Neste ano, a produção de café em Porto Rico deve ser de apenas 10% do que se colhe tradicionalmente| Foto: /BigStock

Setembro geralmente marca o início da colheita nas montanhas frescas e secas da parte central de Porto Rico. Os produtores de café colhem os frutos maduros, do tipo arábica, e começam o meticuloso trabalho de separação, secagem, limpeza e torra do produto que, de tão sacrossanto, até o Vaticano já o importou certa vez - uma notícia que os cafeicultores e aficionados da região se orgulham em divulgar.

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Mas não haverá lucro neste ano para o fazendeiro Arthur Siemon. De pé ao lado de um enorme campo vazio, com um chapéu Stetson na cabeça, o homem de 71 anos olha para onde há dois anos havia 15 mil mudas plantadas do tipo especial: o Café de Puta Madre. Ele deveria estar colhendo uma porção de frutos de café nessa época do ano, mas o furacão Maria arrancou as plantas do solo em setembro do ano passado. Restaram poucas em pé.

Segundo especialistas no assunto, a indústria local de café vai produzir neste ano só 10% do que produz normalmente na temporada. Ao todo, o setor agrícola da ilha tomou um baque de U$ 780 milhões por causa da tempestade, o que provocou o fechamento de comércios e perda de empregos.

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Para Siemon, o custo foi de dezenas de milhares de dólares para tentar trazer as operações de plantio e torra de volta ao patamar de antes do Maria . Ele também está racionando sementes, reduzindo horas e os salários de empregados. Se a escassez de grãos continuar, o produtor pode fechar as portas em outubro. “O Maria parece ter dado o seu sopro de morte”, lamentou Siemon.

Quase um ano após a tempestade catastrófica, a fraca economia de Porto Rico mostra poucos sinais de melhora, comprometendo a viabilidade das indústrias e comunidades. O ataque do furacão Maria ao território norte-americano expôs as fraquezas - infraestrutura, governança e emprego - aleijando a segurança financeira das famílias porto-riquenhas, que lutam para equilibrar as despesas com a redução de renda e aumento de preços.

“Famílias que já eram pobres agora estão em situação de extrema pobreza”, diz o economista e professor da Universidade de Porto Rico em Cayey José Caraballo Cueto, acrescentando que Porto Rico tem um dos maiores índices de desigualdade de renda do mundo. “Se essa desigualdade continuar, a fase de recuperação do desastre só vai exacerbar isso”.

Sustentabilidade econômica

Alguns setores da economia estão melhorando ou se estabilizando, sustentados pela promessa de dólares federais. Empregos da construção civil ajudaram a reduzir a taxa de desemprego para menos de 10% pela primeira vez em 5 anos. Mas muitas vagas são temporárias, atreladas à ajuda federal, e não vão ajudar a construir uma sustentabilidade econômica. O declínio do desemprego poderia ser em parte alimentado por um fenômeno preocupante: a migração de centenas de milhares de trabalhadores para os Estados Unidos.

Na planta processadora de café de Siemon, em Adjuntas, Zeneida Sotomayor, que trabalha no local, separa os grãos por peso, cor e formato dentro de tigelas de metal, tarefa que a impediu de se juntar a outras pessoas que deixaram a região. “Sem esse emprego eu teria de deixar a cidade”, reitera.

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Os grãos de café remanescentes de Siemon são mantidos a salvo e secos embaixo de duas lonas gigantes, após o Maria ter derrubado os silos de alumínio. Vai levar de 3 a 5 anos para que as plantações de café em Porto Rico se recuperem e que as frágeis mudas ganhem maturação. Nesse tempo, o governo espera que a economia do país se estabilize. Recuperar-se é outra história.

“Não há outra indústria em Adjuntas que não seja a do café”, afirma Iris Jannette Rodriguez, presidente do setor local de cafés do Bureau de Produtores Rurais de Porto Rico. “Ou você trabalha com café ou não trabalha. As panificadoras dependem dos trabalhadores do café, os postos de combustíveis dependem dos trabalhadores do café. Se cairmos, todos caem”, diz.

*Nota do editor: Porto Rico é um território autogovernado, associado aos EUA desde 1917, e cujo chefe de Estado é o presidente dos Estados Unidos da América. Um governador administra questões internas, mas todo o comércio e as relações exteriores, o controle do ar, terra e mar, imigração e cidadania, forças armadas, constituição, tratados, agricultura, mineração e comunicações estão sujeitos à autoridade do governo americano. Por ser um território, e não estado americano, os cidadãos de Porto Rico residentes na ilha não podem votar nas eleições dos EUA.