Depois de uma década com a área da soja próxima da marca de 4 milhões de hectares, o Rio Grande o Sul expandiu as lavouras da oleaginosa em cerca de 20%. O salto ocorreu nos últimos três anos, sobre as lavouras de milho e, de forma surpreendente, nos pampas da metade sul do estado.
Nos banhados das várzeas – às margens da Lagoa dos Patos, da Lagoa Mirim ou a menos de 50 quilômetros do Atlântico –, a sojicultura se reinventa. Produtores e técnicos envolvidos na formulação do novo sistema de manejo relatam produtividade equivalente ou acima da registrada nas regiões “secas” da metade norte, conferiu a Expedição Safra Gazeta do Povo, em viagem de uma semana pelo estado.
No sistema de manejo das várzeas, a soja substitui lavouras de arroz, mas na verdade tira área das pastagens. As fazendas que faziam rotação somente do cereal com pasto agora inserem a oleaginosa no cronograma de cultivos. Um verão soja, dois arroz e, na sequência, grama para o gado.
A pastagem tem tamanho definido pela viabilidade da pecuária de corte e de leite e tende a ceder espaço ao “lavoreio”, detalharam os produtores Aquiles e Henrique Stefanello, que aperfeiçoam a introdução da oleaginosa nos pampas há 12 anos.
No município de Jaguarão (na fronteira com o Uruguai), a soja avançou de 5 mil para 45 mil hectares em cinco anos, relatam os produtores e técnicos dos pampas. Só nas áreas da indústria de arroz Quero-Quero – empresa familiar que cultiva várzeas gaúchas há 60 anos – chega a 2 mil hectares nesta temporada.
“Começamos com 150 hectares quatro anos atrás e, diante dos resultados, estamos ampliando. No ano que vem, podemos chegar a 3 mil hectares”, relata o administrador Paulo Nolasco. A área de exploração da empresa soma 11,5 mil hectares e a soja ocupa 50% dos 4 mil ha de lavouras.
O tamanho da lavoura de 2014/15 vai depender dos resultados desta colheita. A soja de várzea sofreu com seca até dezembro e excesso de chuva em janeiro nesta temporada. As precipitações estão mais equilibradas, mas parte das áreas perdeu potencial. As marcas esperadas vão de 35 a 50 sacas por hectare.
Como a maior parte das lavouras de banhado está em fase de enchimento de grãos, os produtores aguardam bons resultados. “Na primeira safra, colhemos 24 sacas por hectare. Logo depois, passamos para 50. Nos últimos dois anos, recuamos a 43 e 40 sacas por hectare. Agora, queremos voltar a crescer”, diz Nolasco. Ele mostrou áreas que sofreram alagamentos e devem render um terço do previsto e outras com expectativa de recordes 60 sacas por hectare.
Opção estratégica
A soja dá sustentabilidade à produção de arroz, aponta Aquiles Stefanello. O uso de sementes transgênicas permite controlar a principal erva daninha dos arrozais, o arroz-vermelho (arroz-preto ou arroz-daninho), com glifosato. “No ano seguinte, com a área limpa, podemos optar por variedades de arroz que rendem até 20% mais [10 mil quilos por hectare]”, conclui.
Os produtores relatam ainda ganho ambiental, à medida que é reduzido o uso de agrotóxicos no arroz. A alternância estaria ainda fortalecendo o solo para o cultivo de pastagens. O sistema de manejo segue em avaliação e adaptação.
Santa Catarina tem 120 mil hectares de campos para lavouras
Os produtores de grãos de Santa Catarina avaliam ter 120 mil hectares de pastagens para transformar em lavouras na região de Lages e Capão Alto. Localizados no Centro-Sul do estado, na divisa com o Rio Grande do Sul, os municípios estão a 900 e a 1 mil metros de altitude, respectivamente, condição similar à das zonas de produção de sementes – onde os agricultores conseguem 10% de bônus na venda da colheita.
A exploração das pastagens do Centro-Sul na produção de soja está na fase inicial, aponta o agrônomo Marcelo Capelari, da cooperativa Copercampos (Campos Novos). A empresa quer expandir sua atuação na região.
Os 120 mil hectares prospectados são suficientes para Santa Catarina ampliar o cultivo de grãos em 9%. “Num primeiro momento, essas áreas de campo nativo estão sendo arrendadas por produtores de grãos”, relata Capelari.
O mercado imobiliário ainda não entrou em consenso sobre o valor das terras, mas o arrendamento vem saindo de seis a oito sacas de soja por hectare – a partir de R$ 360, metade do preço praticado em áreas de sementes. O arrendatário precisa preparar o solo e devolver a propriedade em condições de cultivo.
Os produtores catarinenses mostram cautela. A oportunidade é atraente mas, para quem já está no limite, exige a montagem de nova estrutura de plantio e colheita, que precisa ser bem planejada, avaliam os irmãos Jonathan e Hermann Hartmann, de Campos Novos. Com 430 hectares de grãos, eles alcançam produtividades 15% acima das médias nacionais em soja e milho e, por enquanto, dedicam-se à ampliação desses índices.
Dos estados do Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil, Santa Catarina tem a menor área de grãos, com cerca de 550 mil hectares de soja, 470 mil de milho e 83 mil de feijão. Outros 200 mil são dedicados principalmente à culturas de inverno: trigo, aveia e cevada.
Fazendas têm a melhor logística do Brasil
As fazendas de arroz e pasto que adotam a soja como alternativa na região do Porto de Rio Grande (RS) recebem até 10% a mais do que outras zonas agrícolas do estado na venda da oleaginosa. A proximidade dos terminais portuários, que é de menos de 50 quilômetros para muitas fazendas, permite a entrega da colheita diretamente para os exportadores. Trata-se da região de soja com menor custo de transporte do Brasil.
Cotações acima de R$ 70 são comuns na venda direta para exportação. Essa marca permite à soja competir, em rentabilidade, diretamente com o arroz nas Granjas 4 Irmãos, que somam 27,8 mil hectares e têm sede em Rio Grande. Ainda em teste, a oleaginosa está em segundo lugar, à frente da pecuária de corte e da pecuária de leite, conta o agrônomo Rafael Figueira.
A soja ganha área ano após ano nas Granjas 4 Irmãos e chega a 3,3 mil hectares nesta temporada. O arroz, principal aposta do grupo, mantém 6 mil hectares. A pecuária vem sendo reduzida e detém 6,4 mil hectares (corte e leite), com tendência de redução.
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