A pauta de exportações de proteína animal, especialmente a de frango, cresceu no primeiro trimestre de 2019 em relação ao mesmo período do ano passado. A informação é da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, que confirma um aumento de 15% entre janeiro e março, quando foram negociados US$ 3,2 bilhões. O crescimento ocorreu mesmo com a decisão da Arábia Saudita, em janeiro, de barrar a entrada de carne oriunda de 5 frigoríficos brasileiros alegando “critérios técnicos” para a suspensão das importações.
Em meio à tensão diplomática envolvendo a política de aproximação do presidente Jair Bolsonaro com Israel, que tem gerado desconforto entre as nações árabes, as exportações de proteína animal e de outros produtos ainda tem espaço para crescer, segundo o secretário geral da Câmara de Comércio Árabe Brasileira, Tamer Mansour. Mas para isso, o Brasil precisa incrementar a habilidade diplomática para conseguir fazer um upgrade na pauta de exportação, passando de grãos, carne, açúcar e minério de ferro para produtos de maior valor agregado.
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“O Brasil está se tornando uma potência em produtos halal [que estão de acordo com as jurisprudências islâmicas, sendo permitido o consumo pela comunidade muçulmana]. O país é hoje o maior exportador de proteína halal do mundo, mas existe um potencial grande de exportar outros produtos. Estamos falando de cosméticos e farmacêuticos, por exemplo, mas o Brasil precisa se adaptar ainda mais para ter esse avanço”, diz Mansour.
Em 2017, a balança comercial com as 22 nações da Liga Árabe foi recorde, apresentando um superávit de R$ 7 bilhões (US$ 13,5 bilhões em exportações e US$ 6,5 bilhões em importações), segundo levantamento da Câmara de Comércio Árabe Brasileira. Quase US$ 4 bilhões, um terço da receita de exportações, foram de carne de frango ou bovina. Em contrapartida, compramos dos árabes, basicamente, combustíveis, fertilizantes e produtos químicos, que somam 90% da pauta de importação.
Jantar com embaixadores
Na próxima semana, a ministra da Agricultura, Tereza Cristina, deve jantar em Brasília com embaixadores de 51 países da comunidade árabe e islâmica. O encontro será uma oportunidade para estreitar as relações e para que “se possa conversar, já que agronegócio brasileiro tem esse mercado como um dos principais. Vamos mostrar para eles que queremos continuar com essa cooperação entre nossos países, principalmente nas relações comerciais”, afirmou a ministra.
O presidente Jair Bolsonaro, que recebeu Tereza Cristina e o presidente da CNA, João Martins, na quinta-feira (4), disse que os negócios com a comunidade árabe devem ser potencializados por parte do Brasil. “Quero ampliar os negócios com o mundo todo: com os Estados Unidos, com o Chile, com Israel. Com a comunidade árabe é a mesma coisa”, frisou Bolsonaro.
Ainda na quinta-feira, o chanceler Ernesto Araújo afirmou que o Ministério das Relações Exteriores está preparando uma agenda de visitas de Bolsonaro a países árabes, que pode ocorrer ainda no primeiro semestre. Araújo, no entanto, não adiantou quais países seriam visitados, mas disse que a intenção é passar por nações que sejam os “principais parceiros” do Brasil. Destacando que a agenda ainda não está fechada, ele citou a Arábia Saudita e os Emirados Árabes Unidos como destinos que podem estar no roteiro.
Durante sua visita oficial a Israel no início desta semana, Bolsonaro anunciou a abertura de um escritório comercial do Brasil em Jerusalém. Embora seja um recuo em relação à promessa feita durante a campanha, de transferir a embaixada brasileira para a cidade disputada entre israelenses e palestinos, o gesto incomodou países árabes. Tanto a Autoridade Palestina quanto o movimento radical islâmico Hamas criticaram a abertura do escritório comercial em Jerusalém. A preocupação do agronegócio brasileiro é que isso possa gerar uma retaliação por parte dos árabes contra a carne brasileira.
Frigorífico fechado
Nesta semana, a BRF, uma das maiores exportadoras de carne halal do país informou que irá suspender os abates de aves no frigorífico de Carambeí, na região dos Campos Gerais do Paraná, especializado no abate halal. A unidade tem capacidade para abater 640 mil frangos e praticamente toda a produção é voltada ao Oriente Médio. Em nota, a empresa justificou a suspensão como medida para a “adequação de estoque que não tem relação com ações do governo ou qualquer outra questão com países muçulmanos”. A BRF, que teve dois dos cinco frigoríficos brasileiros barrados, comercializou no ano passado 1,15 milhão de toneladas com os árabes.
A suspensão dos abates na unidade de Carambeí deve durar até cinco meses, a partir de 27 de maio de 2019. “A decisão reforça a estratégia já anunciada de manter os estoques em níveis adequados para a operação da companhia, ao mesmo tempo em que priorizará gestão da oferta para assegurar o equilíbrio do sistema produtivo. A demanda atendida atualmente pela fábrica de Carambeí poderá ser integralmente garantida por outras unidades da BRF, sem impacto no atendimento a mercados e clientes. Como parte desse processo, a BRF também já deu início às negociações com o sindicato representante da categoria para discutir alternativas que viabilizem a manutenção dos postos de trabalho”, diz outro trecho da nota.
Segundo Tamer Mansour, o fato de a Arábia Saudita, principal importador do frango halal brasileiro, ter barrado os frigoríficos não tem relação com qualquer tensão diplomática que possa existir entre os dois países. “Estivemos na Arábia em reuniões com eles e nos especificaram que alguns frigoríficos brasileiros não tinham cumprido as regras sanitárias”, explica. De qualquer forma, isso acarretou em uma queda de 15% das exportações de frango para aquele país e um prejuízo de US$ 200 milhões entre janeiro e março, conforme o secretário geral.
Entretanto, excluindo a Arábia Saudita da conta, houve crescimento de 1% nas exportações para outros países árabes entre janeiro e março se comparado com o trimestre anterior. Mas ainda assim fica a preocupação, pois a Arábia é o principal mercado para a carne de frango brasileira. Em 2018, o país importou 486,4 mil toneladas do nosso frango – 12,1% do volume total exportado.
Por outro lado, conforme explica Mansour, os países árabes teriam dificuldade no curto prazo de descartar o Brasil como principal fornecedor de proteína animal, já que a adaptação para a produção halal não se faz da noite para o dia. “Mas a longo prazo os nossos produtos poderiam ser substituídos pelos de outros países ou então pelo próprio mercado interno árabe”, conclui.
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