cinco anos na faixa de 40 mil toneladas. | DANIEL CASTELLANO/Gazeta do Povo
A produção da castanha-do-paraá estagnada nos últimos cinco anos na faixa de 40 mil toneladas.| Foto: DANIEL CASTELLANO/Gazeta do Povo

Quer comprar castanha? Então pegue uma senha, entre na fila e aguarde ser chamado. Pessoalmente, pela internet ou telefone, esse é o caminho que muitos revendedores de castanha-do-pará estão tendo que percorrer para tentar encontrar este produto único da floresta amazônica, fornecido em maior parte por cooperativas e associações de catadores da região Norte do País. Em 2017, uma escassez inédita fez os preços aos consumidores dispararem, assustando até tradicionais clientes europeus e americanos.

Vendida em armazéns e casas de produtos naturais do Sul do País por até R$ 130 o quilo, a castanha-do-pará tornou-se financeiramente indigesta, custando mais do que o dobro de algumas espécies similares de nozes e amêndoas. Vale comparar, o grama do ouro está cotado em torno do mesmo preço.

A explicação agronômica prevalecente para o sumiço da “brazilian nut”, como é conhecida no exterior, foi a falta de chuvas sem precedentes na região amazônica no início de 2016, causada pelo fenômeno El Niño. A seca ocorreu após a época de floração, quando, sem água, o fruto não se desenvolve normalmente. O resultado: uma quebra de 70% na produção, estagnada nos últimos cinco anos na faixa de 40 mil toneladas.

O diretor da Caiba Indústria e Comércio, uma grande beneficiadora de castanha no Pará, confirma que a colheita de 2017 acabou. “De nossa parte já encerramos praticamente 100%, se tiver ainda alguma coisa, não representa quase mais nada”, diz José Jayme Belicha. As vendas seguem enquanto durarem os estoques. “Como sabíamos da situação, não fechamos contrato com nenhum cliente. Vendemos no Brasil, basicamente, e somente o que estamos produzindo. A exportação ficou inviável”, conclui.

Polêmica

Há quem diga, no entanto, que a escassez da castanha não foi apenas uma situação pontual, fora da curva, provocada pela estiagem cíclica ligada ao El Niño. Em entrevista ao jornal britânico Financial Times, o botânico inglês Ghillean Prance lembrou que a produção da amêndoa depende de um sistema de polinização que só ocorre em áreas intocadas da floresta – o que explicaria o fracasso de muitos projetos de fazendas de castanha em outras regiões. Essa peculiaridade acaba fazendo com que a espécie funcione como um sistema natural de alerta quanto à saúde do bioma amazônico. Havendo desmatamento ou aquecimento do clima, a castanheira é a planta que apresenta os primeiros sintomas, reduzindo a produção e o tamanho dos frutos – justamente o que aconteceu na safra atual.

Na semana passada, em plena visita do presidente Michel Temer ao País, o governo da Noruega anunciou que reduzirá pela metade os R$ 400 milhões que seriam doados neste ano ao Fundo da Amazônia, seguindo um acordo de 2008 que diz que, aumentando o desmatamento, corta-se o dinheiro. E nos últimos quatro anos, números do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) mostram que os índices de derrubada da floresta voltaram a subir de forma consistente.

A hipótese de que a drástica quebra da safra da castanha-do-pará seja um reflexo direto do desmatamento não é consenso. Levando em conta a vasta dispersão das áreas de extrativismo pela Amazônia (que incluem o Peru e a Bolívia), a engenheira-agrônoma e pesquisadora da Embrapa Rondônia Lúcia Helena Wadt não atribui o problema a uma suposta ausência de polinizadores naturais, provocada pela derrubada das árvores. “Creio que foi um evento climático, falta de chuva mesmo”. “O que surpreendeu é que foi uma quebra generalizada, a estiagem se estendeu por toda a Amazônia. Os anos de 2015 e 2016 já não tinham sido bons. Então, o fato é que neste ano não tem castanha”, avalia a pesquisadora.

Comércio

No varejo, além da dificuldade para repor o estoque, os comerciantes têm a dura tarefa de explicar a situação ao consumidor. “O pessoal reclama muito do preço. Eu até imprimi uma notícia sobre a quebra da safra na parede da loja para mostrar que não fomos nós que aumentamos a margem de lucro”, diz Ronaldo Ribeiro de Almeida, gerente da Pop House, loja especializada em produtos naturais no Centro de Curitiba. Na Confeitaria Holandesa, também na capital paranaense, a solução temporária foi substituir a castanha-do-pará pela noz chilena na confecção de bordas e crocantes das tortas. “Com a castanha nesse preço, tem que ter jogo de cintura, não adianta aumentar o preço e assustar os clientes”, aconselha Ivonete Jokoski, responsável pelas compras na confeitaria.

A boa notícia é que a regularidade das chuvas no início de 2017, na Amazônia, garantiu a formação das amêndoas para a próxima safra, que começa em dezembro. Os cocos chegam a pesar 1 kg e caem de árvores de 40 metros de altura já a partir de novembro. Sabiamente, os catadores esperam para iniciar as buscas somente no início de janeiro, quando já diminui o perigo de serem atingidos na cabeça pelo que procuram no chão.

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