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Nem mesmo a potência econômica em que se transformaram as cooperativas foi suficiente para decretar o fim da Coodetec, a Cooperativa Central de Pesquisa Agrícola, com sede em Cascavel (Oeste do Paraná) e atuação em vários estados brasileiros e no Mercosul.

Propriedade intelectual do sistema e patrimônio do Paraná, junto com a Coodetec entregam-se também décadas de conhecimento, desenvolvimento tecnológico e transferência de tecnologia. A compra da cooperativa pela norte-americana Dow AgroSciences, anunciada na semana passada, foi tratada como mais uma aquisição, típica da economia globalizada, que tornou comum as fusões e incorporações de pequenas e grandes companhias dos mais diversos segmentos.

Não podemos esquecer, porém, que o caso específico vai além e tem a ver com soberania, de um setor estratégico ao desenvolvimento econômico e social de uma nação. Tem a ver com economia? Sim! Mas principalmente com abastecimento e segurança alimentar. Falamos de comida e energia, do combate à fome e do combustível renovável, de um futuro que está na ciência, na pesquisa e em novas tecnologias. De um cenário que passa, necessariamente, pelo campo. E, por consequência, pela Coodetec.

A Dow tem capital e competência para resgatar, promover e alavancar o potencial de pesquisa expressado pela cooperativa? Tenho certeza que sim. Por outro lado, a Coodetec deixa de ser um ativo do Brasil ou do Paraná para se tornar parte de uma multinacional, com todas as implicações típicas à natureza do negócio. Todos os materiais, linhagens e o banco de germoplasma, toda a pesquisa de soja, milho, trigo e até algodão, desenvolvidos desde a década de 70, agora têm um novo dono. E ele é estrangeiro.

Como Coodetec, são quase 20 anos. A pesquisa cooperativa, no entanto, tem mais de 40 anos. Antes de se tornar uma central, em 1995, ela era o departamento de pesquisa da Ocepar, a Organização das Cooperativas do Paraná. Criada para combater, evitar ou então reduzir a dependência do sistema da pesquisa de terceiros, ela segue agora o caminho inverso. O discurso de que “nasceu da preocupação dos agricultores em desenvolver estrategicamente suas próprias tecnologias e cultivares” e de que o objetivo era “reduzir o grau de dependência do governo e grandes capitais internacionais que visam exclusivamente seu lucro” se rende ao capital.

A dificuldade financeira da Coodetec não é nenhuma surpresa. Na última década ela perdeu muito mercado e, consequentemente, renda. Importante salientar que além de ser uma empresa de pesquisa, também é uma empresa de sementes, sua principal fonte de receita. E foi justamente onde os problemas começaram. Dificuldades que entre outras origens têm a ver com a entrada das sementes transgênicas, em 2005/2006. Antes disso, na época das variedades convencionais, Coodetec e Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) chegaram a responder por mais de 60% do mercado de sementes de soja no Brasil. Hoje devem ter algo próximo de 10%.

Por erros estratégicos nas apostas, por questões políticas, econômicas ou então de gestão do negócio, o fato é que a pesquisa nacional está de luto. De qualquer forma, que venha a Dow, que venham novas pesquisas, novas tecnologias, novas oportunidades e, com elas, o predomínio das multinacionais. Já que não estamos conseguindo vencer, o jeito é nos aliarmos. O que de maneira nenhuma tira o mérito dessas empresas, com notória e reconhecida contribuição ao agronegócio brasileiro. Mas não dá para deixar de lamentar tamanha perda à pesquisa nacional e cooperativa.

O valor da transação não foi divulgado. O mercado especula com cifras abaixo de R$ 1 bilhão, sendo parte do pagamento em dinheiro e outra parte em fornecimento de insumos às 32 cooperativas que integram a central. Aliás, outra conta e avaliação que devem ser levadas em consideração. O valor a ser pago em dinheiro será dividido entre as cooperativas “sócias”, o que significa que não deve sobrar muito para cada uma. Em um primeiro momento elas podem até deixar de pagar a conta que nos últimos anos não tem fechado na Coodetec. No médio e no longo prazo a conta será outra, a do pagamento de royalties à pesquisa e tecnologia que poderia estar sendo desenvolvida dentro do sistema.

Para constar, a Dow AgroSciences fechou 2013 com um faturamento global de US$ 7,1 bilhões. Somente as cooperativas do Paraná encerram o ano com um faturamento superior a R$ 40 bilhões.

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