Rosário - Numa safra de clima seco e irregular, a Argentina mostra por que seus solos estão classificados entre os melhores do mundo para a agricultura. Os pampas da região central e do leste do país atravessaram dois meses sem chuvas no fim do ano passado, mas estão cobertos de lavouras vigorosas. O início da colheita, acompanhado pela Expedição Safra Gazeta do Povo na última semana, derruba as previsões pessimistas sobre o rendimento das lavouras de milho e soja. O cereal não se recuperou totalmente, mas deve render perto de 20 milhões de toneladas. E a oleaginosa, que no final de 2010 chegou ter safra estimada em 45 milhões de toneladas, tende a passar de 50 milhões (veja tabela).

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"Voltou a chover quando as lavouras estavam no limite. Haverá perda expressiva no milho, mas a soja se recuperou bem e pode chegar perto do recorde do ano passado, graças às chuvas e ao solo fértil", avalia o agrônomo Robson Mafioletti, da Organização das Cooperativas do Paraná (Ocepar), que acompanhou a Expedição no percurso de 2,5 mil quilômetros em território argentino. Ele acrescenta que a maior parte das plantações de soja ainda depende de um mês de clima equilibrado, com 60 milímetros de chuvas.

Confirmado o resultado, esta será a segunda vez que a Argentina atinge 50 milhões de toneladas de soja. A primeira foi na safra passada, com a marca de 54 milhões, alcançada depois de 15 anos de ampliação das lavouras. Em uma década e meia, as plantações foram triplicadas, uma expansão em velocidade maior que a registrada nos dois países líderes na produção de soja: o Brasil dobrou e os Estados Unidos ampliaram a área da oleaginosa em 21% nos últimos 15 anos.

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Considerando que as lavouras de soja argentinas tiveram incremento de 300 mil hectares nesta safra – chegando a 18,3 milhões de hectares –, a perda climática será de aproximadamente 4 milhões de toneladas. "Apesar dos problemas que atrasaram o plantio e prejudicaram a fase inicial de desenvolvimento das plantas, o país terá uma safra muito boa, numa demonstração da grande capacidade de recuperação da soja", afirma o técnico e coordenador da Expedição Safra, Giovani Ferreira. A produtividade média deve ser de 2.750 quilos por hectare – 250 quilos acima da média mundial.

Quatro milhões de toneladas é também o tamanho da redução admitida para o milho, que ocupa 4,1 milhões de hectares – 400 mil a mais que em 2009/10. "Como ocorre normalmente, parte dessa área é destinada à silagem para alimentação animal. Neste ano, aproximadamente 800 mil hectares terão esta destinação e, por isso, não entram nessa conta", pondera Mafioletti. A produtividade da área colhida deve ser de 6 mil quilos por hectare, apenas 200 quilos a menos que a de um ano atrás, quando saíram dos campos argentinos 22,7 milhões de toneladas de milho. Neste ano, o país deve lançar no mercado 19,8 milhões de toneladas do cereal, estima a Expedição Safra.

O prestador de serviços Matteoni René, que atua na região de Pergamino, 240 quilômetros a oeste de Buenos Aires, se prepara para iniciar a colheita de verão de seus clientes em 4 mil hectares. Ele afirma que, em geral, os produtores argentinos terão bons rendimentos, apesar dos problemas com a falta de água nos últimos meses de 2010. O milho, calcula, deve render menos que no ano passado, com médias entre 6 mil e 10 mil quilos por hectare. Para a soja, prevê rendimentos entre 2,5 mil e 3 mil quilos por hectare.

Um dos primeiros produtores a colocarem as colheitadeiras para trabalhar, Cláudio Scaglia, de Loma Alta, província de Santa Fé, vem registrando produtividade maior do que previa para o milho. Ele comemora a colheita de 7 mil quilos por hectare, índice inferior ao do ano passado, mas bem acima do que a lavoura prometia depois da seca de outubro a dezembro. Para não alimentar falsas esperanças, chegou a cogitar rendimento de 5 mil quilos por hectare, 4 mil a menos do que obteve no verão de 2010.

Considerando a quebra climática, Scaglia avalia que a renda do milho neste ano vai empatar com os custos totais, que correspondem a 7 mil quilos de cereal por hectare, incluindo 2,4 mil quilos para remuneração pelo uso da terra. Ele está entre os produtores que relatam os custos mais elevados na Argentina, equivalentes a R$ 2,2 mil por hectare, o equivalente ao que gastam os produtores brasileiros do Paraná.

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O lucro neste ano virá da soja, assegura Scaglia. O produtor dedica área seis vezes maior (600 hectares) à oleaginosa, de onde espera retirar 3 mil quilos por hectare. "Teremos rendimento próximo do registrado ano passado, mesmo sem ter semeado soja de alto potencial (que exige clima equilibrado) diante dos prognósticos de seca." Ele escolheu variedades com potencial médio, mais resistentes a estiagens. As lavouras de soja suportam mais de dez dias de sol sem alterações. Porém, o resultado ainda depende de umas três boas chuvas, considera.