A resistência de alta dos preços dos alimentos deve continuar incomodando a inflação nos próximos meses, à medida que os produtos agropecuários seguem avançando, em razão da quebra de safra de grãos. Como os efeitos desse encarecimento no atacado ainda não foram percebidos em sua plenitude no varejo, a percepção de analistas ouvidos pela reportagem é de que os índices de preços ao consumidor (IPCs) fiquem pressionados nesta época do ano, quando normalmente se espera algum alívio. Além dessa pressão, o clima atípico dos últimos dias, com frio intenso em várias regiões do país, deve influenciar a inflação, colocando risco de alta nas projeções para o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de 2016. Outro ponto ressaltado é que o risco inflacionário também pode alongar o início do ciclo de afrouxamento monetário pelo Banco Central (BC).
Na quarta-feira, 15, mais um indicador da Fundação Getúlio Vargas (FGV) reforçou o avanço da inflação atacadista. O Índice Geral de Preços - 10 (IGP-10) atingiu 1,42%, ficando perto do teto das expectativas do AE Projeções (1,45%), puxado especialmente pelo atacado. O Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) teve variação de 1,89%, com o IPA Agropecuário indo a 4,91% e o Industrial, a 0,70%.
Embora o efeito do encarecimento no atacado não seja direto, ele acaba por acarretar em pressões de alta da cadeia alimentícia de produtos que usam as matérias-primas como insumo. “A parte de proteínas é a que a mais pode sofrer influência. Leite está subindo, um pouco fruto disso. As altas ainda são limitadas. Se esse quadro se prolongar, a ponto de comprometer a oferta, pode gerar mais inflação, por mais que o consumidor esteja resistindo, devido à recessão econômica”, analisa o economista Pedro Ramos, do Banco Sicredi.
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Leia a matéria completaO economista Elson Teles, do Itaú Unibanco, reforça que as condições climáticas mais adversas do que as contempladas anteriormente podem implicar em pressões adicionais sobre preços agrícolas e, consequentemente, resultar numa alta maior dos preços dos alimentos ao consumidor ainda este ano. “A pressão recente nos preços dos grãos (milho e soja, principalmente) e de produtos como arroz e feijão - refletindo perdas de safras em meio a adversidades climáticas - sugere maior resiliência da inflação de alimentos nos próximos meses”, afirma.
De acordo com Márcio Milan, analista da Tendências Consultoria Integrada, as quebras de safras da soja e do milho têm penalizado os preços do atacado, o que deve ser repassado nos próximos meses. “Este choque vem no período sazonalmente mais benéfico para a inflação de alimentos, o que vai fazer com que a desinflação ocorra de forma mais fraca”, diz.
Vale lembrar que a gestão antiga do Banco Central, de Alexandre Tombini, apregoava que o IPCA desaceleraria até dois pontos porcentuais no fim do primeiro semestre. Isso, segundo os analistas, deve acontecer, mas a magnitude deve ficar aquém dessa marca, em razão dos novos riscos de elevação dos preços.
Teles ressalta que na última revisão de cenário do Itaú Unibanco já incorporou uma alta na previsão para o IPCA de 2016, em razão do avanço dos preços de alguns preços agrícolas. “Por isso, elevamos a projeção para Alimentação no domicílio de 8,8% para 10% e para IPCA, de 6,9% para 7,2%”, conta.
O analista econômico Everton Carneiro, da RC Consultores, acredita que as chuvas recentes no Sudeste terão impacto nos preços dos alimentos. Neste aspecto, avalia que serão diretamente afetados os segmentos de hortaliças e verduras, além de tubérculos, raízes e legumes. “Não vamos nos espantar se o grupo de Alimentação subir quase 1,00% no IPCA de junho. Os alimentos devem ser um dos fatores que vão evitar que o IPCA convirja para a meta (centro, de 4,5%) no curto prazo”, diz Carneiro, que revisou recentemente o IPCA de 2016 de 7,00% para 7,40%.
“É muito difícil medir os impactos do clima sobre os alimentos in natura. Vamos ter de esperar para ver”, ponderou Ramos, do Sicredi. Conforme ele, diante da expectativa da colheita da segunda safra de milho no País em meados de julho e agosto, as influências de alta sobre a inflação podem ser abrandadas. “Porém, como não se trata apenas de problemas internos - há dúvidas em relação à produção de soja nos EUA e colheita ruim na Argentina -, a capacidade produtiva pode ficar limitada e ser insuficiente para baixar os preços”, explica.
Juros
Milan, da Tendências, também avalia que há riscos de o BC postergar o ciclo de redução da Selic. “Os cortes podem ser adiados mais para o final do ano”, avaliou. O analista pondera, no entanto, que a consultoria ainda projeta o início do afrouxamento monetário a partir de agosto, com a Selic terminando o ano em 12,75%.
Ramos, do Banco Sicredi, ainda estima que o primeiro recuo do juro básico ocorrerá em agosto, podendo ser de 0,25 ponto porcentual. Contudo, não descarta a possibilidade de a queda só começar em outubro, assim como admite que cresceu a possibilidade de elevação na projeção de 7,20% para o IPCA de 2016. “Nossa previsão de inflação ainda não continha esses elementos dos IGPs”, diz. “Internamente, já trabalhamos a ideia de o corte em agosto ser menos provável. Vai depender de qual será a meta efetiva de inflação (do BC) para 2017”, explica.
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