Oferta maior que a demanda, preços em queda e câmbio em alta. O ano não será ruim, mas também não será dos mais fáceis para o agronegócio brasileiro. E para colaborar ainda mais com um cenário recheado de incertezas, nos próximos dias deve entrar em vigor a nova Farm Bill, a lei agrícola dos Estados Unidos, que vai destinar US$ 956 bilhões, em cinco anos, a título de apoio ao produtor e à produção norte-americana. Uma variável que sempre fez e deve continuar fazendo a diferença quando o assunto é competitividade.
Para efeito de comparação, na safra atual o governo brasileiro destinou R$ 175 bilhões a juros controlados para as operações de plantio, custeio e comercialização. O Plano Agrícola e Pecuário 2013/14 ainda prevê linhas de financiamento para máquinas e equipamentos, subvenção ao seguro rural, construção de armazéns, entre outras modalidades de crédito ao agricultor, ao pecuarista e à agroindústria. Mantida a taxa de crescimento das últimas temporadas, ao final de cinco anos o governo brasileiro terá “emprestado” ao agronegócio menos de R$ 800 bilhões, no câmbio de R$ 2,35, o equivalente a US$ 340 bilhões.
Com exceção da subvenção ao seguro rural, a maior parte dos valores não é a fundo perdido. São financiamentos, a juros mais baixos do que os praticados no mercado, em uma operação equacionada com recursos do Tesouro Nacional. O que não deixa de ser um subsídio, mas indireto, uma vez que o produtor precisa pagar pelo capital tomado. Não existe, na prática, nenhum pagamento direto, pelo simples fato de serem agricultores, como ocorre nos Estados Unidos. Tudo bem que, com a inflação brasileira nos 6% ao ano, algumas linhas de financiamento do Plano Safra, como de máquinas e armazenagem, terão o chamado juro negativo. Mas emprestou, tem que pagar.
Já a nova Farm Bill, aprovada pelos deputados em 29 de janeiro e pelos senadores em 4 de fevereiro, e que foi sancionada pelo presidente Barack Obama na sexta-feira, trata prioritariamente da redução ou do remanejamento dos recursos federais à agricultura. O texto elimina o pagamento direto aos agricultores do país, um avanço no combate aos subsídios, e que pode ser positivo para o Brasil. O que não significa, necessariamente, que as distorções no comércio agrícola internacional vão acabar.
Entidades e autoridades do governo brasileiro estão se debruçando sobre a nova lei. De qualquer forma, a primeira análise também considera a possibilidade de existir uma manobra, onde há cortes em alguns programas e reforço em outros, numa espécie de remanejamento dos recursos. Combater o pagamento direto – e, ao mesmo tempo, ampliar as garantias e benefícios indiretos concedidos à agricultura – pode continuar sendo interpretado como subsídios lesivos e desleais no mercado internacional. Em especial a países como o Brasil, concorrente direto no ambiente da oferta, mas que enfrenta condições desleais de produção.
A derrota dos Estados Unidos no contencioso do algodão, em ação patrocinada junto à Organização Mundial do Comércio (OMC) influenciou e deveria ter sido decisiva na formulação da nova Farm Bill. A decisão, concedendo vitória aos cotonicultores brasileiros prejudicados pelos subsídios norte-americanos, estabeleceu um pagamento anual de US$ 147 milhões, pouco mais de US$ 12 milhões/mês, o que representou uma potencial quebra de paradigma, não somente pela enorme repercussão no mercado internacional, mas, sobretudo, pela carga política da decisão. Na prática, porém, apesar do histórico no caso do algodão, o impacto econômico da nova lei à agricultura do Brasil, deve ser nulo, pelo menos no curto prazo. O documento, de 950 páginas, ainda precisa ser interpretado minuciosamente para que o Brasil possa se posicionar e redefinir sua estratégia no mercado interno e internacional. A princípio, porém, a Farm Bill 2014 não vai fazer muita diferença para o Brasil.
Na prática, a única coisa que foi cortada de fato foram os pagamentos diretos. Os demais programas apenas receberam uma nova roupagem. Digamos que o setor continua altamente subsidiado por pagamentos indiretos até maiores do que os previstos na legislação de 2008. Em linhas gerais, o governo acaba com os pagamentos diretos e cria novas regras e novos programas ao apoio indireto. Os novos subsídios, por exemplo, garantem que a renda dos agricultores nunca caia abaixo de 86% do que eles faturaram em anos anteriores, quando os preços internacionais estavam em recordes históricos.
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