Uma das mais tradicionais famílias da cafeicultura brasileira, a Tristão, começa a preparar, aos poucos, a quarta geração para assumir os negócios do grupo. Criada em 1935 como uma mercearia de secos e molhados na cidade de Afonso Claudio, no Espírito Santo, a companhia figurou entre os anos 70 e 80 como os maiores exportadores de grão verde do Brasil, e um dos maiores produtores de café solúvel, com a Realcafé. Agora, os herdeiros da família intensificam investimentos em outros setores por meio de suas family offices (que atuam como gestora de recursos).
O processo de sucessão começou no fim dos anos 80, estruturado por Jônice Tristão, filho do fundador do grupo, hoje com 86 anos e à frente do conselho de administração do negócio. O patriarca decidiu fatiar o grupo entre seus quatro filhos - Ronaldo, Sérgio e Ricardo ficaram com divisões separadas de negócios; e Patrícia, a caçula, com participação acionária em todas as empresas, sob o guarda-chuva da Tristão. “Foi uma decisão acertada. Cada filho ficou com uma fatia do negócio. Como toda empresa familiar, há sempre discordâncias. Para evitar maiores atritos, Jônice resolveu dividir o seu patrimônio e ficar no conselho, mas ainda é bem atuante”, disse uma fonte de mercado.
A empresa ganhou musculatura nos anos 60, com a comercialização de café robusta (usado na produção de café solúvel) e começou seu processo de internacionalização nos anos 70, estimulado pelo governo federal, disse Ricardo Tristão.
Aos 56 anos, Ricardo é o responsável pela divisão da área internacional do grupo. Sentado em um confortável sofá do clube privado George, na região de Mayfair, em Londres, frequentado por figurões como David Cameron, primeiro-ministro do Reino Unido, e Ruport Murdoch, magnata da mídia, Ricardo contou que a decisão de se internacionalizar foi vista como uma estratégia de a empresa se aproximar dos clientes finais, sobretudo os europeus, grandes importadores do grão verde.
Ricardo mora com sua família na Ilha de Man, paraíso fiscal no mar da Irlanda, de onde toca a empresa. Vitor, seu filho mais velho, cuida da family office, que investe em compra de participações minoritárias de empresas no exterior, e deverá ser introduzido nos negócios de café aos poucos. De acordo com Ricardo, o faturamento de sua divisão girou em torno de US$ 300 milhões em 2014. O empresário não divulgou quanto o fundo de sua família movimenta.
Cápsulas
No Brasil, a Tristão abriu o caminho para o Estado do Espírito Santo comercializar café robusta. Sérgio Tristão, responsável por essa divisão e o nome mais atuante em entidades que representam o setor de café, a exemplo de seu pai, fechou, no ano passado, uma parceria com a suíça Mocoffee, que comercializa máquinas e cápsulas de café para 17 países, junto com a Wine.com.br, maior site de comércio eletrônico de vinho da América Latina.
“Queria sair da mesmice de fazer cópias genéricas de cápsulas da Nespresso (que perdeu a patente) e investir em um produto inovador”, disse.
A ideia original era trazer a tecnologia de fora. No entanto, com a alta do dólar desde o ano passado, importar equipamentos ficou mais caro e inviabilizaria a rentabilidade da empreitada. “Estamos avaliando nacionalizar a produção a partir de 2017. Vamos tomar essa decisão nos próximos meses.” O volume de vendas da divisão brasileira da Tristão movimentou no ano passado vendas de R$ 230 milhões. Sérgio afirmou que a sucessão dos negócios para os filhos (quatro no total) já acontece e contará uma consultoria especializada no futuro.
Já Ronaldo, filho mais velho de Jônice, atua no braço do family office voltado para investimentos agrícolas e o foco é a compra de terras na região do Mapito (Maranhão, Piauí e Tocantins), segundo Sérgio.
De acordo com Guilherme Braga, consultor da Cecafé (associação brasileira que reúne os exportadores), o grupo Tristão faz parte de um seleto grupo de empresas que fizeram história na cafeicultura do País. “Eles foram os maiores exportadores no passado e hoje estão entre os 15 maiores. Retomaram a liderança no início dos anos 2000, mas outros grupos avançaram.” O Brasil é líder na exportação do grão verde. Entre 2014 e 2015, o País bateu recorde, com cerca de37 milhões de sacas. “Mas, este ano, os volumes devem cair.”