Tornar os portos brasileiros mais avançados tecnologicamente, promover a autonomia e a desestatização do setor portuário no país, integrar os modais de transportes para melhorar o escoamento da produção nacional, mudar o modelo de cabotagem no Brasil e incentivar o transporte em hidrovias são alguns dos desafios revelados em entrevista exclusiva concedida à Expedição Logística, da Gazeta do Povo, pelo jovem (38 anos) secretário nacional de Portos e Transportes Aquaviários do Ministério de Infraestrutura, Diogo Piloni.
Expedição Logística (EL): Um assunto em alta no momento é a BR do MAR, que trata da política de cabotagem no Brasil. Como estão as negociações com o Congresso Nacional para a aprovação do projeto? Sai ainda este ano?
Diogo Piloni (DP): O governo federal trabalha e acredita que conseguimos votar ainda este ano. É desafiador, mas temos esperança. Há uma maioria forte que apoia o projeto. É natural que haja ajustes. Mas está sendo bem negociado, bem discutido, com os armadores, sindicatos, portos. Todos os setores estão envolvidos e sendo ouvidos. O Congresso é um espelho das diversas categorias e estamos abertos a negociações, a aprimoramentos como a segurança jurídica dos marítimos que serão demandados nas embarcações estrangeiras, por exemplo.
EL: A indústria da construção naval brasileira tem feito questionamentos. Como está a negociação com esse setor?
DP: Era esperado um questionamento desse setor. Mas estamos flexibilizando apenas para a cabotagem, para afretamento na cabotagem. Nos últimos dez anos, de 700 embarcações encomendadas da indústria brasileira, apenas 30 eram só para cabotagem. Estamos trabalhando em um projeto ponderado, equilibrado. Haverá emendas protetivas. O mercado de frete internacional é muito volátil. Em 2015, o trecho Santos-Xangai custava US$ 400 box/contêiner. Em 2017, o valor estava em US$ 2.700. Por isso, haverá proteção contra o mercado internacional de fretes. Tem que proteger. Vamos incentivar o desenvolvimento da frota nacional e haverá o lastro da embarcação própria. Teremos dois modelos: a casco nu e a tempo, com análise do custo de Capex.
EL: Outro ponto debatido nos portos brasileiros é a situação dos modais de transporte, principalmente as ferrovias. Sabemos que não é sua área, mas influencia muito na movimentação dos portos. Como está essa integração com as demais áreas?
DP: Há claramente uma interdependência com o transporte aquaviário. E temos uma pauta robusta para a utilização do transporte ferroviário. Vamos melhorar essa matriz de transporte da produção. Atualmente, 15% vem das ferrovias e 12% da cabotagem. Nós estamos passando agora pela segunda revolução ferroviária. Queremos dobrar para 30% a matriz ferroviária. E temos tudo para isso.
EL: O que há de novidade para essa área?
DP: Teremos nova licitação da ferrovia Norte/Sul e duas novas concessões, a da Ferrogrão, na região Norte, e a Fiol, em Ilhéus (Bahia). E faremos prorrogações antecipadas, como fizemos com a malha paulista. Este mês ainda prorrogaremos os contratos da Vale (Vitória/Minas e Carajás). São bilhões em investimentos em ferrovias. Uma pressão boa para os portos, que devem acompanhar, fazendo obras de novos acessos e descruzamentos de vias.
EL: O mundo inteiro está muito avançado quanto à tecnologia nos portos. Como o senhor vê a situação nos portos brasileiros?
DP: Essa é uma missão, tornar os portos 4.0. Trabalhar na internet das coisas (IoT), no big data, na integração dos sistemas do anuentes. Integrar Receita Federal, Antaq (Agência Nacional dos Transportes Aquaviários) e Marinha do Brasil. Ter uma janela única. Fazer o porto sem papel. Isso é crucial e estamos trabalhando nisso. Em Paranaguá, por exemplo, já estamos em um sistema com a Valência Port, que é um sistema que une a comunidade portuária, com informações públicas e privadas. Também estudamos um funding, com o governo britânico, para um projeto de Sistema de Comunidade Portuária (PCS) para Santos, Rio de Janeiro, Suape e Itajaí. Outro ponto é o controle de tráfico de embarcações em portos, que implementamos em Vitória. Há algo em andamento em Santos, Rio de Janeiro e Rio Grande. Buscamos ações inteligentes de otimização de fluxo de embarcações e controle de acessos. Isso também previne acidentes e combates crimes.
EL: Essas medidas se encaixam na nova linha de gestão dos portos, da autonomia dos portos? É a desestatização?
DP: Exatamente. Queremos dar autonomia aos portos, desconcentrar o poder. Essa é um diretriz nacional e está bem latente no setor portuário. Centralizar é contracorrente do que ocorre no mundo. Devemos dar autonomia local de gestão, delegar as competências de gestão. Continuaremos incentivando a parceria com a iniciativa privada. Vamos licitar novos contratos de arrendamento, a concessão de portos como um todo, que é o porto organizado. Essa é a nova tendência. Estamos nisso com a Codesa (Companhia Docas) do Espírito Santo, que deve ocorrer a consulta pública na segunda quinzena de dezembro deste ano. E são elencados como prioritários Santos, São Sebastião e Itajaí, que ocorrerá em 2022. Já existe a exploração de operações de terminais. Mas a autoridade portuária é pública. A tendência é passar a administração do porto, com investimentos privados. É a lógica comum a todos os segmentos.
EL: Nessa linha, o que caberia ao Governo Federal?
DP: Caberia a visão de planejamento nacional integrada com os demais modais de transportes, dentro do Plano Nacional de Logística, e a regulação, pela Antaq, que é o órgão especializado e trabalha com todos os portos.
EL: Secretário, o que vem mais de novidades pela frente?
DP: Além do BR do MAR, estamos com leilão na rua, que deverá ocorrer em 18 de dezembro, da concessão de quatro novos terminais, em Aratu, Maceió e Paranaguá, com o de veículos. Em 2021 e 2022 serão 31 terminais licitados. Só em 2021 serão 20, mais do que nos últimos 20 anos. São investimentos de R$ 5,6 bilhões. Temos um programa de licitação e arrendamento na operação.
EL: E quanto às hidrovias?
DP: Estamos com estudos nos moldes da BR do MAR, conversando com todos os players. Queremos fortalecer a navegação no interior no Brasil. Já temos análises para o Tietê, Lagoa dos Patos, Tocantins e Tapajós/Madeira.
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