O El Niño do século, em 1997, ensinou o mundo a temer o fenômeno que, em 2015, pode mostrar fúria ainda mais intensa. Ao identificar que a temperatura da superfície do oceano Pacífico está mais quente do que o normal, satélites da Nasa levam especialistas a prever um evento tão forte ou até mesmo superior neste ano. Em uma das regiões brasileiras mais sensíveis ao fenômeno, o sul do país, os efeitos já são sentidos em cidades assoladas por enchentes e na produção agrícola.
Conforme cientistas da Nasa, todos os sinais indicam que o El Niño deste ano será de moderado a forte. As análises dos mapas de calor no Pacífico mostram semelhança muito grande com o mesmo período de 1997, o início do mais intenso El Niño já registrado (leia abaixo).
“Não existem dois eventos iguais. Mas as observações indicam para uma equivalência entre 1997 e 2015, o que sugere efeitos semelhantes”, destaca o professor Francisco Eliseu Aquino, climatologista do Centro Polar e Climático da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
Naquele ano, o El Niño desarrumou o clima no mundo, com enchentes, furacões e secas em diferentes países. No Brasil, as semelhanças entre os fenômenos já são sentidas, com cheias na região Sul, secas no Nordeste e aumento do calor no Sudeste. Em 1997, o inverno foi ameno, com temperaturas acima do normal e ‘calorão’ fora de época – parecido com este ano.
“Em 2015, tivemos o agosto mais quente do século. Estamos em um ano anomalamente quente, onde o El Niño também tem influência”, explica Aquino.
Produtividade comprometida
O quadro de similaridade com aquele ano é reforçado com os altos volumes de chuva registrados em setembro e outubro na região Sul do Brasil. O excesso de umidade, tanto naquela época como agora, provoca perdas na fruticultura e nas lavouras de inverno.
“As chuvas ficarão bem acima da média até o fim do ano. A intensificação das precipitações ainda está por vir”, confirma o meteorologista Rogério Rezende, do 8° Distrito do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet).
A previsão do Inmet é de que as precipitações em outubro e novembro fiquem de 50 a 100 milímetros acima da média para o período – se aproximando de 300 milímetros na metade Sul do país e 400 milímetros no Norte.
Para as lavouras de inverno, como o trigo, e para a fruticultura, o excesso de umidade compromete em cheio a produtividade. Também atrapalha o plantio de culturas de verão, como o arroz.
“Os efeitos da chuva em demasia são cumulativos. A cada nova precipitação, as perdas aumentam. O tempo fechado também prejudica a luminosidade e facilita o aparecimento de doenças nas plantas”, explica o agrônomo Alencar Rugeri, assistente técnico da Emater.
Ainda segundo o especialista, novos estragos às culturas de inverno ainda estão por vir, caso os prognósticos de chuva para outubro e novembro se confirmem. Não bastassem os efeitos do El Niño, as lavouras de trigo ainda foram impactadas por forte geada em setembro – que comprometeu boa parte da produção em regiões que plantaram o cereal mais tarde.
A chuva em excesso poderá ainda atrasar o plantio das culturas de verão, devido à dificuldade de preparo do solo. A situação preocupa especialmente os arrozeiros, que já cultivam o cereal em terrenos alagados e deverão conter o volume de água.
Benefício na safra de verão
Mas nem tudo são trovoadas no campo quando se fala em El Niño. Historicamente, o fenômeno costuma ser benéfico para as safras de soja e de milho, que precisam de precipitações no verão.
“Os prognósticos indicam um verão com volume regular de chuva, o que tende a ser benéfico à soja e ao milho”, aponta Flávio Varone, meteorologista da Fundação Estadual de Pesquisa Agropecuária (Fepagro).
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